Inah Canabarro Lucas é a pessoa mais idosa do Brasil e da América Latina. São 115 anos de história, com registro de idade validado pelo Gerontology Research Group (GRG). Nascida no dia 27 de maio de 1908, no município de São Francisco de Assis, no interior do Rio Grande do Sul, Inah faz parte de uma família importante para a história do Estado. Ela é bisneta do General David Canabarro, um dos líderes da Revolução Farroupilha (1835-1845). Ao longo de mais de um século, foi testemunha de muitas mudanças. Quando nasceu, o primeiro avião de passageiros não havia feito nem seu voo-teste, não existia internet, a primeira chamada de longa distância foi feita só em 1915, não existia televisão e o celular foi lançado apenas em 1970; no Brasil, em 1990.
Colorada fanática, ela viu o seu time do coração surgir: o Sport Club Internacional foi criado em 1909, um mês antes de Inah completar um ano de idade. Torcedora mais antiga do clube, ela já recebeu diversas homenagens do Inter em função do seu amor pelo time. “Ela é apaixonada pelo Inter, tudo dela tem que ser do seu time do coração”, conta Irmã Lúcia Ignez Bassotto, responsável pela Casa Provincial Irmãs Teresianas Brasil, onde Inah mora.
Mais conhecida como Irmã Inah, a idosa faz parte da Companhia de Santa Teresa de Jesus desde 1927, quando tinha 19 anos. Ainda quando criança estudou em um internato em Sant’Ana do Livramento, também no Rio Grande do Sul. Mais tarde, mudou-se para Montevidéu, no Uruguai, onde se tornou freira. De lá para cá dedicou sua vida religiosa ao magistério, atuando também no Rio de Janeiro e em Porto Alegre.
Por causa do seu trabalho com educação, a Irmã recebeu no ano passado o título de imortal da Academia Luso-brasileira de Letras do Rio Grande do Sul. A honraria é destina a personalidades de reconhecido valor intelectual, que apoiam, incentivam e promovem o engrandecimento da associação e comunidade luso-brasileira.
E é através da educação que Irmã Inah recebe hoje atendimento para manter sua saúde e bem-estar. Paciente do Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG) da PUCRS, é acompanhada, desde 2016, pelo grupo de pesquisa Atenção Multiprofissional ao Longevo (Ampal). Criado em 2012 com o objetivo de promover o acesso à saúde pública para idosos/as, principalmente aos nonagenários e centenários, o grupo de pesquisa garante a pessoas com idade avançada os atendimentos de especialistas em diferentes áreas como fisioterapia, nutrição e odontologia. Mesmo durante a pandemia de Covid-19, com a necessidade de isolamento social, os pesquisadores mantiveram contato com a idosa, realizando os monitoramentos por telefone.
“Desde 2013 fazíamos um acompanhamento domiciliar com os idosos atendidos pelo grupo, mas com a pandemia isso precisou ser feito a distância para que pudéssemos manter a assistência a ela”, explica Ângelo Bós, professor da Escola de Medicina da PUCRS e coordenador responsável pelo projeto.
Josemara Rocha é doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica da PUCRS e atualmente presta atendimento à centenária. “Acompanho a Irmã Inah como pesquisadora e admiradora. A partir do trabalho que o grupo realiza com ela, consegui perceber que o contato direto com as pessoas aumenta ainda mais o respeito por elas. O aprendizado vai além de artigos científicos e estatísticas”.
Esse olhar mais humano e sensível no tratamento da saúde dos idosos é a base do Ampal. Para Marlon Gringol, também doutorando do PPG em Gerontologia Biomédica da PUCRS, o projeto dedica uma atenção especial às necessidades dos idosos. “Eu sempre tive uma inquietação para fornecer melhores respostas para a evolução dos pacientes, e o Ampal traz exatamente isso, alinhando a necessidade dos pacientes à aprendizagem dos alunos com atividades práticas e pesquisas no dia a dia”, conta.
No Rio Grande do Sul, a proporção de pessoas idosas cresceu 74% durante a pandemia, de acordo com dados apresentados no estudo População Idosa no RS – 2020 –2021. Já a Divisão de População da Organização das Nações Unidas (ONU) estima que até o final da década, um milhão de pessoas tenham mais de 100 anos no mundo.
“Com o crescente número de idosos é muito importante a existência de pesquisas e projetos ligados a essa população. Na PUCRS, desenvolvemos pesquisas que contribuem para a sociedade em diversos aspectos do envelhecimento humano, desencadeando a prevenção e preparação dos indivíduos para um envelhecimento saudável e bem-sucedido. Impactamos, também, a sociedade através de projetos assistenciais em que fornecemos atividades, eventos e produções científicas”, destaca Douglas Sato, diretor do IGG.
Todo o atendimento de saúde e bem-estar que Irmã Inah recebe, permite que ela possa continuar vivendo momentos emocionantes e de muito valor. Na Casa Provincial onde mora, Irmã Inah possui uma enfermeira responsável por ela: a Irmã Velmira Piotrovski. Na primeira vez em que as duas se encontraram, Velmira tinha 18 anos. “Eu estava no colégio e Inah foi até a minha cidade. Ela contou sobre a sua congregação e, por causa dela, decidi ser freira”, conta.
Depois de 60 anos trabalhando em hospitais da Cruz Vermelha, na Venezuela, Irmã Velmira retornou a Porto Alegre. O reencontro entre as duas aconteceu em 2021. Quando chegou à Casa Provincial Irmãs Teresianas Brasil, Irmã Inah estava enferma, mas por meio da fé e dos cuidados recebidos, melhorou.
“Os médicos do hospital em que Inah estava interna deram alta para ela porque, segundo eles, a Irmã não viveria muito tempo. Quando chegamos em casa, eu disse que cuidaria dela nos meus termos. Dois meses depois, ela melhorou ao ponto de voltar a tomar banho sozinha”, conta emocionada.
A amizade e o companheirismo permanecem entre as duas após tantos anos. Para a Irmã Velmira, entre os vários ensinamentos aprendidos com Inah, o principal é levar a vida com leveza. “Ela é forte e possui muita vontade de viver”.
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