Entre os jovens provenientes de famílias mais pobres a cifra chega a 22%, entre jovens negros a 12,3%, e entre jovens do sexo feminino fica em 13,4%
terça-feira, 13 de agosto | 2024Entre os jovens provenientes de famílias mais pobres a cifra chega a 22%, entre jovens negros a 12,3%, e entre jovens do sexo feminino fica em 13,4%
No Brasil, o percentual de jovens nessa situação em 2023 era de 15,1%. / Foto: Envato Elements
No ano de 2023 havia 2,3 milhões de jovens entre 15 e 29 anos no Rio Grande do Sul, representando 20% da população gaúcha. Naquele ano, 17,6% desses jovens se dedicavam apenas aos estudos, 19,9% estudavam e trabalhavam, 52,7% somente trabalhavam, e 9,9% não estudavam e nem participavam do mercado de trabalho. Ou seja, naquele ano havia 229 mil jovens gaúchos que não estavam estudando nem trabalhando ou procurando emprego. E quando olhamos para a série histórica, iniciada em 2012, vemos houve pouca variação nessas cifras em mais de uma década, sem qualquer tendência mais evidente de redução na proporção de jovens que não estudavam e nem trabalhavam.
O cenário é mais grave quando recortamos grupos específicos. Entre jovens gaúchos negros, em 2023, 12,3% não estudavam nem trabalhavam. Entre os brancos, eram 8,9%. Já quando fazemos o recorte por rendimentos, a desigualdade é ainda maior. Entre os jovens cujos domicílios de moradia se localizam no estrato dos 20% mais pobres do Rio Grande do Sul, 22% não estudavam e nem trabalhavam. Já entre aqueles cujos domicílios se encontram no grupo dos 20% mais ricos, a cifra diminuía para somente 3,1%. Entre as jovens mulheres, o percentual que não estudam nem trabalham é de 13,4%, enquanto entre os homens fica em apenas 6,4%. No Brasil como um todo, o percentual de jovens nessa situação era de 15,1%, e em estados como Acre, Maranhão e Alagoas passava de 25%. Ainda assim, o caso do Rio Grande do Sul é preocupante.
“A juventude é caracterizada por um momento chave na transição para a vida adulta, durante a qual as instituições de ensino e o mercado de trabalho desempenham um papel fundamental. Chama atenção, no entanto, que mesmo no Rio Grande do Sul, um dos estados mais desenvolvidos do país, quase 10% dos jovens não estudam nem trabalham. De um lado, o sistema de ensino não consegue manter os jovens por tempo suficiente para uma melhor qualificação. Do outro lado, o mercado de trabalho não é capaz de absorver essa mão de obra adequadamente. O resultado, então, são milhares de jovens em uma situação que possivelmente terá efeitos muito negativos em suas trajetórias”, afirma André Salata, coordenador do PUCRS Data Social.
Todos esses dados são provenientes do Boletim Juventudes: Levantamento sobre estudo e trabalho da população juvenil no Brasil e no Rio Grande do Sul, produzido em parceria uma parceria entre o Observatório Juventudes e o Data Social, ambos serviços da PUCRS. Os dados utilizados são da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio Contínua (PNADc – IBGE), acumulados na 1ª visita (2012-2019;2022-2023) e na 5ª visita (2020-2021). O levantamento coincide com o Dia Internacional da Juventude, celebrado anualmente em 12 de agosto, e criado por iniciativa da Organização das Nações Unidas (ONU). O recorte etário utilizado é o do Estatuto da Juventude (Lei n º 12.852/2013), considerando jovens as pessoas entre 15 e 29 anos.
“Muitas vezes, há uma ótica direcionada aos jovens que os culpabiliza unicamente pelas dificuldades que enfrentam, quando, na verdade, há uma complexidade de múltiplas estruturas precarizadas e inter-relacionadas que os impactam de modo excludente”, explica Patrícia Espíndola Teixeira, coordenadora do Observatório.
Outra questão sinalizada por Patrícia é a redução progressiva da população juvenil: “quanto menor o número de jovens, naturalmente é menor o lugar de representatividade juvenil e concomitantemente, maiores os impactos na população ativa e nos cenários de qualificação e desenvolvimento, sobretudo quando esses dados se somam a fatia distanciada da educação e do trabalho”.
Foto: Envato Elements
Os dados tornam evidente, também, que a transição para a vida adulta no Brasil é, para a maioria da nossa juventude, marcada pela sobreposição de estudo e trabalho. Mesmo no caso do Rio Grande do Sul, um dos estados mais desenvolvidos do país, o percentual de jovens que estudam e trabalham é de 19,9%. Quando selecionamos somente jovens de 15 até 17 anos, aqueles que sobrepõem estudo e trabalho somam 27,6%. Entre os jovens de 18 até 24 anos, a cifra é de 22,6%. E, finalmente, entre aqueles de 25 até 29 anos, fica em 12,1%.
“Para o grosso da juventude brasileira a transição para a vida adulta não segue o modelo tradicional, no qual o jovem primeiro termina os estudos, para então ingressar no mercado de trabalho. Na verdade, essas duas esferas costumam se sobrepor, fazendo os jovens acumularem estudo e trabalho ao longo de vários anos. No Rio Grande do Sul não é diferente”, destaca o professor Andre Salata.
Outra seção do relatório mostra que, com a transição demográfica que o país atravessa no momento, o percentual de jovens na população gaúcha vem diminuindo ano-a-ano. Em 2012, no início da série histórica, os jovens de 15 até 19 anos respondiam por 24,1% da população gaúcha. Já no final da série, no ano de 2023, aquele percentual ficava em 20,2%.
Luiz Gustavo Tessaro, especialista do Observatório Juventudes da PUCRS, pontua: “há uma janela de oportunidade aberta. Enquanto o país e o estado passam por um processo de envelhecimento paulatino e de bônus demográfico, o momento é pertinente para lançar mão de políticas públicas que assegurem os direitos previstos no Estatuto da Juventude. Em substituição à produção de estereótipos geracionais contraproducentes e à culpabilização das juventudes pelas mazelas que as afligem, urge que se adotem iniciativas que tratem o jovem como verdadeira riqueza e potencial de uma sociedade. Investir no jovem hoje é investir na possibilidade de produzir crescimento não apenas econômico, mas em desenvolvimento social a médio e longo prazo”.