As causas e consequências da performance humana na segurança empresarial são o tema central do webinar Erro/acerto humano: os dilemas da cultura de segurança em organizações, que acontece nesta quarta-feira, dia 15 de dezembro, com transmissão ao vivo pelo canal do Youtube da PUCRS, a partir das 11h.
Realizado pelo Núcleo de Pesquisa HFACTORS, da PUCRS, o evento online contará com a fala do coordenador científico do núcleo e professor da Escola de Negócios, Eder Henriqson. O debate será ao lado do engenheiro de petróleo da Petrobras José Carlos Bruno.
O conceito de fatores humanos trata-se de um campo de pesquisa interdisciplinar com enfoque nos elementos sistêmicos que condicionam o desempenho humano em diversos contextos. Já o conceito de resiliência está estreitamente relacionado à capacidade de tomar medidas específicas, robustas e de transformação face a eventos inesperados.
Os princípios e conceitos de fatores humanos aplicados nas organizações e nos ambientes sociotécnicos complexos incluem uma compreensão sistêmica da relação interativa entre pessoas, trabalho e artefatos.
O coordenador do HFACTORS e professor da Escola Politécnica, Eduardo Giugliani, explica que esta linha de pensamento considera que não é suficiente julgar isoladamente o ser humano, ou as tecnologias, ou o trabalho, ou quaisquer outros fatores. Mas, sim, as interações sistêmicas e dinâmicas entre estes fatores. Para ele, “o ser humano está dentro de certo contexto, e não isolado do seu entorno”.
Já a resiliência refere-se à capacidade de um “sistema” (que pode ser uma organização, um grupo, uma operação específica, etc.) adaptar seu funcionamento diante de alguma mudança ou desordem, mantendo o seu desempenho igual ou superior sob condições adversas. E a conexão entre fatores humanos e resiliência é uma alternativa que vai além das abordagens tradicionais de gestão da segurança nas organizações e indústrias de alto risco, por exemplo.
Assim, a resiliência em fatores humanos se orienta como uma abordagem sistêmica de estudo dos condicionantes da performance humana e das respostas frente a eventos e situações de incerteza e risco, promovendo capacidades dinâmicas e habilidades não-técnicas (ou soft skills) tais como tomada de decisão, comunicação, coordenação, cultura justa, liderança etc.
A institucionalização do HFACTORS como parte de uma das estruturas de pesquisa da PUCRS é decorrente de uma trajetória científica com enfoque em pesquisa interdisciplinar de alto nível, voltada para tratar questões e problemas associados à segurança operacional em sistemas sócio técnicos complexos, tais como o transporte aéreo, setor de óleo e gás, saúde, entre outras.
O Núcleo é formado por equipes interdisciplinares, envolvendo pesquisadores e professores da PUCRS, a partir de iniciativas pioneiras da Escola Politécnica e Escola de Negócios, assim como de outras universidades e instituições parceiras, em áreas como Administração, Sociologia, Serviço Social, Psicologia, Linguística, Engenharias, Mídia e Gestão do Conhecimento. A interdisciplinaridade é vista pelo grupo como um processo de aprendizagem, que acontece de forma cíclica e contínua, baseada em processos de cocriação e coprodução do conhecimento.
Atualmente, os seus principais projetos estão sendo realizados com organizações da indústria de petróleo e gás natural no Brasil. Ao priorizar uma visão interdisciplinar, todas as áreas do conhecimento que compõem o HFACTORS participam das análises e da criação de soluções para o fortalecimento de cultura de segurança organizacional fundamentadas em fatores humanos e resiliência.
O coordenador Giugliani comenta que iniciativas atuais estão voltadas para temas específicos, como princípios de fatores humanos, cultura justa, desenvolvimento de liderança, análise de eventos de segurança operacional, incluindo investigação de acidentes, desenvolvimento de modelo para respostas resilientes, modelagem de operações offshore, análise da comunicação, data mining e outros.
“As atividades ocorrem de maneira integrada entre pesquisadores e colaboradores das organizações, tanto para identificar o que precisa ser desenvolvido, como para propor e implementar ações, baseadas principalmente em metodologias com base em pesquisa-ação (action research)”, comenta.
Alguns dos principais projetos têm o apoio da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, Brasil (ANP) associado ao investimento de recursos oriundos das Cláusulas de PD&I – Regulamento nº 03/2015. Saiba mais!
Um projeto de pesquisa realizado pelo Laboratório de Avaliação e Pesquisa em Atividade Física (Lapafi) da Universidade, em parceria com a UFRGS, visa investigar os efeitos do exercício chamado caminhada nórdica em pacientes que possuem Parkinson. Coordenado pelo professor da Escola de Ciências da Saúde e da Vida da PUCRS Rafael Baptista, o grupo utiliza os resultados obtidos em discussões acerca da reabilitação desse público, utilizando como base os parâmetros de marcha e energia mecânica na execução do exercício físico.
Publicado no Scandinavian Journal of Medicine and Science in Sports, uma das mais importantes revistas científicas da área, o projeto consagrou a parceria entre os dois grupos de pesquisa envolvidos. Apesar de já terem sido encontrados alguns resultados, Baptista conta que ainda serão feitas pesquisas futuras para avaliar as respostas antes e depois das intervenções de exercícios, em especial no público idoso. Além disso, deve ser realizada uma análise para compreender os pontos fortes e fracos da corrida nórdica para pessoas com doença de Parkinson.
A caminhada nórdica é um tipo de intervenção de exercício que usa um modelo de bastões especificamente projetado e conta com a contribuição dos membros superiores do corpo. Com isso, a técnica auxilia o deslocamento do corpo ao se movimentar para a frente, gerando duas ações de propulsão adicionais ao ciclo da marcha.
Os efeitos da caminhada nórdica na doença de Parkinson já foram objeto de estudo de outros grupos de pesquisa, os quais sugerem que ela pode ser benéfica em vários aspectos. Uma vez que eleva a velocidade máxima da caminhada, proporciona uma simetria entre os lados afetados e não afetados pela doença e induz o paciente a ter menos variação no comprimento da passada ao realizar o exercício de caminhada, aumentando a amplitude de movimento do joelho e do quadril. Segundo Baptista, essas mudanças possuem um impacto coletivo na melhoria da capacidade funcional dos pacientes e na redução dos sintomas motores da doença.
Os testes de caminhada conduzidos pelo professor Baptista foram realizados com 11 pessoas que possuíam, em média, 65 anos, e eram portadoras de doença de Parkinson idiopática, medidas na escala Hoehn e Yahr com pontuação entre 1 e 1,5. Além disso, fizeram parte do estudo outros nove participantes saudáveis com 70 anos em média. Todos os participantes eram experientes em caminhada nórdica e os exercícios foram realizados com velocidade de 1,8Km/h e 4,7Km/h, utilizando oito plataformas de força 3D em uma passarela no Lapafi.
Com os resultados foi possível notar que pessoas com doença de Parkinson demonstram alguns ajustes específicos de marcha que são diferentes daqueles observados no público saudável, devido às restrições causadas pelos sintomas da doença. Baptista ressalta que o estudo contribui para o corpo de evidências que sugerem que ajustes mecânicos específicos ocorrem em indivíduos com doença de Parkinson:
“Pudemos apresentar mais evidências sobre o assunto, além de proporcionar evidências científicas para médicos, fisioterapeutas e profissionais de Educação Física no que tange à prescrição de exercícios físicos e reabilitação para os pacientes com esta doença. Por fim, tudo isso auxilia a abrir perspectivas para novos estudos que possam trazer mais avanços no conhecimento e gerar novas formas de intervenção e tratamento”, avalia o professor.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA), que mede a inflação oficial do País, atingiu 1,25%, no mês de outubro, o maior número desde 2002. Com isso, o IPCA atingiu 10,67% nos últimos 12 meses, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Coordenador do Programa de Pós-Graduação (PPG) em Economia do Desenvolvimento, o professor Augusto Mussi Alvim explica que a política econômica brasileira no século 21 sempre esteve marcada por uma orientação pelo controle da inflação através das metas definidas pelo Banco Central.
“De uma maneira geral, independentemente da legenda partidária no governo federal brasileiro, a política de metas de inflação tem sido fundamental para seu controle. Em 2021, a meta é de 3,75% e a expectativa para inflação supera os dois dígitos, o que contribui para que boa parte dos agentes já apostem em maiores reajustes de preços. Se consideramos desde o plano Real, o IPCA somente superou os dois dígitos em 1995, com 22,41% a.a.; em 2002, com 10% a.a.; e em 2015, com 10,67% a.a.”, destaca.
Analisando inicialmente cenário global, a pandemia da Covid-19 contribuiu para mudanças significativas e estruturais em diversas instâncias, como na organização das cadeias de valor globais e regionais, na organização do mercado e do espaço de trabalho, na forma de fazer negócios e no consumo e investimentos na maior parte dos países do mundo. Essas alterações têm desencadeado oscilações generalizadas nos preços, que no curto e médio prazo se apresentam como um desalinhamento entre o poder de compra e os preços dos produtos.
No Brasil, uma série de fatores contribuem para o aumento da inflação. De acordo com a professora do PPG em Economia do Desenvolvimento, Izete Pengo Bagolin, alguns exemplos são os aumentos nas taxas de juros e nos preços dos combustíveis – que afetam tanto os gastos das famílias quanto os custos de produção de diversos produtos. Além disso, há um aspecto que ainda é herança do histórico inflacionário pré-regime de metas de inflação que reajusta diversos preços com base na inflação.
O principal efeito da inflação está no poder de compra imediato das pessoas, afetando o planejamento e a capacidade de investimento da população. “Além de conseguir comprar menos no supermercado, as pessoas pagarão mais juros em prestações, terão mais dificuldade de pagar dívidas, enfrentarão maiores reajustes de mensalidades das escolas e diversos outros problemas”, explica a professora Izete.
Este impacto é ainda mais intenso nas classes mais pobres da sociedade, que dependem da renda para necessidades básicas, como explica o professor Augusto. Ele pontua que a elevação dos preços também contribui para o aumento da desigualdade social brasileira, intensificada neste tempo de pandemia.
“Como não foram realizadas mudanças estruturais no País como, por exemplo, a reforma tributária e fortes investimentos em educação, para alcançar níveis de excelência no ensino básico e médio público, nos momentos de crise (pandemia) o País tende a voltar a mostrar alguns problemas antigos, como elevado custo de produção, elevada desigualdade social e inflação”, observa.
As medidas para evitar a inflação no País a curto prazo são restritas e nada fáceis no atual contexto, em função das causas estarem ligadas a fatores externos ou legais, como explicam os especialistas da Escola de Negócios. A professora Izete Bagolin acredita que a situação no próximo ano não deve se alterar de forma muito significativa em relação ao cenário de 2021.
“Apesar da melhoria do quadro sanitário do País, o próximo ano será difícil em função do ambiente político e incertezas eleitorais. Possivelmente, uma retomada mais consistente, com investimentos de longo prazo, atração de investimento estrangeiro e crescimento econômico mais expressivo só serão possíveis ocorrer quando o ambiente institucional interno melhorar”, sugere.
Já o professor Augusto Alvim pondera as grandes lições que a pandemia trouxe para a população brasileira. “Independentemente das ações do setor público, a sociedade do nosso País mostrou a capacidade de se organizar e cooperar em momentos de extrema dificuldade. E, em tempos de estagflação, torna-se ainda mais importante relembrar como é importante criar novas formas de trabalho, de negócios e de ações colaborativas. Por isso, acredito que 2022 seja um ano de readaptação e de busca por novas oportunidades de negócios e trabalhos, com mudanças positivas para o povo brasileiro”, anseia.
No Programa de Pós-Graduação em Economia do Desenvolvimento da Escola de Negócios da PUCRS, o assunto é tema de diversas pesquisas. A tese de doutorado de Marívia de Aguiar Nunes, com orientação do professor Augusto Mussi Alvim, abordou a política monetária brasileira no período pós-metas de inflação, realizando uma avaliação da regra de Taylor, uma estimação da taxa de juros real neutra e uma análise dos impactos do crédito direcionado.
Já a tese de doutorado de Eduardo Rodrigues Sanguinet analisou a geografia da integração nas cadeias globais de valor e as oportunidades de desenvolvimento na América Latina, contou com orientação do professor Augusto Mussi Alvim e do professor Miguel Atienza, da Universidade Católica do Norte, do Chile.
Sanguinet, orientado pelos professores Miguel Atienza, Augusto Mussi Alvim e também Adelar Fochezatto, ainda publicou um estudo neste ano no qual foram realizadas simulações hipotéticas das decisões da política de mitigação da Covid-19 para compreender os impactos regionais na integração nas cadeias de abastecimento, considerando as cadeias de valor nacionais e globais.
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Formado em Ciência da Computação pela PUCRS, com mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação da Universidade e doutorado na King’s College London, o professor e pesquisador Felipe Meneguzzi vem trilhando uma trajetória de sucesso na área da inteligência artificial (IA). Recentemente foi nomeado como conselheiro executivo da Association for the Advancement of Artificial Intelligence (AAAI), maior entidade de IA do mundo, que já teve como membros do conselho grandes nomes da área e hoje é composto por integrantes de universidades como Oxford, MIT, Harvard e Yale. Meneguzzi é o primeiro brasileiro eleito para esse conselho.
Com mais de 20 anos de pesquisa na área de IA, com atuação como professor visitante na University of Aberdeen, na Escócia, e na University of Melbourne, na Austrália, segue a linha de pesquisa de planejamento automático. “Tenho me dedicado a estudos de reconhecimento de objetivos, ou seja, sistemas que tentam identificar o que uma pessoa ou agente está querendo atingir”, comenta.
Para Meneguzzi o futuro da Inteligência Artificial está em potencializar o que os seres humanos já fazem. “Não vejo a IA substituindo o indivíduo, mas sim ajudando e potencializado determinada tarefa, uma forma de expandir a nossa mente”, explica. Para o pesquisador, um exemplo está na desinformação nas redes, onde um ser humano utiliza a IA de forma mal-intencionada para propagar fake news, por exemplo. “A IA possibilita amplificar iniciativas positivas, mas ao mesmo tempo pode ser utilizada de maneira negativa”, adiciona.
Para o pesquisador, carros autônomos, apesar de muito discutidos, também não devem se tornar realidade em um futuro próximo. Esses sistemas estão baseados em aprendizado de máquina que ainda precisa ser muito desenvolvido e avaliado:
“O que eu vejo para o futuro é uma diminuição do número de pessoas fazendo uma mesma tarefa, mas não tarefas que eliminarão totalmente o ser humano. Costumo dizer que tenho uma visão mais positiva sobre a IA”, comenta.
Sobre a presença da IA nas atividades humanas, Meneguzzi reflete ainda que tais inserções deverão trazer alterações na sociedade. “Isso nos fará pensar mais profundamente sobre a dignidade do ser humano, sobre o que é um trabalho digno. Essas reflexões vão ser cada vez mais fortes, reavaliando a humanidade”, completa.
Sobre sua nomeação para a Association for the Advancement of Artificial Intelligence, o pesquisador da Escola Politécnica celebra o reconhecimento de seus pares fora do Brasil. “Acredito que a oportunidade é fruto de contatos. Para a carreira, enquanto pesquisador, avalio a indicação como questão de respeito na área e me orgulha dividir espaço com nomes prestigiosos”, adiciona.
A quinta edição do Boletim Desigualdade nas Metrópoles destacou que a média de rendimentos das regiões metropolitanas do Brasil alcançou o segundo pior nível de toda a série histórica.
O estudo, elaborado pelo Observatório das Metrópoles, em parceria com a PUCRS e com o Observatório da Dívida Social na América Latina (RedODSAL), mostrou que no segundo trimestre de 2021 a renda média foi de R$ 1.326,34. Apenas no primeiro trimestre de 2012, ano de início da série, os valores atingiram o mesmo patamar, ficando em R$ 1.323,23.
A pesquisa aponta que a média da renda domiciliar per capita do trabalho vem apresentando tendência de queda desde o quarto trimestre de 2019, e de modo muito acentuado a partir do segundo trimestre de 2020, em consequência da pandemia da Covid-19.
Segundo André Salata, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS e um dos coordenadores do estudo, no conjunto das metrópoles a redução consecutiva da renda nos últimos seis trimestres mais do que reverteu os ganhos de renda obtidos nos anos anteriores, desde 2017. O pesquisador ainda ressalta a preocupação com a queda contínua no último ano.
“Tivemos uma queda colossal entre o primeiro e o segundo trimestres de 2020, no início da pandemia. O que mais chama atenção, no entanto, é que desde então a média de renda continua caindo, sem apresentar sinal de recuperação”.
O estudo também mostra que apesar das famílias mais pobres terem sofrido perdas proporcionalmente maiores em sua renda, em todos os estratos a renda média ainda é significativamente menor que aquela do período anterior à pandemia. Entre os mais ricos, a renda média do segundo trimestre de 2021 era 8,3% menor do que a encontrada no primeiro trimestre de 2020. Entre as famílias que compõem a camada de renda intermediária, essa perda foi de 5,1%. Já entre os mais pobres, a perda foi de 22,1% do rendimento médio.
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De acordo com Salata, após uma queda abrupta da renda entre o primeiro e o terceiro trimestre de 2020, a renda dos mais pobres tem apresentado tendência contínua de recuperação. “O problema é que esta recuperação tem se dado de modo muito lento, em função de um mercado de trabalho que não consegue se recompor do choque sofrido pela pandemia. O resultado é que há milhares de famílias nos estratos mais baixos de renda que há muitos meses sofrem com uma substantiva redução de seus rendimentos provenientes do trabalho”.
Para Marcelo Ribeiro, professor da UFRJ e também coordenador do estudo, a exposição ao mercado de trabalho é o principal fator para a recuperação da renda entre os mais pobres. “Como se trata de um segmento populacional que tem grande dependência do mercado de trabalho para composição de sua renda, desde o final do 2020 observamos aumento de sua renda média, mesmo que em patamares ainda muito baixos e significativamente inferiores ao período pré-pandemia”.
De acordo com o estudo, com a diminuição dos rendimentos no segundo trimestre de 2021, mais de 23 milhões de pessoas (28,1% da população das metrópoles) passaram a viver em domicílios com renda média per capita de até ¼ do salário-mínimo. Apesar da leve redução em relação ao trimestre anterior, quando essa taxa era de 29,4%, o cenário ainda está distante do alcançado antes da pandemia, de 24,5%. Em termos absolutos, a pandemia adicionou mais 3,2 milhões de pessoas na linha abaixo de ¼ de salário-mínimo nas metrópoles.
Segundo Salata, essa é uma situação ainda mais preocupante, por se tratar de um processo já de longa duração. Os dados indicam que muito possivelmente há milhares de famílias de baixa renda que há alguns trimestres seguidos vêm tendo que lidar com uma redução substantiva em seus rendimentos.
“A queda de renda a longo prazo é ainda mais prejudicial, pois as poucas reservas de recursos vão se esgotando, e as soluções paliativas e temporárias também. É urgente adotar medidas para aquecer o mercado de trabalho, a fim de aliviar situação dessas famílias”.
Confira na íntegra o Boletim Desigualdade nas Metrópoles nº 05 e acesse as tabelas e gráficos do estudo.
O estresse psicológico acelera o envelhecimento fisiológico e imunológico em vários aspectos. Isso é o que foi estudado por Moisés Bauer, pesquisador e coordenador do Laboratório de Imunobiologia da Escola de Ciências da Saúde e da Vida. “Demonstramos essa relação pela primeira vez há mais de 20 anos, descrevendo altos níveis de estresse, ansiedade e depressão em idosos de 60 a 91 anos, muito saudáveis, que viviam de forma independente na região metropolitana do Rio Grande do Sul”, conta o professor.
De acordo com ele, essa sobrecarga emocional relacionada ao estresse aumentava níveis do hormônio cortisol (marcador biológico do estresse) no organismo e debilitava a capacidade de proliferação dos linfócitos T, uma importante função da nossa imunidade celular, implicada na defesa contra vários patógenos, incluindo vírus e câncer.
“Vimos que idosos cronicamente estressados (cuidadores de pacientes com Alzheimer, por exemplo) têm essa imunidade celular ainda menor quando comparados a idosos não estressados. Essa redução foi também associada a níveis elevados do hormônio cortisol”, completa Moisés.
O pesquisador explica que o estresse pode acelerar o principal relógio biológico já estudado, diminuindo o tamanho das extremidades dos cromossomos (chamadas telômeros). Em cada etapa de divisão celular, os cromossomos ficam um pouco mais curtos na região dos telômeros. Para evitar um encurtamento expressivo e a perda de material genético relevante, as células se tornam senescentes, ou seja, perdem a capacidade de renovação celular e param de se dividir. O tamanho dos telômeros se relaciona inversamente com o envelhecimento cronológico.
“Sujeitos entre 20 e 50 anos com doenças crônicas, que têm grande sobrecarga de estresse emocional ao longo das suas vidas, como pacientes com transtorno bipolar do tipo I, apresentam mais células imunes senescentes no sangue e telômeros dos linfócitos mais encurtados do que sujeitos controles – sugerindo um envelhecimento biológico acelerado”, explica o professor.
Além disso, o estresse psicológico está associado com uma maior atividade inflamatória de base, com aumento de várias proteínas inflamatórias no sangue. O processo de envelhecimento aumenta gradualmente essa atividade inflamatória sistêmica (conhecida como inflammaging) que se relaciona com o desenvolvimento de doenças neurodegenerativas, metabólicas e câncer. O estresse antecipa o inflammaging e dessa maneira acelera o envelhecimento em jovens adultos com transtornos do humor (como depressão).
“Sabemos hoje que esse aumento de inflamação relacionado ao estresse agrava os transtornos do humor, e drogas anti-inflamatórias são eficientes para tratar esses pacientes”, adiciona o pesquisador. Segundo ele, a sobrecarga emocional, em qualquer etapa na vida, está associada com uma imunossenescência mais acelerada, imunidade mais baixa, com mais células senescentes (com telômeros encurtados) e maior atividade inflamatória de base.
A pesquisa conduzida pelo pesquisador Moisés Bauer integra as linhas de pesquisa em neuroimunologia e imunossenescência. Os estudos são conduzidos com diversos parceiros nacionais e internacionais, além de fazer parte de redes temáticas dentro e fora do Brasil.
Atualmente, o grupo de pesquisa Imunologia do Estresse, coordenado por Bauer, desenvolve projetos que visam analisar a relação da imunossenescência com a Covid-19, tanto na identificação de idosos da comunidade com maior risco de desenvolvimento de infecções graves (em parceria com o professor Douglas Sato) bem como em adultos hospitalizados com Covid-19 grave (em parceria com o professor Marcus Jones e a professora Florencia Barbé Tuana).
No início de setembro, o professor Moisés Bauer ficou entre os dez principais pesquisadores na área de imunossenescência no site Expertscape. A plataforma ordena pesquisadores, clínicos e instituições em mais de 29 mil tópicos biomédicos. A partir do ranqueamento mundial em cada área específica, seleciona os especialistas no assunto. A pesquisa foi feita com as produções nos últimos dez anos (2011-2021), totalizando 1015 artigos publicados neste período.
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Que o TikTok é a rede social da pandemia todo mundo sabe, mas até quando essa onda pode durar? Qual o segredo por trás do sucesso da rede? O que o público espera da plataforma? Essas são algumas das perguntas que os estudantes do curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos da PUCRS, orientados pelo professor Ilton Teitelbaum, buscaram responder com a pesquisa O Crescimento do TikTok e o Impacto da Pandemia nos Usuários de Redes Sociais.
Antes de mais nada, é importante entender o que é o TikTok e de onde ele surgiu. Trata-se de uma rede social para o compartilhamento de vídeos curtos, com até três minutos de duração, na qual os usuários contam com diferentes ferramentas de edição e podem incluir filtros, legendas, trilhas sonoras, gifs e efeitos de forma prática e intuitiva.
Seu conteúdo é baseado em tendências e os usuários realizam challenges (desafios), dublagens, imitações e coreografias. Isso instiga a participação de outras pessoas e atrai, principalmente, o público jovem. Além disso, sua aba explorar possui um apelo para a viralização de conteúdo, fator determinante para o crescimento e o sucesso do TikTok. Foi essa característica que levou a jovem Sofia Müller, que, hoje, possui cerca de 50 mil seguidores na rede social, a produzir conteúdo para o aplicativo.
“O TikTok oferece chance para pessoas desconhecidas viralizarem. Eu consegui fazer a minha marca de roupas crescer através da rede”, comenta.
Em 2017, o TikTok, ainda bem diferente do que conhecemos hoje em dia, comprou o aplicativo Musical.ly e a união de ambos é a rede social que conhecemos hoje em dia. O início da pandemia, em 2020, foi um momento marcante na história da rede, pois foi quando ultrapassou dois bilhões de downloads nas lojas de aplicativos. De acordo com levantamento realizado pela Global/WebIndex, já existem cerca de sete milhões de usuários cadastrados no Brasil, que gastam cerca de uma hora por dia no aplicativo.
Uma das características é a monetização de seus usuários através de rubis, o dinheiro virtual do aplicativo. Os usuários podem recebê-los de sua audiência, durante lives, ou através de tarefas ou indicação de pessoas para que baixem a plataforma.
Para o influenciador digital Lucas Ruschel, que ingressou no app no período da crise sanitária de Covid-19, o que mais chamou atenção foi o aumento repentino no número de usuários. Com mais de 150 mil seguidores, ele acredita que a pandemia tenha sido o fator decisivo para esse crescimento. Sua hipótese conta com o apoio da psicóloga Mariah Paranhos. Segundo ela, “sempre tem um aplicativo do momento que talvez venha até de uma necessidade da sociedade propriamente”. Para Mariah, a necessidade suprida pelo TikTok é a falta de contato humano durante a pandemia, período em que se popularizou no Brasil.
Outro número que aumentou durante a pandemia foi o de pacientes de Mariah, que revela que a questão do TikTok sempre acaba se tornando pauta entre os adolescentes. No entanto, ela alerta que as redes sociais são potenciais vícios e que é importante saber de forma clara qual é o seu objetivo com o aplicativo para utilizá-lo sem preocupações.
O potencial de viralização é outro perigo da rede ao pensar em saúde mental, pois, como apontado pela psicóloga, uma pessoa que é beneficiada pelo algoritmo em algum momento pode, rapidamente, cair no esquecimento. Isso pode gerar frustrações dependendo da personalidade e da forma com que esse indivíduo lida com as redes sociais.
A professora da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos Gabriela Kurtz acredita que sim, o TikTok continuará. Mas, de acordo com ela, pode ser que a rede deixe de ser a “febre” que é atualmente. Isso porque um dos fatores que contribuem para manter as pessoas engajadas na plataforma é o tédio, que tende a se tornar menos frequente à medida que as coisas voltem à normalidade.
A opinião dos usuários do TikTok sobre sua durabilidade varia muito. Lucas acredita que dificilmente ele deixe de existir, mas que, de fato, há chances de que os números caiam. Já Sofia crê que é uma rede momentânea e, portanto, tem prazo de validade.
Esse aspecto chamou a atenção dos integrantes do grupo que realizou a pesquisa, incluindo o estudante Rodrigo Ruschel, que afirmou ter sido surpreendente perceber quantas pessoas consideram essa uma rede social momentânea e afirmaram não ter pretensão de utilizá-la após a pandemia.
Como parte da pesquisa, jovens de 18 a 24 anos de Porto Alegre e região foram convidados a responder um questionário sobre o uso de redes sociais na pandemia. Ao todo, foram obtidas 223 respostas, sendo 63,2% de mulheres, 37,2% de homens e 0,4% de pessoas que se identificaram como outros. A partir das respostas, foi possível ver, em dados, como é o comportamento dessa faixa da população nas redes.
Enquanto mais da metade dos jovens não alteraram seu consumo de rádio e jornal durante a pandemia, quando se fala em televisão e redes sociais a situação é diferente: aproximadamente quatro a cada dez aumentaram pouco o consumo de televisão e mais de 60% o de redes sociais.
Dentre as redes favoritas desse público, ocupam o topo do ranking, respectivamente, o Instagram, o WhatsApp e, é claro, o TikTok. Praticamente metade dos jovens afirmou utilizar redes sociais de duas a quatro horas por dia.
Quando se fala em destaques da pandemia o resultado já é o esperado: Instagram e TikTok foram os aplicativos que mais chamaram atenção no período, além disso, foram apontados como os que fornecem a melhor visibilidade para influenciadores e para usuários comuns, o maior poder de viralização para vídeos e o maior potencial de destaque para o pós-pandemia.
Embora a maioria do público utilize o TikTok, quase 40% afirmaram ainda não serem usuários da plataforma. Entre os motivos apresentados para isso, destacam-se a negação de ter mais uma rede social em sua vida, a falta de identificação com o público do aplicativo e o medo de se tornar um usuário excessivamente ativo. No entanto, foi, também, apontado o que faria com que esses jovens ingressassem à rede, sendo os principais atrativos a disponibilidade de conteúdos mais diversificados e a criação de grupos e/ou comunidades dentro do aplicativo.
Entre os jovens que já utilizam a plataforma, quase todos afirmaram ter realizado o download como forma de distração (94,3%) e uma parcela significativa para pesquisa de referências (21,4%). A rede também mostrou ser mais utilizada durante a noite e com uma participação maior das mulheres do que dos homens, sendo a maior parte deles usuários que apenas visualizam os conteúdos (58,8%) e o menor percentual o que visualiza, posta e interage (apenas 9,2%).
Eles sugerem, ainda, que, para o sucesso do TikTok ser ainda maior, falta interação entre os usuários, suporte aos criadores de conteúdo e alterações no layout da plataforma. Para eles, a rede social perfeita é formada pela característica “good vibes” do Instagram, pela privacidade encontrada no WhatsApp e pela descompressão apresentada pelo Tiktok.
O estudo O Crescimento do TikTok e o Impacto da Pandemia nos Usuários de Redes Sociais foi elaborado pelos/as estudantes André Barcellos, Caroline Hennicka, Felipe Paes, Julia Prado, Pedro Tassoni, Rafael Domingues, Rodrigo Ruschel, Thaísa Zilli Batista, Uillian Vargas e Vinicius Mourão, da disciplina de Projeto de Pesquisa de Mercado em Publicidade e Propaganda, ao longo do primeiro semestre de 2021.
“Essa disciplina foi uma das que mais contribuíram para o nosso aprendizado, pois precisamos gerenciar uma equipe, dividir tarefas, trabalhar com prazos e, além disso, elaborar uma pesquisa completa, com início meio e fim, comparando etapas qualitativas e quantitativas”, relembra Rodrigo.
Em sua etapa qualitativa, a pesquisa contou com 12 entrevistas em profundidade, sendo oito delas com jovens de 18 a 24 anos da região de Porto Alegre, duas com influenciadores digitais do TikTok (Lucas Ruschel e Sofia Müller), uma com uma psicóloga (Mariah Paranhos) e outra com uma comunicadora social (Gabriela Kurtz). Depois, na fase quantitativa, foram 223 respostas válidas em uma coleta feita por meio de questionário online.
As professoras da Escola de Humanidades da PUCRS Lilian Cristine Hübner e Marilia Costa Morosini foram agraciadas com o Prêmio Pesquisador Gaúcho 2021 nas categorias Artes, Letras e Linguística e Educação, respectivamente. O reconhecimento é concedido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do RS (Fapergs), vinculada à Secretaria de Desenvolvimento Econômico Ciência e Tecnologia e foi divulgado na última sexta-feira, dia 17.
A edição do Prêmio Pesquisador Gaúcho 2021 tem como tema A Ciência a serviço da sociedade, destacando a contribuição da ciência no combate à pandemia e o seu potencial em gerar inovação, riquezas e bem-estar, contribuindo para uma sociedade melhor. A solenidade de premiação com os 14 agraciados será virtual, realizada por transmissão, no período de 17 a 23 de outubro.
Para o pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação, Carlos Eduardo Lobo e Silva, a premiação das pesquisadoras é motivo de orgulho e celebração para a Universidade. “O Prêmio Pesquisador Gaúcho é um importante reconhecimento das trajetórias acadêmicas de absoluto destaque para as professoras Lilian Hübner e Marilia Morosini. Parabenizo as pesquisadoras pelo empenho em suas áreas de pesquisa e pela notável atuação em nossa Escola de Humanidades”, adiciona.
Lilian Cristine Hübner é professora no curso de Letras e no Programa de Pós-Graduação em Letras da PUCRS. É graduada em Licenciatura Plena em Letras habilitação Português-Inglês, com mestrado e doutorado em Letras. Passou por instituições internacionais como a Universidade de Montreal, no Canadá, e Université Pierre et Marie Curie, na França, onde realizou estágio pós-doutoral. Tem experiência na área de Letras, atuando principalmente em temas como linguagem-envelhecimento-escolaridade, aquisição de língua adicional, bilinguismo e multilinguismo, processos cognitivos ligados ao processamento da linguagem no CCL, na Doença de Alzheimer, na Afasia Progressiva Primária e nos acidentes cérebro-vasculares, adaptação e elaboração de instrumentos de avaliação da linguagem típica e atípica.
Marilia Costa Morosini é professora no Programa de Pós-Graduação em Educação e coordenadora do Centro de Estudo em Educação Superior. Bolsista produtividade 1A do CNPq, possui licenciatura e bacharelado em Ciências Sociais, mestrado em Sociologia Educacional e doutorado em Educação, com pós-doutorado na Universidade do Texas, nos Estados Unidos. Sua produção atual está voltada a estudos de conhecimento, destacando-se a Enciclopédia de Pedagogia Universitária, o Glossário de Pedagogia Universitária, a Enciclopédia Internacional de Educação Superior para os Países de Língua Portuguesa e a Enciclopédia Brasileira de Educação Superior. Tem experiência na área de Fundamentos da Educação, atuando em: educação superior, qualidade da educação superior, formação de professores, internacionalização da Educação Superior, diversidade e equidade na educação superior.
Nas últimas semanas o mundo tem acompanhado as incertezas e o temor em relação ao retorno do Talibã ao poder no Afeganistão. Entender a origem e os impactos desse conflito exige uma abordagem interdisciplinar. Nesse sentido, pesquisadores da Universidade contribuem com o debate sobre o tema em diferentes áreas de estudo, refletindo sobre os processos culturais, diplomáticos e migratórios ocasionados pelo movimento.
Orientado por uma leitura radical da lei islâmica (Sharia), o grupo fundamentalista Talibã surgiu no norte do Afeganistão no início da década de 1990, após a retirada das tropas soviéticas. Em 1995, após assumir o poder, o grupo deu início a um governo marcado pelo uso de formas violentas de coerção e pela drástica restrição de liberdades individuais. A queda dos talibãs ocorreu em 2001, com a invasão do Afeganistão pelos Estados Unidos, após o atentado às Torres Gêmeas.
Coordenadora do curso de Relações Internacionais, a professora Teresa Cristina Marques explica que o retorno dos talibãs ao poder significa o fracasso da ocupação e da retirada das tropas norte-americanas, acusadas de não terem dialogado com os grupos locais.
“Já para a população afegã, o retorno do Talibã significa medo e aumento da violência política e social, sobretudo para mulheres, jornalistas, intelectuais e a população que contribuiu de alguma forma com as forças de ocupação”, comenta.
Em relação à diplomacia mundial, Teresa explica que embora os países tenham, em princípio, autonomia no processo de tomada de decisão no reconhecimento ou não do governo talibã, pode haver custos ou ganhos políticos implicados. Isto é, o reconhecimento de um regime específico pode incentivar um novo olhar da comunidade internacional a um determinado ator político, diminuindo ou aumentando o seu poder de influência e a sua inserção internacional.
Isso pode ocorrer devido ao fato de que o reconhecimento de um novo regime ou governo pode ser entendido enquanto alinhamento com determinados valores ou princípios políticos. “Como vivemos em uma sociedade internacional marcada pela valorização da democracia e dos direitos humanos – sobretudo após a terceira onda de democratizações – é inevitável que o reconhecimento de regimes autoritários que violam direitos humanos, implique em maior custo político, além de ter graves consequências humanitárias ao legitimar a violência política”, comenta.
Teresa Marques argumenta que é fundamental que a população afegã receba auxílio dos países estrangeiros. A professora cita a Anistia Internacional, que defende que a ajuda internacional é indispensável para garantir a segurança do grande número de afegãos ameaçados pelo regime. “Tal ajuda não deve poupar esforços na garantia de concessão de vistos, realocações e reassentamento da população afegã refugiada, bem como no envio de suportes para as evacuações a partir do aeroporto de Cabul e suspensão das deportações ao país”.
As mulheres são uma parcela da população que é diretamente impactada pela violência do regime talibã. Entre 1996 e 2001, elas vivenciaram o impedimento de frequentar a escola, a obrigação de cobrir o corpo entre várias outras restrições graves às suas liberdades individuais. Diante do grave risco às suas vidas e dignidades, elas se tornaram uma prioridade para os organismos internacionais e foco da atenção da sociedade internacional.
A Organização das Nações Unidas (ONU), que permanece no país, já expressou a esperança de que um acordo pacífico com os talibãs permita a promoção dos direitos das mulheres e meninas afegãs. “Evidentemente, o cenário é complexo e já há registro de perseguição às mulheres, demonstrando que o alcance da comunidade internacional no país é limitado no presente momento”, comenta a professora Teresa.
Além disso, os relatos da interrupção do acesso ao sistema de ensino e de perseguição de intelectuais no país, demonstram que a situação das mulheres no país já é muito grave. Estudos apontam que elas e as crianças são uma parte considerável dos fluxos de refugiados que já se formam.
Segundo o professor e pesquisador da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos Jacques Wainberg o conflito é também cultural. “Cultura implica em moralidade e normas sociais. O Talibã está baseado na Sharia, interpretação que retira do texto religioso regras para a vida do cotidiano, ou seja, um estado teocrático. Buscam resgatar um estilo de vida que imaginam que tenha existido durante a vida de Maomé, uma tentativa de transformar em realidade uma utopia islâmica”, explica.
O professor destaca que diversos grupos rebeldes adotam uma visão contrária aos valores da sociedade liberal, típica do Ocidente, tais como Al-Qaeda, Estado Islâmico, Irmandade Muçulmana e o próprio Talibã. Este último formado por estudantes das escolas islâmicas, desejosos em fundar um estado islâmico e expulsar as forças estrangeiras. “Na origem, eram os russos e depois os americanos e seus aliados”, comenta Wainberg.
O Ocidente também viveu conflitos de natureza cultural, destaca Jacques, como a guerra entre católicos e protestantes que matou mais de oito milhões de pessoas. “No entanto, o Ocidente adotou uma postura de modernização e separou o estado da religião e criou uma filosofia cuja o fundamento é a tolerância recíproca. Essa doutrina é o que se espera que ocorra, mas é o que não temos visto nas atitudes do Talibã”.
Para Wainberg, o conflito no Afeganistão hoje reatualiza um debate internacional sobre o choque de civilizações – teoria de Samuel Huntington que discute que as identidades culturais e religiosas dos povos serão as principais fontes de conflito no mundo pós-Guerra Fria. “Com muitos pontos de vista divergentes, o conflito atual no Afeganistão contribui para a formação de uma forte corrente no Ocidente de crítica ao Islã radical. Por isso, vemos um aumento contínuo, especialmente entre grupos nacionalistas e conservadores, de oposição na imigração de refugiados muçulmanos”, explica o professor.
Para o professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em História Antonio de Ruggiero a reconquista do Afeganistão pelos talibãs se torna uma grande questão na região da Ásia Central, e ao mesmo tempo cria um problema migratório potencialmente enorme. Em particular, a Europa neste momento lida com uma com grande dificuldade, considerando a concomitância nos últimos tempos de várias crises como a da Tunísia e da Líbia, além da guerra civil na Síria, todos eventos que geraram grandes fluxos migratórios difíceis de controlar e gerenciar.
Mesmo antes da atual crise, nos últimos cinco anos cerca de 400 mil afegãos chegaram à Europa pedindo o reconhecimento de tutelas e formas de proteção, já que, apesar da derrota em 2001, os fundamentalistas continuavam presentes no território. “Mais ou menos a metade destes pedidos foi rejeitada em primeiro grau. Hoje, porém, frente à nova crise que colocou os talibãs no governo, acho muito improvável que a Europa não reconsidere a sua decisão assistindo à presença de um governo extremista islâmico fortemente repressor no Afeganistão”, opina.
Para de Ruggiero, hoje o Talibã aparece mais aberto ao mundo e à utilização das novas tecnologias e das novas comunicações. Se na década de 90 eles vetaram qualquer utilização de imagens femininas ou do corpo humano em geral, hoje parecem mais dispostos a dialogar com jornalistas mulheres, ou a utilizar os novos meios digitais, a trocar vídeos e imagens no celular.
“Apesar de um discurso estratégico mais moderado, me parece, porém, claro que a segurança dos opositores e das minorias está sob grandes riscos. Além das imagens assustadoras de fuga dos últimos dias, o que mais me induz a ser pessimista é justamente a alma fortemente fundamentalista deste movimento que predica governos teocráticos, apesar dos retoques de circunstâncias”, finaliza.
Em Cerro Largo, pequena cidade localizada há cerca de 400 km de Porto Alegre, o Museu 25 de Julho exibia uma múmia egípcia. De acordo com a instituição, ela foi doada por Marcelino Kuntz, que a recebeu como presente na década de 1950. Embora estivesse há mais de meio século na cidade, sua autenticidade ainda não havia sido confirmada, até que, em 2017, pesquisadores da PUCRS a trouxeram à capital gaúcha, onde sua identidade foi confirmada.
No último ano, análises bioarqueológicas realizadas pelos pesquisadores Edison Hüttner, da Escola de Humanidades, Eder Hüttner e Bruno Candeias identificaram células intactas na múmia, batizada como Iret-Neferet. Por essa descoberta, receberam, neste mês, o prêmio Descobertas do Ano da revista Aventuras na História.
“Essa descoberta se torna importante por três motivos: em primeiro lugar, por ser inédito encontrar uma múmia egípcia em uma cidade do interior do Rio Grande do Sul e, além disso, por ela ter suas células extremamente preservadas e, por fim, pela característica interdisciplinar da pesquisa, cada vez mais relevante no âmbito acadêmico”, explica o professor Luciano Aronne de Abreu, coordenador do Grupo de Identidades Afro-Egípcias.
Para descobrir a idade da múmia, os pesquisadores utilizaram um dos principais métodos de datação de fósseis, o radiocarbono C-14, que leva em consideração o decaimento radioativo do carbono 14, presente nos seres vivos, ao longo do tempo. Assim, conseguiram estimar que Iret-Neferet viveu por volta de 768 e 476 a.C., ou seja, entre o final do Terceiro Período Intermediário (1070-712 a.C.) e o início do Período Tardio (712-332 a.C.).
Também foi encontrado um olho esquerdo artificial, inserido durante o processo de mumificação. Esse elemento é um dos principais amuletos egípcios. Sua origem remonta à mitologia egípcia, a qual conta que o deus Hórus teve seu olho esquerdo arrancado por seu irmão Seth durante uma luta. Foi essa característica que deu origem ao nome da múmia, Iret-Neferet, que significa a mulher de olho bonito. Os pesquisadores contam que por não haver escrita nas faixas que a envolviam e apenas sua cabeça ser conhecida, seria difícil descobrir o verdadeiro nome da egípcia.
Recentemente, em outubro de 2020, os pesquisadores divulgaram no Congresso da Associação Europeia de Osteointegração, em Berlim, na Alemanha, a descoberta de células intactas no corpo da múmia. O processo de mumificação – seja o natural ou o induzido – consiste na preservação dos tecidos, causada pela desidratação do corpo antes que as bactérias responsáveis pela decomposição possam atuar, no entanto, a precisão da preservação celular surpreendeu.
Essa análise, realizada no Laboratório de Anatomia Patológica do Hospital São Lucas da PUCRS, utilizou parte dos ossos cranianos conhecidos como mandíbula e masseter. Neles, foi possível identificar hemácias dentro dos vasos sanguíneos. A existência de células preservadas possibilita que sejam realizadas novas análises, como as de DNA, as quais auxiliariam a identificar características físicas, possíveis doenças e o parentesco de Iret-Neferet.
Em comemoração aos 18 anos da primeira revista impressa da Aventuras da História, na época da Editora Abril, foi lançado, em julho de 2021, o prêmio Descobertas do Ano. O seu objetivo é dar visibilidade a historiadores, pesquisadores, jornalistas e jovens influenciadores que usam o seu espaço na internet para educar, informar e alertar as próximas gerações. Além disso, possibilita que esses profissionais, impactados pela pandemia, sejam valorizados.
Os pesquisadores ganharam a categoria Descoberta do Ano, pela descoberta das células intactas de Iret-Neferet.
O Grupo de Identidades Afro-Egípcias, responsável pela pesquisa, realiza estudos interdisciplinares sobre essas sociedades. Composto por uma equipe renomada de pesquisa, de diferentes universidades, teve como últimas descobertas uma deusa Nimba da etnia Baga/Nalu feita por descendentes africanos, no município de Santo Ângelo (RS) e a cabeça da múmia Iret-Neferet.