A Escola de Humanidades, por meio do Laboratório das Infâncias (LabInf), desenvolveu um projeto de contação de histórias para crianças da rede municipal do Bairro São José, no Morro da Cruz, zona leste de Porto Alegre. Trata-se do projeto LabInf na Escola, que nasceu para promover a realização de oficinas que contribuam tanto na educação da infância quanto na formação de professores.
A iniciativa para a criação do projeto partiu da professora Drª Andreia Mendes dos Santos, coordenadora do Núcleo de Estudos sobre as Infâncias e Educação Infantil (NEPIEI), integrado ao próprio LabInf, também coordenado por ela. Além da docente, integram o projeto Maria Souza dos Santos e Sandra Canal, doutorandas em Educação (bolsistas CAPES), Rossana Gueller Ruschel (bolsista CNPQ), mestranda em Ciências Sociais e Cecília Moreira Borges, Eduarda Brodacz de Vasconcelos, Laura Antunes Cazella, Laura Mocelin Notti e Tainá Tubino Moreira de Souza, estudantes de Psicologia (bolsistas de Iniciação Científica).
O LabInf na Escola tem atendido turmas de educação infantil da EMEF Morro da Cruz, cuja equipe pedagógica, em reunião com os integrantes do LabInf, acolheu a iniciativa. O projeto, que iniciou no mês de setembro, terá ao todo quatro atividades, no período matutino. A cada encontro, uma turma da educação infantil foi contemplada e com uma proposta diferente.
Para a primeira oficina, foi escolhida a história “Romeu, o Garnisé Aventureiro”, de autoria da pesquisadora Sandra Canal em parceria com seu filho, Nycolas Canal Tenis. As páginas da narrativa foram fixadas em uma caixa de papelão em forma de “cineminha”. Durante uma roda de conversa, as crianças foram instigadas a refletir sobre “de onde vêm os ovos?”, e convidadas a confeccionar um galo com argila e com elementos da natureza.
A segunda contação de história deu-se a partir da obra “A Cesta da Dona Maricota”, da autora Tatiana Belinky. O enredo foi narrado e encenado por integrantes do projeto, despertando a curiosidade das crianças, que permaneceram muito atentas. Os materiais usados – que estão expostos no LabInf, no prédio 9 – foram confeccionados pela pesquisadora Sandra Canal e feitos a partir de recursos simples e de forma artesanal (um fogão, uma geladeira e uma pia de papelão). Também foram utilizados utensílios em desuso, doados pelas participantes da equipe e por outros pesquisadores do grupo. A professora regente Silvia Lima Jacques afirmou que a atividade despertou a criatividade e sensibilizou as crianças do Jardim B2 (que têm entre 5 e 6 anos).
“A oficina foi maravilhosa. A maneira como foi apresentada a história despertou o interesse, a curiosidade e o desejo das crianças em manusear, conhecer e principalmente brincar naquele ambiente. Além disso, foi mostrada a importância da alimentação saudável”, disse ela, que se sentiu estimulada a realizar mais atividades do tipo com a turma.
Na opinião da doutoranda Sandra Canal, os móveis feitos com materiais reaproveitáveis “são valiosos para mostrar que é possível construir brinquedos que se aproximam muito da realidade em que as crianças vivem, tornando bem parecido com atividades do cotidiano de suas casas”.
Em uma terceira oficina, o grupo de pesquisadoras contou para as crianças a história “Africana: Uma princesa diferente”, escrita por Cristiane Sousa. Foi promovida uma roda de conversa para levantar discussões sobre questões raciais históricas e contemporâneas, e as crianças aprenderam a confeccionar uma boneca Abayomi (representativa da cultura africana) com retalhos de tecido.
Maria Souza, uma das doutorandas que integram o projeto, explica o propósito e a importância da iniciativa:
“O propósito do projeto é atender à diversidade, propiciando às crianças momentos de interações, brincadeiras, criação e recriação, além de oportunizar aos professores a compreensão das aprendizagens embutidas na contação de histórias, lançando mão de recursos/materiais simples, não estruturados, que possibilitam uma aprendizagem equitativa. O projeto visa proporcionar às crianças um leque de experiências, conhecimentos e saberes, por meio de atividades lúdicas e interações no ambiente educacional”, pontua ela.
Em 1959, a Organização das Nações Unidas criou a Declaração dos Direitos da Criança, um momento que marcou na história a infância, como um tema global. Desde então, ampliaram-se os olhares e discussões acerca dos direitos das crianças, bem como o papel das escolas e das políticas em prol desta etapa da vida. Atualmente, além destes assuntos, debate-se muito sobre o sentido do brincar no cotidiano infantil e seu impacto no desenvolvimento das crianças.
De acordo com Andreia Mendes, professora da Escola de Humanidades e coordenadora do Laboratório das Infâncias da PUCRS (LabInf), o brincar permite que o indivíduo, seja criança ou adulto, perceba o mundo e desenvolva suas relações com o meio físico e social. Em pesquisas realizadas na universidade, descreveu-se que a atividade lúdica de jogos e brincadeiras proporciona momentos propícios para socializar, criar, imaginar, aprender, interagir, conhecer e vivenciar o cotidiano.
Esta compreensão parte da noção de que, no momento em que as pessoas se relacionam com o ambiente e com outros indivíduos, elas desenvolvem suas capacidades de raciocínio, pensamento, linguagem, comunicação e afetividades. Compreende-se também que o ser humano é uma espécie dialógica, ou seja, que necessita da interação para se desenvolver através dos aspectos motor, afetivo e cognitivo, a fim de construir suas aprendizagens.
Ainda que as crianças, enquanto grupo social, sejam consideradas frágeis, é por meio da relação com o outro e o com o mundo, com subsídios, acesso e intervenção disponibilizados a elas, que os pequenos interagem, aprendem, crescem a fim de que, de forma autônoma e sadia, possam se desenvolver. Na pesquisa A psicologia escolar e educacional pensando as infâncias na pandemia, as pesquisadoras da PUCRS Andreia Mendes, Renata Plácido Dipp e Giovanna Bortoli contam que no ato de brincar a criança ou o adulto fruem a sua liberdade de criação.
Elas também ressaltam o papel da escola para criar uma sinergia entre a proposta pedagógica, a compreensão dos educadores e da instituição, bem como da família, em última análise, para que se estabeleça e se mantenha uma cultura do brincar e da sociedade. De acordo com as pesquisadoras, a escola tende a cumprir este papel, principalmente em contextos familiares com mais fragilidades.
Em famílias que não experimentaram a educação e não conseguem estimular os filhos, que sobrevivem em contextos econômicos de precariedade, ou que convivem com violências de diferentes ordens, tais cenários podem reduzir as chances de a família estimular a criança ao estudo e às experiências de brincar. Já em casas com contextos sociais privilegiados, do ponto de vista econômico, também se identificam fragilidades familiares.
De acordo com o estudo, as exigências de uma sociedade hiperinformada, digital, competitiva e fugaz (em que cada vez mais os pais são exigidos a se ocuparem com o mundo do trabalho), tendem a estimular brincar menos ao livre e mais à tarefa. Andreia, Renata e Giovanna explicam que em ambos os extremos, crianças com pouco espaço para criar, passam apenas a reproduzir. Desta forma, estes contextos podem gerar às crianças o vazio; elas tendem a se entusiasmar menos pela aprendizagem, podem se tornar adultos mais ansiosos e menos criativos e tendem a esperar pela condução do ambiente e exigir que o outro dê conta de lhe oferecer o melhor caminho para a aprendizagem.
“O Dia Mundial da Infância agrega muito no debate na garantia do direito das crianças, mas precisamos compreender esta etapa da vida como crucial na formação de um novo adulto. Não é apenas uma fase de passagem, as crianças de hoje serão os adultos de amanhã e que o que se passa na infância marca a vida inteira do indivíduo”, alerta Andreia.
O LabInf surgiu de uma parceria entre a Escola de Humanidades e o Centro Marista de Promoção dos Direitos da Criança do Adolescente com o objetivo de desenvolver um projeto integrador na Universidade com foco nas infâncias. É uma estrutura de ensino, pesquisa e extensão idealizada para promover propostas interdisciplinares efetivas e de impacto social na construção de uma sociedade que valorize e dê voz às crianças.
Através de estudos sobre e com as crianças, e por meio da pesquisa-ação, também busca-se ampliar o repertório formativo de nossos alunos para torná-los futuros profissionais com competências e habilidades para trabalhar junto ao campo das infâncias. O conjunto de estudos desenvolvidos pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em Infância(s) e Educação Infantil e dos Grupos de Pesquisa sobre Questões Sociais na Escola e Psicologia e Educação são o berço das ações.
Participam do LabInf mestrandos e doutorandos do Programa de Pós-Graduação em Educação, Ciências Sociais e demais programas da PUCRS, além de bolsistas de Iniciação Científica, professores, egressos na condição de colaboradores e estagiários. Cada projeto de pesquisa oportuniza investigar sobre mais temas, como a inserção social da criança imigrante, infâncias indígenas, crianças com TEA, educação inclusiva e educação especial, a importância do brincar, entre outros.
O interesse institucional em contribuir com o tema permite uma atuação integrada em uma sólida parceria com Centro Marista de Promoção dos Direitos da Criança do Adolescente, o Centro Social Marista Irmão Bertolini e a Escola de Educação Infantil Menino Jesus, o Colégio Rosário e o Serviço de Atendimento e Pesquisa em Psicologia da PUCRS e com uma rede de pais e crianças no estado do Rio Grande do Sul. Saiba mais aqui.
Com o objetivo de promover saberes aliados a propostas efetivas e interdisciplinares de impacto social na infância, o Laboratório das Infâncias (LabInf) foi criado em 2021 na Escola de Humanidades, da PUCRS. Coordenado pela pesquisadora da PUCRS Andreia Mendes dos Santos, a estrutura de pesquisa surgiu como uma resposta científica ao contexto decorrente da pandemia da Covid-19, que se iniciou em 2020, ampliando as vulnerabilidades e desigualdades sociais para adultos e crianças.
Atualmente, o laboratório conta com uma equipe interdisciplinar de professores/as e alunos/as de pós-graduação das Escolas de Ciências da Saúde e da Vida, Humanidades e Medicina, além de estar aberto para acadêmicos de outras áreas. Sua atuação tem como objetivo desenvolver projetos integradores com foco nas infâncias, articulando ensino, pesquisa e extensão, por meio de atividades voltadas à sociedade e à academia.
Os projetos desenvolvidos contam com o apoio do Centro Marista de Promoção dos Direitos da Criança do Adolescente, com espaço físico equipado para atender crianças e famílias na Fundação Irmão José Otão (Fijo), localizado no prédio 2 do Campus da PUCRS. De acordo com Andreia, as iniciativas buscam oferecer oportunidades de melhorar a experiência nas infâncias e busca a valorização das experiências delas, por meio da intersecção entre o cuidar, promover e educar.
“Nossa estrutura e atividades buscam oferecer um espaço formativo para pesquisadores e alunos das mais diferentes áreas da PUCRS. Além disso, serão desenvolvidos projetos de acolhimento terapêutico em busca da garantia de um espaço potente para que ocorram processos de desenvolvimento físico, cognitivo, psicológicos e sociais, por meio de ações planejadas, pedagógicas e estruturais para os bebês, crianças e pais”, explica a pesquisadora.
O projeto Movimentar – o corpo como oficina de interações infantis: experiências infantis na universidade, surge da expertise de um grupo de pesquisadoras do Núcleo de Estudos sobre as Infâncias e Educação Infantil (NEPIEI) em uma relação dialógica socialmente construída no LabInf, frente à realidade percebida durante as reuniões e a necessidade de promover práticas corporais mais atentas ao corpo durante a infância.
O projeto, voltado a crianças de 3 a 6 anos, considerará a interação social e as aprendizagens dessas crianças, pois irão dispor de práticas pedagógicas lúdicas, atividades corporais, ampliando suas habilidades motoras amplas e finas, atividades artísticas e brincadeiras.
Andreia explica que a proposta de programação parte do entendimento de que o brincar na infância proporciona uma gama de novas aprendizagens quando a criança é deparada com momentos de formação de vínculos com o outro ou consigo mesmo, com a experimentação do espaço, com os materiais e com a imaginação.
“É brincando que as crianças trabalham seus medos, desenvolvem habilidades, criam conceitos sobre seus valores e conseguem descobrir e expressar o que de fato gostam e o que não gostam de fazer”, pontua.
Durante este projeto as crianças terão a oportunidade de participar de diferentes situações de aprendizagens, num processo ativo de construção de significados, podendo se expressar por meio do desenho livre, da fala, da linguagem corporal, gestual, musical, artística, experimentando diversas vivências e sensações, e gradualmente, irão se apropriando da cultura, por meio de situações significativas.
A primeira turma piloto deste projeto teve início em outubro com encontros semanais, com um grupo reduzido de até dez famílias. Atividades englobam construção de brinquedos com sucata, leitura de contos e brincadeiras lúdicas com finalidade de oportunizar momentos de reflexão sobre as ações, práticas e avaliação do projeto.
Outro projeto desenvolvido pelos pesquisadores do LabInf é a Oficina de brincar com bebês e crianças pequenas. Pensada com o propósito de criar um espaço de estar e brincar para os bebês e crianças bem pequenas para exploração e também identificação de descompasso de desenvolvimento e acolhimento de seus cuidadores como promoção e prevenção de saúde, atendendo a comunidade.
As atividades iniciam em outubro, com frequência quinzenal nas quintas-feiras, para um grupo fechado de cinco bebês e seus responsáveis, que serão envolvidos em quatro encontros com momentos de interação entre adultos e bebês, exploração do espaço físico e brincadeiras estimulantes com tecidos, objetos e materiais diversos.
As oficinas englobam objetivos de formação profissional e científica, onde estudantes e pesquisadores atuar com estudos e intervenção com bebês e crianças pequenas, com um espaço de estágio e prática de observação. Assim como agregar na sociedade com um espaço de lazer e de encontro para familiares, cuidadores e crianças onde os bebês serão tratados como sujeitos.
A pesquisadora Andreia explica que as propostas partem de uma noção de que a infância não deve ser compreendida apenas como uma etapa biológica que perdura até cerca de 12 anos ou que se restringe a uma preparação para a vida adulta. Para a docente, a infância é abordada como uma construção social e as crianças são reconhecidas como atores que produzem culturas.
“As suas experiências, trajetórias, expectativas e conflitos são importantes demandas sociais. Considera-se o brincar como parte fundamental da infância e, por isso, tomamos como um desafio na promoção da inserção social da criança”, finaliza a coordenadora do laboratório.
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