Nos últimos anos, a relação da sociedade com a tecnologia sofreu transformações expressivas em diversos âmbitos, como no ensino, no trabalho e nas formas de comunicação. Com o olhar para o futuro do digital, o PUCRS Pesquisa conversou, em uma matéria especial, com pesquisadores de diferentes áreas e Escolas da Universidade para entender quais serão as tendências para 2023.
Confira o que os professores Bernardo Bueno, Marcio Pinho e Rodrigo Barros têm a dizer sobre o universo dos jogos, aplicativos, realidade virtual e inteligência artificial.
Para o professor e pesquisador da Escola de Humanidades Bernardo Bueno, o setor de jogos eletrônicos cresceu muito nos últimos anos, quando muitas pessoas encontraram no entretenimento digital uma forma de alívio e distração. O docente explica que o mercado brasileiro segue avançando com uma presença internacional relevante, como nos estúdios desenvolvedores de jogos eletrônicos Aquiris e Rockhead Games, que atuam no Parque Científico e Tecnológico (Tecnopuc) e realizaram lançamentos internacionais dos jogos eletrônicos Horizon Chase 2, Wonderbox e Starlit Adventures.
Para 2023, a tendência é que os jogos tenham mais acessibilidade e representatividade. Bueno explica que os estúdios estão mais atentos em oferecer opções de jogos com acessibilidade motora, visual e cognitiva, além de melhorar as condições de trabalho, profissionalismo e diversidade nas equipes. Neste ano, o professor também destaca as iniciativas voltadas para integração de jogos com criptomoedas, NFTs e o metaverso, que, mesmo não sendo muito aclamados pelos desenvolvedores, devem continuar recebendo investimentos de grandes empresas.
Na PUCRS, Bueno coordena o Laboratório de Humanidades Digitais, que entrará em pleno funcionamento em 2023, com uma jornada de pesquisa e projetos de pesquisa colaborativos e criativos. Além disso, o Grupo de Pesquisa em Tecnologia e Ficção (TECFIC), da Escola de Humanidades, é responsável por desenvolver projetos científicos buscando responder questões de criatividade computacional, para entender se a máquina também pode criar.
No tema de Inteligência Artificial (IA), o docente destaca que, no ano passado, uma ilustração digital criada com esse tipo de ferramentas venceu um prêmio de artes nos Estados Unidos, gerando uma série de discussões online sobre a validade da arte criada por IA. Desta forma, 2023 promete maior uso dessa tecnologia na área de criatividade computacional, como visto nas ferramentas como Dall-E2, Stable Diffusion e Midjourney, que criam arte visual a partir de comandos de texto.
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“Isso é só o começo. Veremos uma interação crescente entre IAs e seres humanos para criar todo tipo de arte. Será como um campo novo de colaboração entre as pessoas e as máquinas para expandir nossas capacidades criativas”, finalizou.
Os exemplos citados por Bernardo Bueno são chamados de Foundation Models, grandes modelos de redes neurais treinados sobre quantidades massivas de dados, conforme explica o professor e pesquisador de Inteligência Artificial da Escola Politécnica, Rodrigo Barros. O docente destaca que, além dos sistemas que aprendem simultaneamente a partir de textos e imagens como o Dall-E2, existem os Foundation Models exclusivos de texto, como o GPT-3 da empresa americana OpenAI.
Em novembro de 2022, com base em uma evolução do GPT-3, a empresa lançou o ChatGPT, uma ferramenta que permite diálogos em diversos idiomas sobre praticamente qualquer assunto, de maneira aparentemente natural, com respostas para inúmeras perguntas, além da criação de conteúdo.
De acordo com Barros, 2023 promete diversos avanços nos Foundation Models atuais, como o lançamento do GPT-4 pela OpenAI, uma rede neural ainda maior e indica resultados mais surpreendentes. Existe também a expectativa da chegada de novos Foundation Models que lidam com modalidades de dados, além de texto e imagens, como áudio e vídeo, por exemplo.
O docente também destaca pesquisas que estão sendo desenvolvidas no seu laboratório de pesquisa MALTA (Machine Learning Theory and Applications Lab), em particular na área de inclusão social com Inteligência Artificial. O laboratório está desenvolvendo um projeto que busca gerar modelos de redes neurais capazes de traduzir um discurso em linguagem brasileira de sinais (LIBRAS) para português, e vice-versa. Com esse estudo, os pesquisadores foram reconhecidos pelo Google com o prêmio Google Awards for Inclusion Research, que premia com 35 mil dólares os projetos de pesquisa com maior potencial de impacto social no mundo inteiro.
Em outra pesquisa desenvolvida no MALTA, desta vez com financiamento oriundo da empresa Motorola, estão sendo projetados modelos de redes neurais capazes de reduzir disparidades de gênero, raça e classe social, questões que costumam aparecer em modelos de aprendizado de máquina treinados nos grandes volumes de dados disponíveis atualmente.
Os últimos anos foram marcados por diferentes avanços e marcos nas tecnologias responsáveis por expandir o mercado de aplicações para o Metaverso. O pesquisador da Escola Politécnica Marcio Pinho destaca a mudança de nome do Facebook para Meta Plataforms, indicando os investimentos da empresa de Mark Zuckerberg na área, assim como o anúncio do Google em adquirir uma empresa de U$ 39,5 bilhões exclusivamente para financiar projetos de metaverso.
O professor apresenta também outros movimentos que aconteceram no mercado de metaverso no ano passado, como as empresas Nike, Walmart e Adidas, que iniciaram parcerias com a plataforma Roblox, para criar grandes ambientes virtuais colaborativos disponíveis, como a Nikeland, já visitada por mais de 21 milhões de pessoas. Já o Walmart está prometendo realizar festivais de música virtual e jogos neste metaverso, além de oferecer mercadorias virtuais que imitam o que os clientes encontrarão nas lojas físicas.
O ano passado também foi marcado por shows e grandes eventos no metaverso, como o Decentraland Metaverse Fashion Week, que uniu marcas como Tommy, Paco Rabanne e Dolce&Gabanna. Outro momento foi participação dos músicos Snoop Dogg e David Guetta no MTV Video Music Awards, onde os artistas controlaram avatares no metaverso por complexos sistemas de captura de movimento durante a apresentação. No Brasil, o cantor Nando Reis lançou o documentário Cordas de Aço em seu próprio ambiente virtual.
Pinho acredita que 2023 será marcado pelo crescimento da utilização de Realidade Virtual para interação social em ambientes colaborativos, em especial em plataformas de jogos como Roblox, Decentraland, The Sandbox e Axie Infinity. Para o docente, devem surgir também novas ferramentas para traduzir o mundo real e o usuário, como sistemas de rastreamento corporal e reconhecimento de expressões, além de digitalização 3D, baseados em celulares, permitindo a mistura, sem falhas, de objetos reais e virtuais.
“Novos sistemas de rastreamento corporal e reconhecimento de expressões permitirão interpretar o que o usuário deseja fazer de forma mais natural, precisa e não intrusiva. Sistema de rastreamento de posição baseados em redes 5G também devem se difundir, abrindo campo para aplicações de realidade aumentada em locais como estádios, parques, shoppings, teatros e casas de show”, destacou o docente.
Por fim, no campo da Realidade Aumentada, as expansões do mercado devem acontecer graças aos lançamentos feitos por grandes empresas de óculos ou capacetes para suportar a fusão de imagens virtuais no mundo real. Exemplos como Microsoft e Magic Leap prometem focar no mercado corporativo/industrial, que exige qualidade de imagem e poder de processamento, conforme explica Pinho. Já empresas como Apple e Vuzix devem focar no mercado de consumidores finais que exige leveza, conforto, praticidade de uso e longa duração de baterias, possibilitando a utilização ininterrupta por várias horas.
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Os e-sports (jogos eletrônicos) podem ser considerados esporte? Deveriam integrar o programa dos Jogos Olímpicos? O evento E-Sports em Debate: Potencial Olímpico e Desafios vai tratar dessas questões no dia 29 de abril, às 20h30, no auditório do prédio 81. Será a aula inaugural do curso de Educação Física da Escola de Ciências da Saúde, aberta ao público.
Participam os professores André Pase, da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos; Nelson Todt, coordenador do Grupo de Pesquisa em Estudos Olímpicos da Escola de Ciências da Saúde; Ricardo Vela, coordenador da Escola de Esporte; e Daniel Cossi, presidente da Confederação Brasileira de E-Sports. Jeremias Wernek, apresentador do SBT e repórter do UOL, será o mediador.
Neste ano, o Grupo de Pesquisa em Estudos Olímpicos da PUCRS começou estudo sobre o tema. O presidente do Comitê Olímpico Internacional, Thomas Bach, declarou recentemente que os e-sports não terão espaço nos Jogos Olímpicos enquanto propagarem violência ou qualquer tipo de discriminação. Todt avalia que essa questão levantada por ele remete à ideia de que o movimento olímpico, criado pelo francês Pierre de Coubertin, pensava no desenvolvimento da juventude através do esporte e do movimento. “Há ainda uma preocupação com o possível desinteresse da juventude em relação ao esporte em decorrência da crescente adesão aos jogos eletrônicos”, acrescenta o professor.