Que o TikTok é a rede social da pandemia todo mundo sabe, mas até quando essa onda pode durar? Qual o segredo por trás do sucesso da rede? O que o público espera da plataforma? Essas são algumas das perguntas que os estudantes do curso de Publicidade e Propaganda da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos da PUCRS, orientados pelo professor Ilton Teitelbaum, buscaram responder com a pesquisa O Crescimento do TikTok e o Impacto da Pandemia nos Usuários de Redes Sociais.
Antes de mais nada, é importante entender o que é o TikTok e de onde ele surgiu. Trata-se de uma rede social para o compartilhamento de vídeos curtos, com até três minutos de duração, na qual os usuários contam com diferentes ferramentas de edição e podem incluir filtros, legendas, trilhas sonoras, gifs e efeitos de forma prática e intuitiva.
Seu conteúdo é baseado em tendências e os usuários realizam challenges (desafios), dublagens, imitações e coreografias. Isso instiga a participação de outras pessoas e atrai, principalmente, o público jovem. Além disso, sua aba explorar possui um apelo para a viralização de conteúdo, fator determinante para o crescimento e o sucesso do TikTok. Foi essa característica que levou a jovem Sofia Müller, que, hoje, possui cerca de 50 mil seguidores na rede social, a produzir conteúdo para o aplicativo.
“O TikTok oferece chance para pessoas desconhecidas viralizarem. Eu consegui fazer a minha marca de roupas crescer através da rede”, comenta.
Em 2017, o TikTok, ainda bem diferente do que conhecemos hoje em dia, comprou o aplicativo Musical.ly e a união de ambos é a rede social que conhecemos hoje em dia. O início da pandemia, em 2020, foi um momento marcante na história da rede, pois foi quando ultrapassou dois bilhões de downloads nas lojas de aplicativos. De acordo com levantamento realizado pela Global/WebIndex, já existem cerca de sete milhões de usuários cadastrados no Brasil, que gastam cerca de uma hora por dia no aplicativo.
Uma das características é a monetização de seus usuários através de rubis, o dinheiro virtual do aplicativo. Os usuários podem recebê-los de sua audiência, durante lives, ou através de tarefas ou indicação de pessoas para que baixem a plataforma.
Para o influenciador digital Lucas Ruschel, que ingressou no app no período da crise sanitária de Covid-19, o que mais chamou atenção foi o aumento repentino no número de usuários. Com mais de 150 mil seguidores, ele acredita que a pandemia tenha sido o fator decisivo para esse crescimento. Sua hipótese conta com o apoio da psicóloga Mariah Paranhos. Segundo ela, “sempre tem um aplicativo do momento que talvez venha até de uma necessidade da sociedade propriamente”. Para Mariah, a necessidade suprida pelo TikTok é a falta de contato humano durante a pandemia, período em que se popularizou no Brasil.
Outro número que aumentou durante a pandemia foi o de pacientes de Mariah, que revela que a questão do TikTok sempre acaba se tornando pauta entre os adolescentes. No entanto, ela alerta que as redes sociais são potenciais vícios e que é importante saber de forma clara qual é o seu objetivo com o aplicativo para utilizá-lo sem preocupações.
O potencial de viralização é outro perigo da rede ao pensar em saúde mental, pois, como apontado pela psicóloga, uma pessoa que é beneficiada pelo algoritmo em algum momento pode, rapidamente, cair no esquecimento. Isso pode gerar frustrações dependendo da personalidade e da forma com que esse indivíduo lida com as redes sociais.
A professora da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos Gabriela Kurtz acredita que sim, o TikTok continuará. Mas, de acordo com ela, pode ser que a rede deixe de ser a “febre” que é atualmente. Isso porque um dos fatores que contribuem para manter as pessoas engajadas na plataforma é o tédio, que tende a se tornar menos frequente à medida que as coisas voltem à normalidade.
A opinião dos usuários do TikTok sobre sua durabilidade varia muito. Lucas acredita que dificilmente ele deixe de existir, mas que, de fato, há chances de que os números caiam. Já Sofia crê que é uma rede momentânea e, portanto, tem prazo de validade.
Esse aspecto chamou a atenção dos integrantes do grupo que realizou a pesquisa, incluindo o estudante Rodrigo Ruschel, que afirmou ter sido surpreendente perceber quantas pessoas consideram essa uma rede social momentânea e afirmaram não ter pretensão de utilizá-la após a pandemia.
Como parte da pesquisa, jovens de 18 a 24 anos de Porto Alegre e região foram convidados a responder um questionário sobre o uso de redes sociais na pandemia. Ao todo, foram obtidas 223 respostas, sendo 63,2% de mulheres, 37,2% de homens e 0,4% de pessoas que se identificaram como outros. A partir das respostas, foi possível ver, em dados, como é o comportamento dessa faixa da população nas redes.
Enquanto mais da metade dos jovens não alteraram seu consumo de rádio e jornal durante a pandemia, quando se fala em televisão e redes sociais a situação é diferente: aproximadamente quatro a cada dez aumentaram pouco o consumo de televisão e mais de 60% o de redes sociais.
Dentre as redes favoritas desse público, ocupam o topo do ranking, respectivamente, o Instagram, o WhatsApp e, é claro, o TikTok. Praticamente metade dos jovens afirmou utilizar redes sociais de duas a quatro horas por dia.
Quando se fala em destaques da pandemia o resultado já é o esperado: Instagram e TikTok foram os aplicativos que mais chamaram atenção no período, além disso, foram apontados como os que fornecem a melhor visibilidade para influenciadores e para usuários comuns, o maior poder de viralização para vídeos e o maior potencial de destaque para o pós-pandemia.
Embora a maioria do público utilize o TikTok, quase 40% afirmaram ainda não serem usuários da plataforma. Entre os motivos apresentados para isso, destacam-se a negação de ter mais uma rede social em sua vida, a falta de identificação com o público do aplicativo e o medo de se tornar um usuário excessivamente ativo. No entanto, foi, também, apontado o que faria com que esses jovens ingressassem à rede, sendo os principais atrativos a disponibilidade de conteúdos mais diversificados e a criação de grupos e/ou comunidades dentro do aplicativo.
Entre os jovens que já utilizam a plataforma, quase todos afirmaram ter realizado o download como forma de distração (94,3%) e uma parcela significativa para pesquisa de referências (21,4%). A rede também mostrou ser mais utilizada durante a noite e com uma participação maior das mulheres do que dos homens, sendo a maior parte deles usuários que apenas visualizam os conteúdos (58,8%) e o menor percentual o que visualiza, posta e interage (apenas 9,2%).
Eles sugerem, ainda, que, para o sucesso do TikTok ser ainda maior, falta interação entre os usuários, suporte aos criadores de conteúdo e alterações no layout da plataforma. Para eles, a rede social perfeita é formada pela característica “good vibes” do Instagram, pela privacidade encontrada no WhatsApp e pela descompressão apresentada pelo Tiktok.
O estudo O Crescimento do TikTok e o Impacto da Pandemia nos Usuários de Redes Sociais foi elaborado pelos/as estudantes André Barcellos, Caroline Hennicka, Felipe Paes, Julia Prado, Pedro Tassoni, Rafael Domingues, Rodrigo Ruschel, Thaísa Zilli Batista, Uillian Vargas e Vinicius Mourão, da disciplina de Projeto de Pesquisa de Mercado em Publicidade e Propaganda, ao longo do primeiro semestre de 2021.
“Essa disciplina foi uma das que mais contribuíram para o nosso aprendizado, pois precisamos gerenciar uma equipe, dividir tarefas, trabalhar com prazos e, além disso, elaborar uma pesquisa completa, com início meio e fim, comparando etapas qualitativas e quantitativas”, relembra Rodrigo.
Em sua etapa qualitativa, a pesquisa contou com 12 entrevistas em profundidade, sendo oito delas com jovens de 18 a 24 anos da região de Porto Alegre, duas com influenciadores digitais do TikTok (Lucas Ruschel e Sofia Müller), uma com uma psicóloga (Mariah Paranhos) e outra com uma comunicadora social (Gabriela Kurtz). Depois, na fase quantitativa, foram 223 respostas válidas em uma coleta feita por meio de questionário online.
Os avanços da tecnologia proporcionam diversas facilidades para o cotidiano das pessoas. Uma delas é a internet, cada vez mais presente nos lares e dispositivos móveis da população brasileira. Porém, se todo mundo pode produzir conteúdo e postar a qualquer momento, como saber quais informações são verdadeiras e quais fontes são confiáveis? Confira algumas dicas do professor Marcelo Crispim da Fontoura, da Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos, e como você pode evitar compartilhar conteúdos falsos:
1. Sempre identificar a fonte: a procedência da informação diz muito sobre sua natureza. Textos e imagens recebidos via aplicativos de troca de mensagens podem não possuir uma autoria identificada. Desconfie nesses casos. Se alguma informação for verdadeira, ela terá respaldo em veículos de imprensa profissionais e na mídia. Informações divulgadas sem fonte são a principal forma de gerar desinformação. Suspeite também de mensagens “assinadas” em nome de órgãos governamentais. Se forem verídicas, elas podem ser encontradas facilmente nos sites das instituições.
2. Confira as datas das notícias: ao receber e enviar informações para amigos e familiares é importante conferir qual a data de publicação e/ou atualização das matérias. Mesmo sendo verdadeira, uma notícia publicada há alguns anos pode ser inválida para discussões atuais. Lembre-se que, na internet, muitas vezes as notícias antigas têm a mesma cara das novas.
3. Olhe o outro lado: para não acreditar em uma notícia que se encaixa perfeitamente na sua visão de mundo, é importante considerar que quase tudo tem um contraponto. Um acontecimento, por exemplo, tem muitos lados. Se uma matéria expressa exatamente o que alguém pensa, ela pode ter sido feita justamente para confirmar uma opinião. Isso tem a ver com o chamado viés cognitivo: a tendência é a acreditar no que condiz com um ponto de vista prévio.
GRADUAÇÃO PRESENCIAL
4. Fique atento à ortografia: conteúdos e informações inventados costumam ter erros de português. Normalmente, são deslizes perceptíveis de ortografia e concordância, além de frases que parecem não se encaixar.
5. Grupo da família não é fonte: para não cair na tentação de confiar em alguma informação com base em quem a enviou, e não na fonte, é fundamental lembrar das dicas já citadas: conferir a origem, os contrapontos e a data da publicação. Não é só porque um parente querido enviou alguma informação que ela se torna verdadeira. Lembre-se que a fonte da informação é quem a publicou, não quem a enviou a você. Pesquise em associações e conselhos profissionais, como o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde.
Dica bônus: seja proativo e vá atrás das informações você mesmo. Na dúvida, procure no Google. Você provavelmente vai encontrar alguma checagem feita por um órgão confiável de imprensa. O mais importante é não passar algo adiante sem saber se é verdade.
O Ministério da Saúde recebeu 9.900 mensagens solicitando a checagem de informações a respeito do coronavírus entre os dias 21 de janeiro e 12 de março. Apenas 495 eram verdadeiras, e 8.910 eram falsas. Esse comportamento tem se tornado cada vez mais comum e, segundo o Massachussetts Institute of Technology (MIT), uma informação falsa se espalha 70% mais rápido do que a verdadeira.
Marcelo Crispim é professor de Jornalismo Digital e Mídia Digital na Famecos. Leciona disciplinas relacionadas a Jornalismo de Dados, Jornalismo Online e Cultura Digital. Foi fellow do International Center for Journalists em 2015. Pesquisa sobre futuro do Jornalismo e concluiu o período de doutorado-sanduíche na Northwestern University, em Chicago.
O novo currículo do curso de Jornalismo da Famecos conta com uma disciplina exclusiva sobre Dados e Fact Checking (checagem de fatos). Assim como Empreendedorismo, Sustentabilidade, Cultura Digital e Jornalismo Online, as aulas correspondem às atuais demandas da área e do mercado, que exige cada vez mais capacidade de apuração e credibilidade dos novos profissionais de comunicação.
Para o professor Leandro Karnal, “universidades compartimentadas, ensinando conteúdos fixos, que se transmitem de uma geração a outra, estão condenadas pela própria transformação técnica da sociedade”. Um dos palestrantes mais solicitados do País e famoso nas redes sociais – mantém um grupo no Facebook com 68 mil membros e sua página conta com 1,5 milhão de seguidores –, defende que os cursos superiores reforcem a Filosofia mais do que nunca, no mundo ultratécnico, ultramecanizado, extremamente industrializado e com todos os recursos de internet. “Não pode haver um programador de computadores que não tenha estudado lógica formal aristotélica, não pode haver um médico que não tenha estudado ética filosófica, não pode existir um engenheiro que não tenha estudado, por exemplo, urbanismo e outras questões fundamentais para pensar o humano.”
Sobre o seu alcance nas redes, ao lado de outros professores, Karnal acredita que há uma difusão no acesso a informações. “É difícil explicar o fenômeno. Posso recorrer a uma profecia do século 19, de Marx, que dizia que no futuro tudo se transformaria em mercadoria, inclusive o conhecimento, ou McLuhan, de que o meio e a mensagem estão fundidos – significado e significante.”
Gaúcho de São Leopoldo, mora há décadas em São Paulo, onde leciona na Universidade Estadual de Campinas. Historiador, tem especialização em História da América e doutorado em História Social, com pós-doutorado pela Unam (México) e CNRS (Paris). Participa de cursos do Pós PUCRS Online pelo terceiro ano consecutivo. É um dos convidados de cinco modalidades atuais: A Moderna Educação: Metodologia, tendências e foco no aluno; Educação Transformadora: Pedagogia, Fundamentos e Práticas; Filosofia e Autoconhecimento: Uso Pessoal e Profissional; Psicologia Positiva, Ciência do Bem-Estar e Autorrealização; e Gestão de Pessoas: Carreiras, Liderança e Coaching. Nesses, ministra, respectivamente, as disciplinas A Cultura no Ambiente Educacional: da Sala de Aula ao Grupo de WhatsApp, com a professora Roselane Costella, da UFRGS; Uma Breve História da Humanidade: lições para a educação no século XXI, com Alexandre Anselmo Guilherme, da Escola de Humanidades; História da Filosofia: ser, conhecer, dizer, com Leonardo Agostini, também da Escola de Humanidades; Muito obrigado! O papel da gratidão, ao lado de Irani Argimon, da Escola de Ciências da Saúde; e Atalhos da sabedoria: maestria do ser e espiritualidade, com Wagner de Lara Machado, também da Escola de Ciências da Saúde.
Em 1996, Karnal participou da sua primeira banca de doutorado na PUCRS. Fez parte da mesa de José Alberto Baldissera, que defendeu tese em Educação. Confira mais de seu pensamento em entrevista exclusiva ao portal da PUCRS.
O senhor faz parte de cinco cursos da PUCRS. Sente diferença entre os perfis de alunos?
Os cursos produzem culturas específicas. As pessoas do Direito não são iguais às pessoas de Finanças, os alunos da área de Humanidades são muito distintos dos de outras áreas. Eu ainda não toquei, eu creio, em outras culturas, como Engenharia e Medicina, que ainda são mais específicas. Os alunos são atraídos para um curso porque tem um perfil. Eu reconheço quase imediatamente se estou numa sala com engenheiros ou filósofos.
Esses cursos se propõem a ter uma multiplicidade de perfis pelos temas que abrangem.
É um impulso universal, mas muito forte aqui na PUCRS, que eu gosto em particular, o caráter de universidade. Ela existe desde que surgiu, no ocidente europeu, na cidade de Bolonha, no século 11, como um convívio de saberes. A universidade era não um espaço para eu me tornar exclusivamente um filósofo ou um doutor em leis, mas onde eu convivia com exposições à questão estética da arte, da música, da literatura e do próprio encontro estudantil. Grandes e boas universidades, e esse curso é uma prova de que a PUCRS busca o mesmo objetivo, estão trabalhando com a ideia de dissolução de barreiras. Claro, há coisas que só o engenheiro estudará, o médico ou o filósofo. Mas eles serão muito melhores se tiverem convívio ou exposição a outras metodologias e maneiras de ver o mundo. Isso que é universidade e não uma faculdade isolada. Passei por áreas de convívio aqui. Até o ato de conversar com colegas é um ato transformador no sentido humanístico da palavra: perceber diferenças, comportamentos, distinções, idiossincrasias, para eu reforçar meu ponto de vista ou modificá-lo.
“Grandes e boas universidades, e esse curso é uma prova de que a PUCRS busca o mesmo objetivo, estão trabalhando com a ideia de dissolução de barreiras. Claro, há coisas que só o engenheiro estudará, o médico ou o filósofo. Mas eles serão muito melhores se tiverem convívio ou exposição a outras metodologias e maneiras de ver o mundo.”
O senhor vê que esse é o caminho das universidades em um contexto em que profissões estão enfraquecidas pelas tecnologias e há uma crise de emprego?
A tendência global hoje é das universidades saírem do campo de transmissoras de conhecimento para produtoras de atitudes e indagações. Mais do que nunca tenho visto que servem e funcionam como não para a formação de uma profissão, mas de uma atitude indagadora e de um posicionamento, para usar uma palavra difícil, de uma reformuladora de epistemologias, de busca de verdade, de validação da verdade, e de métodos para produzir novas verdades. De fato, como você lembra, tudo o que me ensinaram ficará defasado. E o Yuval Harari disse, no seu último grande pronunciamento sobre educação em um congresso em Portugal, que somos a primeira geração que não sabe o que ensinar à seguinte. E eu diria assim: nós não sabemos quais as técnicas serão utilizadas, quais serão as profissões em 20 anos, mas, independentemente disso, teremos que dar resposta a questões relativas a quem eu sou, que função exerço na sociedade, quais são os valores e os modelos de busca de profissão, de modelo de ação. Universidade compartimentada, ensinando conteúdos fixos, que se transmitem de uma geração a outra, estão condenadas pela própria transformação técnica da sociedade.
Como a tecnologia pode vir de suporte a esse modelo?
Restaurando uma noção humanística de que a tecnologia é um suporte e não objetivo. Meu objetivo não é o computador, nem a rede social, nem a internet, meu objetivo é utilizar essas ferramentas, recursos e paradigmas para atingir o conhecimento e a verdade, a transformação da sociedade. Pra eu não ser possuído pelo computador, para não cumprir aquelas profecias negativas de Admirável Mundo Novo, de Huxley, ou de sociedades como a prevista por Fritz Lang, em Metrópolis, no cinema alemão do entre guerras, que serve à tecnologia. É preciso estudar muito a tecnologia, é preciso dominar linguagens tecnológicas, é preciso fazer tudo isso pra que eu não dependa de tecnologias, não seja escravo delas e que não entenda que o objetivo do 4G é ser plataforma do 5G, o objetivo do 4G, do 5G ou do 50G, quando eu já estiver fora deste mundo, é sempre servir às pessoas, que se comuniquem mais, pensem mais, tenham acesso a informações mais verdadeiras. Por isso, universidade também é um centro de educação de valores e não de técnicas. Essa techne, uma expressão da filosofia grega, tem que estar a serviço de uma ação humana ou ela será não só inútil, mas perigosa.
“Eu diria que hoje no mundo ultratécnico, ultramecanizado, extremamente industrializado e com todos os recursos de internet, todos os cursos superiores têm que reforçar sua carga de filosofia, mais do que no passado, mais do que nunca”
Como o senhor vê o contexto político atual no Brasil e o seu impacto na educação de cortes de verbas no ensino superior?
Existe uma crise hoje e, naturalmente, o decréscimo na arrecadação de valores vai representar um decréscimo nos investimentos na educação. O que é perigoso nesse momento não é a oscilação quase que pendular que acompanhei ao longo de 40 anos de vida como professor, é o fato de que há um descrédito da própria educação, especialmente da educação humanística. Nós precisamos valorizar aqueles eixos que constituem o próprio conhecimento. Todo o projeto universitário e de conhecimento gira ao redor da filosofia. Ela que permite a investigação médica, física, científica, química. São os desafios propostos pelo método filosófico que se espraiam para outras áreas. São filósofos como Descartes, no seu discurso do método, e Bacon, que trabalham a ideia de como se faz a pesquisa científica, que depois vai se transformar em aparelhos médicos, remédios ou prédios mais bem construídos. A gênese, a semente de toda a educação é a filosofia, o senso crítico, a quebra de dogmas, o estímulo ao debate, ao estudo sistemático. Se eu passar a dizer que filosofia é inútil e filósofos não fazem nada, historiadores, sociólogos e antropólogos são agitadores, é porque não tenho a menor noção do que seja conhecimento, não sou de fato um intelectual ou pesquisador, sou alguém com título superior, o que hoje nem sempre quer dizer um pensador. Se eu não restauro essa crença fundamental na filosofia como primeira de todas as ideias, tenho um problema grave para resolver porque vou tornando a sociedade uma resposta técnica, de um algoritmo, que vai tornar o homem mais eficaz e mais submetido a sistemas. Eu diria que hoje no mundo ultratécnico, ultramecanizado, extremamente industrializado e com todos os recursos de internet, todos os cursos superiores têm que reforçar sua carga de filosofia, mais do que no passado, mais do que nunca. Não pode haver um programador de computadores que não tenha estudado lógica formal aristotélica, não pode haver um médico que não tenha estudado ética filosófica, não pode existir um engenheiro que não tenha estudado, por exemplo, urbanismo e outras questões fundamentais para pensar o humano. Mais do que nunca, me preocupam as verbas, que já vi serem maiores ou menores, mas hoje me preocupa muito mais a postura de agressão ao conhecimento feita por pessoas sem conhecimento.
Surgimento da internet, transição para a internet móvel, dispositivos wearables e internet das coisas foram os temas abordados pelo professor da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS Eduardo Campos Pellanda durante a abertura do 17º Salão de Iniciação Científica (SIC). O Reitor, Joaquim Clotet, esteve presente durante a palestra. Segundo Pellanda, enquanto ele terminava a Faculdade, a internet tomava forma. O professor contou que poder ver o nascimento de um meio foi fascinante e despertou sua vontade de apostar nessa área para seguir a profissão. O publicitário de formação integrou a equipe que colocou no ar o primeiro site da Zero Hora e do ClicRBS. Depois de trabalhar no mercado, se dedicou a vida acadêmica. “É o lugar para estar sempre descobrindo coisas novas”, acredita.
Pellanda também considera que a internet móvel foi uma nova revolução. Ele explicou que já previa como seria essa tecnologia antes mesmo de sua criação. “Na área da pesquisa, é importante imaginar como as coisas podem se transformar”, destacou. Com a expansão da internet, as comunicações ficaram cada vez mais fáceis e naturais. “Não temos o tempo necessário para digerir, porque parece que as coisas vão sendo incorporadas e não conseguimos ter muita noção de como elas são transformadoras”. O palestrante lembrou que, antes da internet móvel, as pessoas se conectavam em casa e combinavam de encontrar amigos na rua, o que mantinha os ambientes on-line e off-line separados. Para auxiliar na compreensão, citou Piérre Levy, quando o filósofo comenta que o virtual e o real não são separados e nem opostos.
Os dispositivos vestíveis (wearables), como o Google Glass, também integram o grupo de transformações ligadas à conexão e à mobilidade. Mas Pellanda alertou para o fato de que o tempo tecnológico é diferente do tempo de absorção social de uma tecnologia, por isso o Google pisou no freio no desenvolvimento dessa ferramenta. Já a internet das coisas está ligada ao serviço, com objetos que são capazes de se comunicar com as pessoas. Para exemplificar, citou lâmpadas que informam como está a temperatura na rua através da cor ou da intensidade da luz. “Tentamos entender como fazer essas coisas que ‘falam’. É um lado aberto da pesquisa”.
Ele concluiu que antes existia um indivíduo com um círculo de amigos, que registrava os acontecimentos na memória. Hoje, são muitos indivíduos com uma rede de amigos, registrando tudo com as ferramentas tecnológicas. “Estamos vivendo em um tempo único, com questões que pareciam ficção científica há alguns anos. Esse momento é muito interessante para o meio acadêmico”, frisou. Além do Reitor, pró-reitores, docentes e universitários estiveram presentes na palestra de abertura. Também participou o diretor administrativo financeiro na Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul (Fapergs), Marco Antonio Baldo.
Na próxima terça-feira, 8 de março, ocorre a aula inaugural do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Comunicação Social da PUCRS. O tema da conversa será A Felicidade e a Fúria: O Julgamento das Emoções nos Tribunais da Internet, com a participação do professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro João Batista M. Freire Filho. Ele trabalha temas relacionados a televisão, os significados e caminhos da felicidade, no projeto de pesquisa Felicidade Assistida: A TV, os Especialistas e o Governo da Vida Privada. O encontro será às 14h30min, no auditório do 2º andar do prédio 7 do Campus (avenida Ipiranga, 6681 – Porto Alegre). A atividade tem entrada franca e é aberta ao público em geral.