No verão de 2024, o litoral gaúcho teve um aumento de 734% nos registros de queimaduras por água-viva em comparação ao ano anterior. Para o professor do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Evolução da Biodiversidade e diretor do Instituto do Meio Ambiente (IMA), Nelson Fontoura, este aumento pode estar relacionado com as mudanças da cadeia alimentar ocorridas por conta das alterações no ecossistema pela ação humana, mas também nas mudanças marítimas naturais.
“Isto pode acontecer devido a alterações do sistema de correntes, trazendo mais nutrientes de águas profundas, por exemplo, favorecendo o desenvolvimento de plâncton. Mais plâncton presente na água pode permitir o desenvolvimento de populações mais densas de águas-vivas. O mesmo pode ocorrer devido ao aumento de nutrientes causados pela atividade humana, como adubos nitrogenados ou esgoto doméstico chegando em águas oceânicas”, destaca ao professor.
Além disso, uma das principais causas para maior aparecimento crescente de águas-vivas no litoral gaúcho se dá também pelos ventos e pela temperatura da água. “As águas-vivas são trazidas para as praias principalmente quando ocorrem dias sucessivos de ventos do quadrante sul, que, por meio da Força de Coriolis, fazem com que águas superficiais quentes e translúcidas do mar aberto se aproximem da praia, trazendo as águas vivas”, explica Fontoura.
Esses animais são importantes para a configuração do cenário de vida marinha e terrestre, pois são predadoras de espécies planctônicas e de pequenos peixes. Por outro lado, servem de alimento para tartarugas marinhas, mas também raposas, crocodilos e onças. Por isso, alterações na abundância de alimentos podem causar pressões no equilíbrio das cadeias alimentares.
A água-viva, na verdade, não causa queimaduras, mas quando seus tentáculos tocam a pele, é liberado um líquido tóxico urticante, causando a falsa sensação de queimadura. Esse líquido é parte fundamental do processo de alimentação da água-viva, pois é responsável por injetar substâncias tóxicas que auxiliam na captura de presas, além de ser um mecanismo de defesa. Para além das “queimaduras”, os impactos também são percebidos pelas populações locais que sobrevivem do turismo e pesca.
“Um excesso de águas-vivas diminui a atividade pesqueira, pois elas predam pequenos peixes. Podem também se acumular nas redes de pesca, tornando-as mais visíveis aos peixes, que podem evitá-las, e também representando trabalho adicional para a limpeza das redes. Em alguns balneários, podem representar uma experiência negativa para os turistas, que podem optar por não retornar em novas temporadas”, elenca o diretor do IMA.
A humanidade testemunhou nos últimos anos transformações significativas em seu ambiente natural impulsionadas, principalmente, pelas mudanças climáticas globais. Essa complexa interação entre fenômenos atmosféricos, o aumento das emissões de gases de efeito estufa e atividades humanas têm desencadeado uma série de impactos no ecossistema terrestre e aquático, como, por exemplo, o aumento da temperatura do média do planeta. À medida que a terra vai aquecendo, as consequências para a biodiversidade, os recursos hídricos e a estabilidade dos ecossistemas tornam-se cada vez mais evidentes.
A Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Pró-Mata da PUCRS faz parte do Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (PELD), onde são desenvolvidos oito subprojetos coordenados por pesquisadores em suas áreas de atuação. O PELD é uma iniciativa do Governo Federal, sob a coordenação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), que formou uma rede de sítios de referência para a pesquisa científica no tema de Ecologia de Ecossistemas. Para apresentar o ecossistema do Pró-Mata a Universidade, por meio de seu Instituto do Meio Ambiente (IMA), vem realizando uma série de vídeos documentais que pretendem transbordar os estudos realizados para a comunidade universitária e a sociedade. Assista o primeiro:
Além do Pró-Mata, a PUCRS lidera inúmeras outras pesquisas e iniciativas globais que buscam mitigar a crise climática e a potencializar o uso de energias renováveis. Alinhada com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU), o diretor do IMA, professor Nelson Fontoura, destaca que a Universidade promove a pesquisa ecológica de caráter sustentável e permanente, em ambientes aquáticos e terrestres:
“Nesse contexto de mudanças ambientais, é extremamente importante mapearmos e conhecermos como as alterações ambientais interferem na biodiversidade”, destaca Nelson Ferreira Fontoura, diretor do IMA.
Os campos são de extrema importância para a natureza, porém a atenção ainda é pouca se comparado com florestas. Os ecossistemas campestres apresentam altos níveis de biodiversidade, muitas espécies de plantas e animais são exclusivas desse local, ou seja, não são encontradas em ecossistemas florestais ou outras formações ecológicas. Essa diversidade biológica é de extrema relevância para a sociedade, pois possibilita processos naturais como a polinização e manutenção da qualidade da água. Além disso, as plantas servem como alimento tanto para as espécies de herbívoros nativos quanto para rebanhos de animais exóticos.
“O projeto PELD inclui a amostragem de artrópodes para vermos a dinâmica de como funciona com a reintrodução do manejo por fogo no ecossistema campestre”, aponta Mariana Beal Neves, pós-graduanda do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Evolução da Biodiversidade da PUCRS.
A amostragem dos artrópodes é dividida em dois níveis: um ao nível do solo e outro na estrutura da vegetação. Pesquisar sobre essa classe é de suma importância, pois ela é considerada o grupo mais mega diverso da Terra, por conter insetos, crustáceos, aracnídeos, diplópodes, e quilópodes em sua cadeia.
No Laboratório de Ecologia de Interações da PUCRS são feitas as coletas dos artrópodes e de vegetações retiradas do sítio do Pró-Mata, para analisar o todo. O processamento dos artrópodes é feito em duas divisões, alguns ficam em álcool 70% e outros em via seca. Já as amostras de vegetações são identificadas em campo ou são trazidas para o laboratório, secas na estufa e montadas para a identificação final.
“A biodiversidade que há nos campos hoje, tanto de plantas quanto de animais, evoluiu junto com esse regime de distúrbios,” pontua Pedro Maria Abreu Ferreira, pesquisador do Instituto do Meio Ambiente da PUCRS.
As queimadas, por serem recorrentes, se tornaram um tema de pesquisa fundamental dentro do Pró-Mata. O estudo envolve comparações entre os ecossistemas campestres prejudicados pelo fogo e os não prejudicados, com etapas envolvendo a análise do tamanho da área folhar e do teor de fibras. O esperado é encontrar folhas maiores em campos onde houve o manejo de fogo, pois elas precisam de mais energia para sobreviver, e um menor teor de fibras. Nos campos onde não ocorreu o manejo de fogo, é esperado encontrar folhas menores, de crescimento mais lento e longevas – apresentando maior teor de fibras.
O homem reduziu a velocidade da expansão das florestas sobre os campos com as queimadas, uma dinâmica complexa que é estudada no programa PELD na RPPN Pró-Mata em busca de respostas e soluções para um futuro que não está tão longe assim.
O CNPq inaugurou em 1999 o Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração (PELD), que formou uma rede de sítios de referência para a pesquisa científica no tema de Ecologia de Sistemas – cofinanciado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS). Os projetos desenvolvidos podem oferecer no futuro uma ideia clara de como o ambiente está evoluindo, principalmente com os impactos humanos.
O sítio PELD Pró-Mata foi estabelecido em São Francisco de Paula, na serra gaúcha, em uma área de Mata Atlântica, um dos biomas mais ameaçados do mundo – por isso é considerado prioritário para conservação. Foi adquirida em 1993 pela Universidade e convertida em RPPN em 2019, garantindo a perpetuidade do compromisso da PUCRS com a conservação da biodiversidade, bem como a mitigação do impacto das atividades humanas. Acompanhe a série de vídeos pelo canal da PUCRS no YouTube.
Desenvolvido pelo Instituto do Meio Ambiente da PUCRS (IMA), o monitoramento permanente do Arroio Dilúvio é realizado desde junho deste ano de forma mensal em cinco pontos ao longo da Avenida Ipiranga, entre a Avenida Antônio de Carvalho e a foz com o Lago Guaíba. Após a coleta das amostras, a água é analisada pelo Laboratório de Processos Ambientais (LAPA), da Escola Politécnica da PUCRS, e pelo Centro de Pesquisa de Toxicologia e Farmacologia (INTOX), da Escola de Ciências da Saúde e da Vida. As análises possibilitam o diagnóstico da qualidade ambiental dentro do ecossistema do Arroio e podem servir como base para identificar quais as redes de drenagem que apresentam maior carga de poluição orgânica e que necessitariam de intervenções prioritárias.
Mau cheiro e morte de peixes
Na última quinta-feira, dia 5 de dezembro, um acúmulo de algas foi observado em um trecho final do Dilúvio na Avenida Ipiranga. De acordo com o diretor do IMA, o professor Nelson Ferreira Fontoura, este fenômeno acontece principalmente no verão pela falta de chuvas e diminuição do nível do Arroio, que causam a proliferação de algas sobre os sedimentos de fundo, as quais se desprendem em blocos na forma de placas flutuantes. Estas, expostas ao Sol e à dessecação, acabam se deteriorando, liberando o mau cheiro.
Outro acontecimento que chamou a atenção para as águas do Dilúvio foi o aparecimento de dezenas de peixes mortos. Os animais já tinham sido vistos na superfície em novembro e reapareceram no início deste mês. Segundo Fontoura, os estudos do IMA apontaram que a principal causa das mortes é a baixa concentração de oxigênio na água, que ocorreria especialmente nas madrugadas mais quentes. Além disso, ele ressalta que a poluição contribui para a degradação ambiental do ecossistema do Arroio.
“Identificamos, como já esperado, uma concentração muito elevada de coliformes fecais, os quais já estão presentes na Avenida Antônio de Carvalho, confirmando que já temos uma elevada carga de poluição orgânica vinda do bairro Agronomia e de Viamão. Temos também metais pesados, como mercúrio, zinco, cobre e níquel, que aparecem em concentrações elevadas nos sedimentos. Embora não tenhamos informação da origem dos mesmos, existe contribuição expressiva do desgaste de discos e pastilhas de freio de automóveis, que geram uma fuligem metálica que é lavada pela chuva e conduzida ao Dilúvio pelo sistema de drenagem urbana”, explica.
Recuperação ambiental
O monitoramento realizado pelo IMA propõe um diagnóstico a longo prazo sobre a evolução da qualidade ambiental do Arroio. Para Fontoura, a solução dos problemas recorrentes necessita de ações efetivas. “A resolução dos problemas ambientais do Dilúvio passa por profundas intervenções no sistema de drenagem urbana, com necessidade de separação total da rede de esgoto cloacal, que já sofre tratamento, da rede de esgoto pluvial, que drena para o Arroio”, aponta o professor.
Fontoura ainda destaca que a ocupação irregular do solo urbano em áreas de proteção ambiental junto aos arroios formadores do Dilúvio é um problema que contribui diretamente para a poluição do Arroio. “Esta população de baixa renda, que ampliou a ocupação de morros e encostas ao longo de muitos anos, não tem acesso à rede de esgoto, e o recolhimento de lixo não é o suficiente. Neste caso, o esgoto das residências e o lixo são lançados diretamente nos arroios, chegando ao Dilúvio. A solução deste problema vai exigir um plano de governo que ultrapasse uma única administração, pois serão necessários recursos da ordem de bilhões de reais e uma sucessão de administrações municipais comprometidas com este objetivo, até que se resolva definitivamente o passivo ambiental já instalado”, afirma.
Com a proposta de conectar pesquisadores no Centro de Pesquisas e Conservação da Natureza (Pró-Mata), o Instituto do Meio Ambiente (IMA) promove o 1º Simpósio Pró-Mata, de 22 a 25 de novembro, no prédio 50 do Campus (Avenida Ipiranga, 6.681 – Porto Alegre). Com a temática Construindo Ciência para um futuro sustentável, o evento conta com palestras, oficinas e apresentação de trabalhos gratuitamente. Também haverá uma excursão à área de conservação do Pró-Mata, em São Francisco de Paula (RS), ao custo de R$ 250,00 por pessoa, incluindo transporte, alimentação e hospedagem no local. A programação completa e as inscrições podem ser realizadas a partir deste link.
O simpósio integra a Agenda Ambiental, iniciativa lançada em 2015 como forma de reunir as atividades desenvolvidas pelo IMA. Dentre suas ações estão a Semana do Meio Ambiente, a Primavera na PUCRS (concurso e exposição fotográfica), e atividades desenvolvidas dentro de um programa com foco em sustentabilidade para a Universidade. “A proposta está sendo discutida com a gestão institucional”, comenta Larissa Becko, assessora da direção no IMA.
O IMA atua para a preservação dos recursos naturais e a conscientização ambiental através de iniciativas multidisciplinares para pesquisa, ensino e extensão. Além do Pró-Mata e da Agenda Ambiental, dentre seus projetos estão o Banco de Canecas, o Observatório de Aves da PUCRS, o projeto Revitalização da Bacia do Arroio Dilúvio e oferece cursos de especialização. Ainda, conta com a atuação do Comitê de Gestão Ambiental (CGA), criado em 2010 para apoiar a Administração Superior nas questões voltadas ao meio ambiente, que estimula procedimentos técnicos administrativos com disseminação de boas práticas. O CGA é vinculado à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propesq) e é integrado por professores e funcionários de diferentes unidades.
Localizado em São Francisco de Paula, o Centro foi concebido pela PUCRS como uma área voltada para a pesquisa e a conservação da natureza, para a geração e a divulgação de conhecimento científico e para o desenvolvimento sustentável. O projeto teve apoio da Universidade de Tübingen, da Alemanha, e da empresa alemã Stihl, sendo inaugurado em 1996. Sua infraestrutura conta com salas de aula com recursos audiovisuais, laboratórios de preparação, análise e conservação de amostras, trilhas, mirante, estrutura de hospedagem e rede wireless.
Recebe uma média de 1200 usuários por ano, sendo pesquisadores, professores e alunos tanto da PUCRS quanto de outras instituições nacionais e internacionais. São cerca de 180 estudos já realizados e mais de 20 em andamento que abrangem desde a descrição de novas espécies de plantas e animais até a utilização de plantas nativas na geração de produtos através da extração de óleos e outros subprodutos do metabolismo dos organismos. Ainda, tem projetos voltados para a sensibilização e educação ambiental, que integram a comunidade do entorno e escolas de outros municípios.
Com objetivo de pesquisa, ensino, extensão e conservação da biodiversidade, tem mais de três mil hectares de florestas e campos naturais, com Floresta Araucária, Mata Atlântica senso estrito e campos de altitude. A área está inserida em uma das zonas núcleo da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica, tombada pela UNESCO.
Para 2018, o Pró-Mata prepara uma série de seis documentários com as temáticas de formação ecológica, aves, felinos, araucária, polinização, educação ao ar livre. Os filmes terão até 25 minutos cada e há negociações com canais de TV à cabo para veiculação. A realização é uma parceria entre o Centro Tecnológico Audiovisual do RS (Tecna) e uma produtora externa.
O IMA promove cursos de especialização com aulas teóricas, práticas e visitas ao Pró-Mata. Atualmente, oferece o curso de Gestão da Qualidade para o Meio Ambiente, que está na sua 22ª edição, capacita profissionais de diversas áreas, como engenheiros, gestores, biólogos, químicos, arquitetos, geógrafos, advogados e professores.