Quase 29 milhões de pessoas já receberam pelo menos a primeira dose da vacina contra a Covid-19 no Brasil, segundo dados do consórcio de veículos de imprensa divulgados neste mês. Desde o começo de abril, acontece em paralelo a 23ª Campanha Nacional de Vacinação contra a Gripe (Influenza) em todo o território nacional, promovida pelo Ministério da Saúde. Se você faz parte do grupo que está apto a receber as duas doses, confira respostas para as principais dúvidas e alguns cuidados importantes antes de se vacinar.
A professora Ana Duarte, da Escola de Ciências da Saúde e da Vida da PUCRS, preparou algumas orientações úteis. Como pesquisadora, Ana trabalha com temas relacionados a vacinas, imunologia viral, terapias antivirais e antitumorais e respostas de diferentes tipos de células.
Antes de procurar um posto de vacinação é importante se informar sobre quais são os grupos prioritários estabelecidos pelo Plano Nacional de Imunização (PNI) (para a Covid-19). No caso no Rio Grande do Sul, acompanhe os informativos no site Te Vacina, da Secretaria Estadual da Saúde.
Os grupos prioritários foram estabelecidos para garantir a proteção de pessoas com maior risco de desenvolvimento dos estágios mais graves dessas doenças, preservando vidas e possibilitando o funcionamento dos serviços de saúde.
Para a Covid-19, pela escassez de doses disponíveis, a preferência é para pessoas com 60 anos ou mais; pessoas com deficiência (PCDs); gestantes; povos indígenas vivendo em terras indígenas; povos e comunidades tradicionais ribeirinhas e quilombolas; trabalhadores da Saúde; grupo com comorbidades; entre outros disponíveis no PNI, mas ainda sem previsão para o começo da imunização.
Além dessas, no caso da gripe também estão incluídas: crianças de seis meses a menores de seis anos de idade; pessoas em período pós-parto (puérperas); e adolescentes e jovens de 12 a 21 anos de idade sob medidas socioeducativas.
É importante lembrar de levar algum documento de identificação (com foto, de preferência), comprovantes (caso faça parte dos grupos prioritários não relacionados à idade, como profissionais da saúde) e a carteirinha de vacinação das crianças (para Influenza). Se for receber a segunda dose contra o coronavírus, leve também o comprovante de que você tomou a primeira vacina.
Para preservar a saúde, em alguns casos o ideal é adiar a aplicação das vacinas. Em pacientes com doenças febris, por exemplo, recomenda-se esperar até a melhora dos sintomas. A vacina da Influenza pode ser administrada mesmo com a ingestão de outros medicamentos, entretanto, remédios imunossupressores podem atrapalhar a resposta da vacina.
Pacientes que previamente apresentaram reações alérgicas após ingestão de ovo (angioedema, desconforto respiratório, vômitos repetidos) podem receber a vacina para Influenza, desde que em um ambiente onde seja possível o tratamento de manifestações alérgicas graves e com supervisão médica.
Também é preciso ter cautela e avaliar caso a caso ao administrar a vacina em pessoas com trombocitopenia, qualquer distúrbio da coagulação ou a pessoas em terapia anticoagulante.
Não é recomenda a administração simultânea das vacinas contra o coronavírus e a gripe. A indicação é respeitar um intervalo de pelo menos 14 dias entres as doses.
As vacinas contra a Covid-19 atualmente disponíveis no Brasil têm esquemas diferentes de aplicação. Fique atento/a ao cronograma para o momento certo de retornar para segunda dose de acordo com a empresa fabricante:
Crianças com menos de nove anos recebem duas doses da vacina da Influenza na primeira imunização, com intervalo de um mês. Acima de nove anos a dose é única.
As reações adversas mais comuns associadas a todas essas vacinas estão relacionadas à dor local e eventual processo alérgico. Em especial para vacina da AstraZeneca (Fiocruz), existe o risco muito baixo de ocorrência de coágulos sanguíneos. Preste atenção aos possíveis sintomas, como falta de ar, dor no peito, inchaço na perna, dor de cabeça e abdominal.
Todos os imunizantes disponíveis hoje passaram por longos períodos de testes e análises e são seguros para a utilização pela população. Caso seja necessário, procure orientação médica, mas evite se expor aos vírus.
Para que todo mundo possa voltar a fazer planos para o período pós-pandemia, é necessário que cada um e cada uma continue tomando os principais cuidados de higiene e segurança. Se precisar sair, lembre-se de usar máscara e levar o álcool em gel, além de manter o distanciamento social.
Além de docente, Ana Paula Duarte de Souza é graduada em Farmácia Bioquímica e Análises Clínicas (UFSM), tem mestrado em Biotecnologia (UFSC) e doutorado em Biologia Celular e Molecular (PUCRS) com sanduíche na University of Melbourne na Austrália (2009) e pós-doutorado na área de Imunologia (PUCRS).
A Universidade Aberta da Terceira Idade (Unati) promoveu nesta semana o bate-papo online Vacinei, e agora?, que abordou a importância e os efeitos da imunização contra a Covid-19.
O convidado foi o médico Fabiano Ramos, chefe do serviço de Infectologia do Hospital São Lucas da PUCRS (HSL) e líder do estudo de desenvolvimento da vacina Coronavac no Rio Grande do Sul, que contou com mais de mil voluntários/as.
Confira a gravação completa do evento e saiba mais sobre o processo de imunização:
A Gripe Espanhola, como ficou conhecida, tratava-se do vírus Influenza. A Espanha, com grande número de pessoas contaminadas, se encarregou de divulgar a notícia. Isso fez com que o país tenha sido associado, injustamente, à gripe, dando-lhe o nome.
Na ocasião, em 1918, houve mais mortes pela gripe do que em toda a Primeira Guerra (1914-1918). A população mundial era de 500 milhões de habitantes. Estima-se que 10% da população tenha morrido, ou seja, 50 milhões de pessoas! A epidemia1 alcançou todos os continentes, condição para ser chamada de pandemia2.
O vírus chegou ao Brasil no final daquele mesmo ano, ocasionando 36 mil mortos. Até mesmo o presidente da República, Francisco de Paula Rodrigues Alves (1848-1919), acabou vitimado, em janeiro de 1919, aos 70 anos, antes mesmo de tomar posse. Foram tantas vítimas que as valas eram coletivas. Os coveiros foram contaminados e afastados do trabalho. Transeuntes e detentos passaram a ser recrutados e obrigados a realizar os sepultamentos. “Escolas mandaram crianças para casa, hospitais ficaram abarrotados, bondes estavam vazios e tudo fechou: o comércio, as quitandas, os bares, as lojas de moda, as barbearias. O governo proibiu aglomerações, e os teatros e cinemas foram trancados e lavados com desinfetantes […]”. (SCHWARCZ, 2020)3.
No Rio Grande do Sul, de outubro a dezembro de 1918, houve 3.971 óbitos decorrentes da gripe4. Na ocasião, havia menos de 2 milhões de habitantes no estado. Para que possamos avaliar o impacto do contágio e a mortalidade: somos atualmente cerca de 11 milhões de pessoas. Isso equivaleria, proporcionalmente, a 22 mil mortos!
Em Porto Alegre, a Influenza chegou a contaminar mais de 80 pessoas em um só dia, conforme reportagem em jornal existente no acervo Benno Mentz, no Delfos – Espaço de Documentação e Memória Cultural, do Instituto de Cultura da PUCRS5. Segundo censo populacional do período (1910), a capital gaúcha tinha menos de 200 mil habitantes. Foram mais de 12 mil mortos, em 3 meses, sendo destes pelo menos 1.319 mortes atribuídas diretamente à gripe. Os números, no entanto, devem ter sido subestimados.
Foram adotadas medidas de isolamento, remédios foram especulados como cura, houve corrida às farmácias, recomendavam-se medidas de higiene, usavam-se máscaras em ambientes públicos, proibiram-se cultos religiosos e velórios. Houve desabastecimento de alguns produtos, foi necessário fazer tabelamento de preços e restrição da quantidade de produtos a adquirir. Hospitais e postos de saúde foram improvisados. Tal como vemos agora!
Outras epidemias já assolaram o mundo, como cólera, varíola, febre amarela, peste bubônica, tifo, malária, sarampo, tuberculose, ebola, HIV, SARS. Por isso, podemos afirmar que o COVID-19 ou o novo coronavírus, que nos ataca neste momento (2020), não é a primeira e nem será a última pandemia que a humanidade está (des)preparada a enfrentar, com grande número de vítimas. Infelizmente…
A boa notícia é que, em todos os casos, tal como na Gripe Espanhola há 102 anos, cada epidemia, com o passar do tempo, perde força, sofre mutações ou desaparece, seja com a adoção de tratamentos de saúde mais adequados, seja pela descoberta de vacinas, capazes de imunizar a população, ou, ainda, com a contenção da propagação do vírus, mediante obediência às medidas sanitárias, por recomendação de cientistas e autoridades médicas.
O que aprendemos com a História? Nada é para sempre… Isso tudo vai passar!
Há vários livros sobre a história das doenças e epidemias no mundo ao longo do tempo. A editora da PUCRS (EDIPUCRS) publicou, em 2009, a dissertação de mestrado (PPGH/PUCRS), de autoria da professora Janete Silveira Abrão: Banalização da Morte na cidade calada: a Hespanhola em Porto Alegre, 19186.
Outras pesquisas históricas, de cunho acadêmico, trataram do impacto da gripe em municípios como Pelotas (FERREIRA, 2002)7, Rio de Janeiro (GOULART, 2003, 2005), São Paulo (BERTUCCI, 20008; BERTOLI FILHO, 20039; SOUZA, 200510) e em estados como Bahia (SOUZA, 2010) e Espírito Santo (2016)11. Algumas obras encontram-se disponíveis para consulta em meio digital.
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1 “Epidemia representa a ocorrência de um agravo acima da média (ou mediana) histórica de sua ocorrência. O agravo causador de uma epidemia tem geralmente aparecimento súbito e se propaga por determinado período de tempo em determinada área geográfica, acometendo freqüentemente elevado número de pessoas” conforme MOURA, Alexandre S.; ROCHA, Regina L. Endemias e Epidemias:… Belo Horizonte: Nescon/UFMG, 2012. P. 15.
2 Quando uma epidemia atinge vários países de diferentes continentes passa a ser denominada pandemia.
3 SCHWARCZ, Lilia. Literatura em tempos de pandemia: quando a realidade imita a ficção. Nexo Jornal, 23 mar. 2020.
4 De acordo com o Relatório da Diretoria de Higiene do Rio Grande do Sul (1919 apud ABRÃO, 2009, p. 94).
5 O local reúne quase 50 acervos, disponíveis para pesquisa local.
6 Livro disponível à venda pela loja virtual em http://livrariaedipucrs.pucrs.br/. Email: edipucrs@pucrs,br
7 FERREIRA, Renata Brauner. Epidemia e Drama: a gripe espanhola em Pelotas, 1918. Porto Alegre: UFRGS, 2002. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2002.
8 BERTUCCI, Liane Maria. Influenza, a medicina enferma: ciência e práticas de cura na época da gripe espanhola em São Paulo. Campinas: Ed. Unicamp, 2000.
9 BERTOLII Filho, Cláudio. A gripe espanhola em São Paulo, 1918: epidemia e sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.
10 SOUZA, Christiane Maria Cruz de. As dimensões político-sociais de uma epidemia, a paulicéia desvairada pela gripe espanhola, 2005.
11 FRANCO, Sebastião Pimentel; LOPES, André Fraga; FRANCO, Luiz Felipe Sias. Gripe Espanhola no Espírito Santo: alguns apontamentos. Dimensões, Vitória, v. 36, jan/jun. 2016, p. 404-26