Nova pesquisa do PUCRS Data Social aponta os afazeres domésticos como principal motivo de afastamento das mulheres do mercado de trabalho/ Foto: Envato
A mais recente análise do PUCRS Data Social: Laboratório de Desigualdades, Pobreza e Mercado de Trabalho, intitulada “Levantamento Sobre Gênero, Trabalho e Parentalidade no Rio Grande do Sul”, aponta que, no Rio Grande do Sul, 19,7% das mulheres em relações conjugais com idade entre 25 e 50 anos estão fora do mercado de trabalho, sendo que 13,4% se afastam em função da demanda de tarefas domésticas, como cuidar dos filhos, de outros dependentes ou dos afazeres domésticos. Ou seja, o motivo que faz 68,3% das mulheres estarem fora do mercado é o trabalho doméstico. Entre os homens no mesmo recorte, por sua vez, apenas 2,6% não participam do mercado de trabalho, sendo que somente 0,3% se afastam em função de tarefas domésticas.
Tamanha diferença se torna ainda mais marcante quando olhamos apenas para famílias com filhos. Entre as famílias gaúchas com filhos de até seis anos, 25,9% das mulheres, chefes de família ou cônjuges, estão fora do mercado de trabalho. Entre os homens, somente 1,6%. E mesmo analisando somente famílias cujos filhos têm entre seis e quinze anos – ou seja, em uma faixa etária mais elevada –, a diferença é significativa: enquanto apenas 4,2% dos homens não participam do mercado de trabalho, entre as mulheres essa proporção chega a 18,5%.
A fonte de dados é da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio Contínua, em sua versão trimestral. O recorte utilizado inclui pessoas de referência no domicílio e cônjuges, em relações heterossexuais, com idade entre 25 e 50 anos, no 4º trimestre de cada ano estudado.
“Os resultados expressam, primeiro, a marcante divisão do trabalho doméstico, em especial no que se refere ao cuidado com os filhos, pelo qual as mulheres são tidas como responsáveis. E, em segundo, o resultado substantivo disso na redução da participação dessas mulheres no mercado de trabalho”, diz o professor Andre Salata, coordenador do PUCRS Data Social e um dos autores do estudo.
Essas constatações ficam muito evidentes quando se compara a participação de homens e mulheres no mercado de trabalho, de acordo com o número de filhos. Entre os casais sem filhos, 2,3% dos homens estão fora do mercado de trabalho, e 14,8% das mulheres. Quando consideramos apenas casais com um filho, 3% dos homens não trabalham nem procuram emprego, contra 18,9% das mulheres. Quanto a casais com três ou mais filhos, 36,6% das mulheres e somente 4,8% dos homens estão fora do mercado de trabalho.
Mulheres negras sofrem ainda mais desvantagens no âmbito do trabalho do que as mulheres brancas/ Foto: Envato
“Os dados mostram que, em relação às mulheres, há um claro aumento na proporção daquelas que estão fora do mercado entre famílias com mais filhos. O mesmo, no entanto, não ocorre entre os homens, cuja participação pouco varia em função do número de filhos. Isso é, em alguma medida, resultado da ideia de que cabe mais às mulheres do que aos homens cuidar dos filhos”, diz a professora Izete Pengo Bagolin, pesquisadora do PUCRS Data Social.
O levantamento traz ainda dados sobre desigualdades raciais, e mostra que mulheres gaúchas negras parecem sofrer mais desvantagens que as brancas nesse âmbito. Entre as mulheres brancas, 12,8% estão fora do mercado de trabalho por motivos domésticos. Já entre as negras, a proporção era de 16,8% no quarto trimestre de 2023. Além disso, os dados evidenciam que, independentemente no número de filhos ou da idade deles, a taxa de mulheres negras fora do mercado de trabalho é sempre maior que a de mulheres brancas.
Segundo Ely José de Mattos, pesquisador do PUCRS Data Social, mulheres negras estão sobrerepresentadas nos estratos mais baixos da população. “Em virtude disso, estamos falando de famílias com menos recursos para pagar babás ecreches. Ou seja, é esperado que entre mulheres negras o fardo do trabalho doméstico seja ainda maior, conforme mostram os dados”, pontua.
Por fim, o estudo traz uma comparação entre as unidades da federação. Apesar dos preocupantes dados acima mencionados, o Rio Grande do Sul possui a menor taxa de mulheres fora do mercado de trabalho (13,4%). No Acre, estado com a maior taxa, a proporção chega a 38,1%. Em São Paulo está em 17,2%, e no Rio de Janeiro em 20,8%.
“Essas proporções estão correlacionadas com o nível socioeconômico das unidades da federação. Em estados mais ricos, as famílias têm mais recursos para pagar pelo trabalho doméstico, fazendo a pressão sobre as mulheres cair um pouco. Mesmo assim, os dados continuam preocupantes, como no caso do Rio Grande do Sul”, conclui Salata.
Dados da oitava edição do Boletim Desigualdade nas Metrópoles mostram que a recuperação da renda dos mais pobres perdeu força nas metrópoles brasileiras no início de 2022. Após cinco trimestres consecutivos de crescimento, a média da renda do trabalho dos 40% mais pobres no conjunto das metrópoles do país caiu, chegando a R$240,79 per capita. “É um empobrecimento de longa duração e isso traz consequências sociais terríveis. As famílias vão ‘queimando’ as reservas que tinham para poder sobreviver nesse período e essa agonia não passa, vai perdurando trimestre a trimestre”, ressalta o professor da Escola de Humanidades da PUCRS e um dos coordenadores do estudo, Andre Salata.
Entre o período anterior à pandemia (primeiro trimestre de 2020) e o terceiro trimestre de 2020, a renda do estrato mais pobre das metrópoles sofreu uma brusca queda de 31,9%, chegando ao menor valor da série histórica: R$183,61. Desde então, o que se apresentava era um lento processo de recuperação, fazendo a renda média daquela parcela da população alcançar o valor de R$245,55 no último trimestre de 2021 – uma cifra ainda 8,9% menor do que a encontrada antes da pandemia. Agora no início de 2022, no entanto, a trajetória de recuperação foi interrompida e a renda dos mais pobres caiu, sendo reduzida para o valor de R$240,79.
De acordo com o também coordenador do estudo e professor do IPPUR/UFRJ, Marcelo Ribeiro, o rendimento do trabalho corresponde a 70% do rendimento domiciliar. “Evidentemente, quando se trata de famílias que têm baixos rendimentos, esses rendimentos são tanto oriundos do trabalho, como também de políticas de transferências governamentais. Então, pode se aproximar da situação de pobreza, mas expressa uma situação de vulnerabilidade social. Até porque o rendimento do trabalho é decisivo para as famílias em geral. Se esse rendimento se reduz, isso aponta um aumento da vulnerabilidade social”, explica o pesquisador.
A média geral de rendimentos para todos os estratos também seguiu em queda, alcançando no primeiro trimestre de 2022, pelo segundo trimestre consecutivo, o pior nível de toda a série histórica iniciada em 2012, com o valor de R$ 1.405,73 – no quarto trimestre de 2021 essa média era de R$1.414,07. Quando comparada com a situação no último trimestre antes da pandemia, momento em que a renda média nas metrópoles era de R$1.575,51, a redução foi de 10,7%. Desde 2020, já são oito trimestres de renda média atingindo os menores valores de toda a série histórica nas metrópoles brasileiras.
“Um dos fatores que podem explicar a queda é a inflação, que está corroendo a renda de todos, e que está interrompendo esse processo de recuperação dos mais pobres e faz a gente ver esse resultado”, avalia Salata. Mas, segundo ele, também existem outros elementos, como a própria recuperação do mercado de trabalho, onde se teve uma manutenção da taxa de desocupação do quarto trimestre de 2021. “A taxa de desocupação vinha caindo e a tendência é de uma certa estabilidade nesse último trimestre que analisamos”, pontua. Além disso, os pesquisadores afirmam que essa recuperação está muito baseada em ocupações de baixo status e de baixa remuneração. Então, esses fatores juntos, mas principalmente a inflação, explicam o motivo da queda da renda dos mais pobres depois de uma sequência de trimestres em recuperação.
Uma grave consequência é que após cinco trimestres de queda, voltou a aumentar o percentual de moradores do conjunto das metrópoles que vivem em domicílios cuja renda média per capita do trabalho era de até ¼ do salário-mínimo. Em termos absolutos, no primeiro trimestre de 2022 foram registradas 21,1 milhões de pessoas nessa situação.
E o mesmo crescimento foi observado também para a taxa de crianças de até cinco anos de idade que vivem em lares com rendimentos do trabalho inferiores a ¼ do salário-mínimo per capita nas metrópoles brasileiras. Essa taxa alcançou 29,2% da população de crianças, patamar próximo ao registrado no auge da pandemia: 32,2%. Em termos absolutos, no 1º trimestre de 2022 havia 1,8 milhões de crianças nessa situação, o que é um número maior que o da população total de Regiões Metropolitanas como Natal, João Pessoa, Maceió ou Florianópolis, entre outras.
Conforme Marcelo Ribeiro, o quadro explicita o drama social existente nas metrópoles brasileiras. “Essa situação de pobreza, ao atingir quase 30% das crianças de até cinco anos de idade, na medida em que renda é fundamental para garantir as condições de alimentação e nutrição, numa faixa etária em que as pessoas estão passando pelo desenvolvimento humano, psíquico e cognitivo, estamos comprometendo toda uma geração”, alerta Ribeiro.
O boletim também apresenta os resultados da desigualdade de renda mensurada pelo coeficiente de Gini. No primeiro trimestre de 2022, o coeficiente de Gini do conjunto das metrópoles brasileiras foi de 0,595, comportamento de redução desde o quarto trimestre de 2020. Ribeiro explica que a redução do Gini, que expressa diminuição das desigualdades de renda em toda a população, se deu pela redução dos rendimentos de todos os estratos de rendimento, sendo que os estratos de maior renda (os 10% do topo da distribuição), reduziu proporcionalmente mais do que os estratos de menor renda (os 40% da base da distribuição). Para ele, uma redução das desigualdades onde todos perdem não pode ser comemorada como aumento da equidade social.
Tendências futuras
Para Andre Salata, com a queda da inflação é possível uma certa estabilização, mas o cenário é incerto. “Se a inflação cair e a atividade econômica mantiver nesse processo, ainda que lento, de recuperação, a tendência é de uma certa melhora”, aponta. Já Marcelo Ribeiro explica que há, também, uma situação de elevação da taxa de juros pelo Banco Central, que acaba inibindo um processo de recuperação do crescimento econômico. “Então, o fato de não crescer, inviabiliza a possibilidade de haver um aumento no nível de remuneração geral do mercado de trabalho. Pode ser mais no sentido de uma estabilização em função desses efeitos contrários da inflação e do crescimento econômico, do que de uma continuada queda como estamos vendo até agora”, analisa.
O Boletim Desigualdade nas Metrópoles é produzido trimestralmente pelo Observatório das Metrópoles, em parceria com a Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS) e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). A fonte de dados é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho, incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o primeiro trimestre de 2022, de acordo com o IPCA.
Evolução da média do coeficiente de Gini no conjunto das regiões metropolitanas do Brasil / Fonte: Boletim – Desigualdade nas Metrópoles
Segundo o estudo, para os 40% mais pobres das regiões metropolitanas brasileiras o rendimento médio do trabalho teve queda de 34,2% no comparativo entre o quarto trimestre de 2019 e de 2020. Em termos absolutos, a renda desse estrato diminuiu de R$ 237,18 para R$ 155,95. Para os 10% mais ricos, a queda de rendimentos foi de 6,9%. Como resultado, os mais ricos passaram a ganhar, em média, 39 vezes mais do que os mais pobres.Essa é a maior vantagem do topo em relação à base já verificada em toda a série histórica.
A região metropolitana de Porto Alegre teve o pior resultado entre as metrópoles do Sul do País, com os mais ricos passando a ganhar, em média, 38,4 vezes mais do que os mais pobres. No quarto trimestre de 2020 a média móvel do coeficiente de Gini, um importante indicador de desigualdade, na metrópole gaúcha atingiu o nível de 0,625 na escala que varia de zero a um, sendo a maior média registrada desde 2012, e num patamar bem acima das demais regiões metropolitanas da região Sul.
O coeficiente de Gini mede o grau de distribuição de rendimentos entre os indivíduos de uma população, sendo o valor zero representativo de uma situação de completa igualdade, em que todos teriam a mesma renda; e o valor um a situação de completa desigualdade, em que uma só pessoa deteria toda a renda. O estudo ainda destaca que amédia móvel do indicador nas regiões metropolitanas do Brasil atingiu o nível de 0,631, sendo o pior índice da série histórica.
Perda de renda e retrocesso
AndréSalata, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociaisda PUCRS e um dos coordenadores do estudo, ressalta que a renda do trabalho da população mais pobre no final do ano passado permanecia muito abaixo do patamar encontrado antes da pandemia provocada pela Covid-19 e que a interrupção do auxílio emergencial pelo Governo Federal ampliou o quadro de pobreza.
“Durante o segundo semestre de 2020, o auxílio emergencial conseguiu compensar grande parte das perdas, evitando que 23 milhões de pessoas caíssem na pobreza nas metrópoles, como verificamos no segundo boletim. Porém, o corte dos pagamentos freou a recuperação de renda e ampliou um quadro trágico de aumento da pobreza e da extrema pobreza. Sem dúvida, a interrupção do auxílio foi equivocada e não levou em consideração dados como esse que trazemos aqui”.
De acordo com Marcelo Ribeiro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pesquisador do Observatório das Metrópoles e um dos coordenadores do estudo, o retrocesso no nível de remuneração média do trabalho no Brasil foi de praticamente oito anos. “No final de 2020 houve um patamar próximo ao verificado no primeiro trimestre de 2012, quando começou a série história da PNADc. Ou seja, estamos em níveis próximos daqueles apresentados há oito anos. Esse retrocesso é decorrente da crise econômica existente no País há alguns anos e que foi aprofundada durante a pandemia. As consequências, porém, recaem principalmente sobre a população mais pobre, que além de ter baixa remuneração, é também a que mais perde”, comenta.
Mais pobres sofrem impacto na educação
O estudo também traz evidências de que as desigualdades têm impacto não apenas no nível de consumo e conforto das famílias no momento, como também nas oportunidades futuras de vida de crianças e jovens. Seus efeitos, portanto, são duradouros, e atingem as próximas gerações. Como indicador desses efeitos, os pesquisadores levantaram dados relativos à escolarização das crianças e jovens nos diferentes estratos de renda de nossas regiões metropolitanas.
Os dados mostram que entre os mais pobres no Brasil, 8,8% das crianças e jovens com idade correspondente ao Ensino Fundamental, e 26,9% dos jovens com idade correspondente ao Ensino Médio, tinham escolaridade abaixo da esperada, indicando atraso escolar. No estrato dos 10% mais ricos, esses valores eram de apenas 2,7% e 4,4%, respectivamente.
“Como a desigualdade de renda aumentou substancialmente ao longo da pandemia, com perdas muito grandes para os estratos mais baixos, haverá consequências para o sucesso escolar de crianças e jovens provenientes das famílias mais pobres num futuro muito próximo, em termos de atraso, evasão e ingresso nos níveis mais altos de ensino”, destaca Salata.
Porcentagem de jovens entre 18 e 24 anos que ingressam no Ensino Superior, por estrato de rendimento / Fonte: Boletim – Desigualdade nas Metrópoles
Com relação ao atraso escolar entre os mais pobres, novamente Porto Alegre detém o pior resultado entre as metrópoles do Sul. Os dados mostram que, nesse estrato, 15,5% das crianças e jovens no Ensino Fundamental e 38,69% dos jovens noEnsino Médio tinham escolaridade abaixo da esperada. Entre os mais ricos, porém, esses valores eram de apenas 1,23% e 1,44%, respectivamente.
Acesso a oportunidades também é desigual
De acordo com os dados da pesquisa, apenas 16,8% dos jovens entre 18 e 24 anosque fazem parte do estrato mais pobre do País haviam ingressado no Ensino Superior na média dos últimos quatro trimestres. Entre os mais ricos, esse valor era de 66,4%.
Para Ribeiro, podemos estar jogando fora os ganhos que estávamos acumulando como sociedade referente às oportunidades de crianças e jovens, principalmente daqueles inseridos em famílias mais pobres. O pesquisador salienta que desde 2012 estava sendo observada redução da taxa de atraso escolar, além do maior ingresso de jovens no Ensino Superior. “Com a redução da renda familiar per capita decorrente da crise econômica e do agravamento da pandemia, essas crianças e jovens podem ser levados a abondar a escola ou a universidade e terem que trabalhar para ajudar na composição da renda familiar. Isto é, as consequências do que estamos vivendo não se restringem apenas ao momento atual, mas se referem também ao futuro das crianças e jovens”.
Pesquisa com repercussão nacional
Os resultados da terceira edição do Boletim – Desigualdade nas Metrópoles foram publicados pelos jornais Folha de S. Paulo e Zero Hora. A pesquisa também foi tema de uma reportagem veiculada no Jornal do Almoço, da RBS TV.
Sobre o estudo
A pesquisa tem como objetivo produzir um conjunto de informações relevantes acerca das desigualdades de rendimentos no interior das regiões metropolitanas do País. A publicação tem o intuito de colaborar para um debate público mais bem informado a respeito da grave situação das metrópoles brasileiras no que concerne às desigualdades sociais.
O levantamento utiliza microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), do IBGE, em especial de sua divulgação trimestral. Ao todo são analisadas 20 regiões metropolitanas: Manaus, Belém, Macapá, Grande São Luís, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife, Maceió, Aracaju, Salvador, Belo Horizonte, Grande Vitória, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Vale do Rio Cuiabá e Goiânia; além do Distrito Federal e da Região Administrativa Integrada de Desenvolvimento da Grande Teresina.
Confira o relatório completo da terceira edição do Boletim- Desigualdade nas Metrópoles.
A desigualdade social aumentou no Brasil durante a pandemia. É o que mostra um estudo realizado em uma parceria entre PUCRS, Observatório das Metrópoles e Observatório da Dívida Social na América Latina (RedODSAL).A pesquisa inspirou uma série de reportagens, exibida no Jornal Nacional nos dias 8, 9 e 12 de fevereiro de 2021.Os pesquisadores utilizam dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), doInstituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)e publicam, trimestralmente, boletins da desigualdade.
Composta por três episódios, a série de reportagens abordou a desigualdade em diferentes aspectos: na educação, na economia e no mercado de trabalho. André Salata, professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS e um dos coordenadores da pesquisa, concedeu entrevistas ao Jornal Nacional. Entretanto, como apontado por Salata, essa não é a primeira grande divulgação da pesquisa: os resultados do estudo já foram manchete de capa em importantes jornais brasileiros, o que demonstra que os pesquisadores conseguiram atingir seu propósito – romper com a “barreira” entre a academia e a sociedade, levando a público suas descobertas em uma linguagem acessível a todos.
“Infelizmente o Brasil é um país muito propício para quem trabalha com desigualdades, pois, há décadas, é um dos mais desiguais do mundo. Além disso, desde 2015, essa questão começou a se agravar, tendo sido ainda mais intensificada durante a pandemia. As desigualdades trazem diversas consequências, como a pobreza”. Explica o professor, que acrescenta ser necessário chamar a atenção paraesse assunto de forma que o debate público sobre a desigualdade aconteça. Para Salata, o fato de apesquisa ter sido divulgada na TV aberta e em rede nacional demonstra que esse objetivo foi alcançado.
O que mostram as reportagens
Desigualdade na Educação:De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação, os alunos devem dedicar, no mínimo, quatro horas diárias para os estudos. Entretanto, durante a pandemia, a média foi de 2,37 horas por dia e a desigualdade é visível: alunos de classes sociais mais altas ultrapassaram esse tempo, tendo estudado, diariamente, 3,19 horas, enquanto os mais pobres apenas dedicaram 2,04 horas ao aprendizado. Regionalmente, também há desigualdades: os alunos da região Norte foram os mais excluídos, enquanto alunos do Sudeste, de Goiás, do Distrito Federal, do Pauí e do Ceará foram os que mais tiveram tempo para dedicar aos estudos. A educação pode ser a chave para a mudança de vida das pessoas de baixa renda e a desigualdade nessa área, com a dificuldade de acesso às aulas por estudantes das classes mais baixas, causa danos muito grandes, aumentando, também, a desigualdade de oportunidades.
Desigualdades na Economia:Além de as pessoas estarem perdendo renda, André Salata explica que sua distribuição não está sendo feita de maneira igualitária. Com a queda na atividade durante a pandemia, no período de recuperação, ricos tendem a ficar ainda mais ricos e pobres, mais pobres: os 10% mais ricos do Paísperderam apenas 3% de sua renda na pandemia, enquanto a quantidade perdida entre os 40% mais pobres foi de 32%, descontando o auxílio emergencial, que amorteceu o impacto e reduziu, um pouco, a desigualdade. Mesmo assim, o professor aponta que o mercado de trabalho não deve se recuperar tão rápido e que o fim doauxílio traz um cenário preocupante.
Desigualdades no Mercado de Trabalho: No mercado de trabalho.ocenário também é desigual: para conseguir manter sua posição social e o rendimento, é necessário ter qualificação, o que muitas vezes não é a realidade das classes sociais mais baixas, retornando ao problema da Educação desigual, apontaSalata. Após a queda causada pela pandemia, deverão se recuperar os setores financeiro, tecnológico, telecomunicações, imobiliário e parte do varejo; enquanto continuarão em queda o lazer e a hotelaria, as viagens, a alimentação, os serviços domésticos e outros serviços. Os trabalhadores informais, que não têm proteção, são os primeiros a sentir os efeitos da crise, sendo facilmente descartados pelo mercado de trabalhoe, tendo as maiores perdas na renda.