Evento contou com entrega de prêmios e mais de dez Grupos de Trabalho sobre Comunicação
segunda-feira, 02 de dezembro | 2024Moisés Lemos Martins, Juremir Machado, Michel Maffesoli, Muniz Sodré e André Lemos. / Foto: Lab Foto | Famecos
A Escola de Comunicação, Artes e Design – Famecos da PUCRS realizou, de 26 a 28 de novembro, o 16º Seminário Internacional da Comunicação (Seicom), que, neste ano, teve como tema Comunicação e Laços Sociais: Releituras e Possibilidades. O evento contou com palestras de importantes pesquisadores da área, como Michel Maffesoli, Sandra Massoni, Muniz Sodré, André Lemos, Moisés Lemos Martins e Margarida Kunsch.
O Seminário marcou a celebração dos 30 anos do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da PUCRS (PPGCom). Entre as atrações comemorativas contou com o Prêmio Teses e Dissertações, que valoriza pesquisas na área, e uma homenagem à primeira coordenadora do PPGCom, a professora Dóris Fagundes Haussen.
Para o coordenador do PPGCom, professor Juremir Machado da Silva, os 30 anos do programa foram marcados por muitas lutas, sonhos e metas.
“Um programa se estrutura na medida em que conta com parceiros permanentes, que acompanham sua trajetória. Acreditamos que o PPGCom da PUCRS é um dos principais programas da área de comunicação no País. Em um estado periférico e em uma universidade privada, sabemos que as lutas são mais intensas, mas estamos felizes por alcançar todas essas conquistas nesses 30 anos”, afirmou.
Ele destacou que os convidados para o 16º Seicom foram pesquisadores com uma longa história de colaboração com o programa. Como exemplo, mencionou Michel Maffesoli, parceiro desde 1987, ressaltando que essa continuidade contribui para a solidez do programa. “Contar com parceiros de grande reputação é algo realmente importante e nos enche de alegria”, completou o professor.
Rosângela Florczak, decana da Famecos PUCRS. / Foto: Lab Foto | Famecos
“O que move um pesquisador no campo das Ciências Sociais Aplicadas é, certamente, uma espécie de dor de mundo, uma inquietação profunda com o entorno e com os temas sociais que o impactam.” Essas foram as palavras da decana da Famecos, Rosângela Florczak, ao relembrar que, em 1994, quando o PPGCom iniciava sua jornada, o Brasil vivia o período pós-abertura política, recuperando o fôlego democrático e enfrentando desigualdades sociais em um ambiente midiático dominado pelos meios tradicionais de comunicação. Naquele período, de acordo com a decana, discutia-se a vida por meio do vídeo da televisão, a mercantilização da notícia, a sedução subliminar dos comerciais e a manipulação dos desejos do trabalhador que “vestia a camiseta” e começava a ser chamado de colaborador.
Para ela, as mudanças ocorridas nos últimos 30 anos transformaram as relações, as mídias e os processos comunicacionais a ponto de tornarem o mundo irreconhecível para alguém que, vindo do passado, observasse o cenário atual com curiosidade.
O certo é que, no pano de fundo dessas transformações, continuam a se intensificar as ameaçadoras relações de concentração do poder. Segundo Florczak, assistimos ao agravamento dos efeitos das desigualdades sociais geradas por um sistema perverso, que opera não apenas nas diferenças objetivas, mas, sobretudo, em sua dimensão simbólica, sustentando um estado de coisas que provoca uma espécie de trauma.
Esse trauma, de acordo com ela, impacta sobre o comportamento social e reduz a capacidade de reação. E é esse pano de fundo que segue mobilizando a cada pesquisadora, a cada pesquisador, que contribui para a construção da história desse programa e do campo da comunicação no Brasil.
Muniz Sodré e Michel Maffesoli. / Foto: Lab Foto | Famecos
Foi nesse contexto de transformações que Michel Maffesoli iniciou sua conferência. Ele remeteu à palavra ‘Seminário’, lembrando que ela tem conexão com o verbo ‘semear’, no sentido de proporcionar sementes, ou seja, lançar ideias e reflexões que podem germinar e crescer ao longo do tempo. Para o autor, ao longo de sua carreira, sempre trabalhou nessa perspectiva de transformações, muitas vezes utilizando a expressão ‘transmutação epocal’, o que, no fundo, reflete uma constatação de bom senso que precisamos.
Maffesoli falou sobre uma ‘translação de império’, trazendo para o contexto dos estudos, quando uma civilização cede e, com isso, há sempre uma translação nos campos do conhecimento. Essa é a ideia central das teorias de Maffesoli, e é nesse sentido que ele se debruçou para tentar demonstrar essa translação.
Uma das contribuições de Michel Maffesoli é demonstrar que o termo pós-moderno não é um modismo, mas uma possibilidade de leitura capaz de nomear o mundo como ele é. Assim, seu estudo se constitui em uma significativa referência sociológica, tanto para aqueles que se alinham à sua perspectiva teórica, quanto para os que a contestam, argumentando que ainda estamos na modernidade. Além disso, influenciado por Gilbert Durand, Maffesoli se posiciona dentro da sociologia do imaginário, que não se limita a identificar os determinantes socioeconômicos dos comportamentos individuais, mas busca compreender a atmosfera de um tempo por meio das atividades simbólicas das sociedades humanas. Na perspectiva de uma fenomenologia compreensiva, seu interesse recai sobre o que cria o liame entre os seres humanos e o que os distingue.
Maffesoli comentou que se considera um reacionário, voltando à tradição imemorial da humanidade, aquilo que, de certa forma, constituiu a memória e que permite a permanência da existência humana. Ele relembra uma frase: ‘Aquilo que por toda parte e por todos sempre foi acreditado.’ Isso é a tradição. Do seu ponto de vista, precisamos saber pensar, o que não é uma tarefa fácil. Maffesoli também relembra as palavras de Hannah Arendt, que afirmou: ‘Não se trata de chorar nem de rir, mas de compreender.’
Foto: Lab Foto
Para ele, compreender significa tomar inteira responsabilidade pela existência humana, sendo que essa deveria ser também a atitude universitária: o julgamento, os juízos e as normas devem ser dos políticos e juízes, e não dos universitários. Isso é um pensamento compreensivo, demonstrando que esse pensamento foi o fio condutor de seu trabalho, uma sociologia filosofante, como define Maffesoli.
Como forma de homenagear os 80 anos do sociólogo francês, foi lançado o livro Dicionário Michel Maffesoli, organizado por pesquisadores de mais de 10 instituições, que escreveram verbetes sobre suas obras. Também foi lançado o Maffeso-filme, com o subtítulo Um Pequeno Ensaio sobre o Contemporâneo, um curta-metragem experimental criado com imagens e recursos de inteligência artificial, que interpreta visualmente ideias do sociólogo, e contou com o envolvimento de professores e pesquisadores.
Dando seguimento às celebrações, ocorreu a entrega de prêmios de teses e dissertações. Na categoria de teses, foi entregue o Prêmio Jorge Pedro de Sousa, para trabalhos sobre Jornalismo, mídias, organização e poder, que foi concedido a Rafael Ferreira Medeiros (UFSM); o Prêmio Michel Maffesoli, para trabalhos sobre imaginário social, cultura e tecnologias do imaginário, que foi concedido a Luana Chinazzo Müller (PUCRS); o Prêmio Muniz Sodré, para trabalhos sobre diversidade, políticas dos corpos e interseccionalidades, que foi concedido a Ângelo Jorge de Souza Lima Neckel (Unisinos). Na categoria de dissertações, o Prêmio Beatriz Rahde, para trabalhos sobre imaginário social, cultura e tecnologias do imaginário, foi concedido a Anna Claudia Bueno Fernandes (PUCRS); e o Prêmio Oliveira Silveira, para trabalhos sobre diversidade, políticas dos corpos e interseccionalidades, foi concedido a Márcio Telles de Souza Malta (UFT).
Após a entrega dos prêmios, houve uma homenagem à primeira coordenadora do PPGCom, a professora Dóris Fagundes Haussen, que, emocionada, destacou que o PPGCom faz parte de sua vida. Ela lembrou que o programa foi construído por um grupo de aventureiros que, naquele período, não contavam com pós-graduação no Rio Grande do Sul e havia poucos doutores. Ela ressaltou que, em busca de formação, esse grupo foi atrás de titulações para construir um projeto no qual acreditavam, com o objetivo de abrir esse espaço de pesquisa e conhecimento.
Dóris Fagundes Haussen, primeira coordenadora do PPGCom. / Foto: Lab Foto
A pesquisadora argentina Sandra Massoni, ao discutir a Teoria da Comunicação Estratégica Enactiva (CEE), propôs uma abordagem que busca transformar a comunicação em um processo dinâmico e adaptativo a um mundo fluído. Ao destacar a necessidade de interação ativa, Massoni sugere que a comunicação não se resume a uma simples troca de informações, mas é um meio estratégico para influenciar e alcançar objetivos, com base em uma constante adaptação ao contexto. Em uma reflexão mais ampla, ela faz uma analogia entre a comunicação e a água, um elemento fluido que percorre diferentes trajetórias, assim como as interações comunicativas se moldam e se adaptam continuamente a novos desafios.
A CEE é uma teoria da intersubjetividade não dualista que enfatiza o aspecto relacional, considerando o comunicacional em termos de tipos de encontro na diversidade. Trata-se de uma teoria geral, aplicável a diversos contextos, que propõe o encontro na diversidade como um objeto de estudo especificamente comunicacional.
A Investigação Enactiva em Comunicação (IEC), por sua vez, é um novo tipo de pesquisa, inter e transdisciplinar, que pode ser aplicada a qualquer área ou tema. Massoni argumenta que as abordagens tradicionais de pesquisa descritiva, explicativa e exploratória, comumente usadas nas ciências sociais, não atendem aos requisitos da comunicação como disciplina científica, e por isso propõe a IEC como um modelo de pesquisa epistemologicamente mais pertinente ao objeto de estudo da comunicação.
Sandra Massoni. / Foto: Lab Foto
Cerca de 400 resumos de artigos científicos foram inscritos no Seicom. A apresentação dos trabalhos aceitos ocorreu em 12 GTs, nos dias 27 e 28 de novembro. Entre os temas dos GTs, estão: Comunicação Política; Comunicação Organizacional, Cultura do Cuidado, Gestão de Riscos e Crises; Comunicação, Jornalismo e Desinformação; Estudos da Imagem na TV e outras telas; Manifestações Visuais Contemporâneas; Publicidade e Propaganda; Sociologia da Imagem e Imaginários; Diversidade, Raça e Gênero na Comunicação; Comunicação e Emergências Climáticas; Comunicação Digital; Estudos Interdisciplinares em Indústria Criativa e Manifestações Visuais Contemporâneas.
O evento foi coordenado pela professora Drª Cleusa Maria Andrade Scroferneker, com a colaboração da comissão organizadora composta pelos professores Juremir Machado da Silva, André Pase, Roberto Tiezmann e pela pós-doutoranda Larissa Fraga. O XVI Seminário Internacional da Comunicação de 2024, que celebra as homenagens, comemorações, coletividade e afeto, além de promover ciência e pesquisa, foi encerrado com uma fala de Cleusa, que expressou sua gratidão a todos os participantes que tornaram o evento possível, ressaltando o trabalho coletivo. “O evento não está sozinho, o evento é um fruto coletivo. O principal laço que nos uniu foi o afeto”, finalizou.