Comum a todos os estudantes, a trajetória acadêmica pode ter muitos desafios. Desde a organização do tempo, o nervosismo durante as avaliações, prazos de entrega de trabalhos até a chegada do grande dia, a formatura, tudo exige foco e superação. Para os formandos do curso de bacharelado em Educação Física, essa jornada se encerra nesse sábado, 4 de agosto, dando início a um novo capítulo de suas vidas. Dentre eles, está Aline Colares, para quem o diploma é um sonho realizado, através de muita determinação e perseverança. Aline nasceu com síndrome de Down, ou trissonomia do cromossomo 21, condição genética em que a pessoa nasce com 47 cromossomos em suas células em vez de 46, como a maior parte da população.
A futura educadora física ingressou no curso em 2 de março de 2009, dia em que completava 20 anos, dando início à realização de um sonho de infância. “Quando eu era pequena, na época da escola, já dizia que iria fazer Educação Física. E aí que começou a paixão”, conta Aline. A prática de atividades físicas sempre fez parte de sua rotina, que desde muito nova frequentava as aulas de natação, sua atividade predileta. Frente aos desafios da Graduação, foi esse sonho que a motivou perseverar. No Brasil, de acordo com dados divulgados pela ONG Movimento Down, pouco mais de 50 pessoas com síndrome de Down ingressaram no Ensino Superior, uma quantia aparentemente tímida, mas que se destaca entre os países da América Latina.
Superando a timidez
As famosas cadeiras de Fisiologia e Anatomia não foram os únicos desafios. Vencer a timidez e o nervosismo perante as avaliações demandaram também muito esforço, ela conta, mas com o apoio da família, da Instituição, dos professores e dos colegas, nada foi impossível para Aline. “Vencer a timidez foi muito difícil, mas valeu muito a pena para mim”, ela garante. A coordenadora do curso de licenciatura em Educação Física, Vera Lúcia Brauner, explica que logo quando a estudante se inscreveu, foi encaminhada para o Centro de Atenção Psicossocial (CAP) da Universidade, para ser auxiliada a superar as dificuldades do processo de ensino-aprendizagem.
Os acompanhamentos eram feitos uma vez por mês, na maior parte do tempo com o psicopedagogo Rafael Maihub. “A Aline ingressou bem cedo na Universidade, e, assim como muitos alunos, recebeu auxílio para prosseguir no curso de forma saudável. O acompanhamento do CAP foi justamente o que possibilitou pontuar algumas questões que poderiam estar dificultando a aprendizagem”, explica Mauihub. Além disso, todo início de semestre era feito um aconselhamento por parte da coordenação na escolha das disciplinas, para que a grade ficasse adequada às necessidades específicas da estudante.
Parceria dos colegas
A relação com os colegas também sempre foi de muito acolhimento. A professora Vera relata que alguns amigos dedicaram tempo especial para estudar com Aline durante os finais de semana, e que a coordenação sempre buscou estimular essas atitudes. E, como lembra o também formando em Educação Física, Mateus Rinco, esse foi um aprendizado de mão dupla. “A Aline nos ajudou muito também. Mostrou para nós, que não havíamos tido contato com outras pessoas com síndrome de Down, que não há um limite ou um porquê para duvidar das condições delas”, afirma Rinco. A futura profissional conta que durante uma aula ministrada por Brauner, em que abordavam questões de preconceito e convivência, decidiu relatar um caso que enfrentou na infância de um colega que a ofendia verbalmente. “Achei importante contar para a Vera e meus colegas o que vivi. Mas aqui, isso nunca aconteceu”, afirma.
Rinco também lembra que durante o período de estágio que cursaram juntos na piscina do Parque Esportivo, a colega era muito empenhada nos estudos, sempre buscando se aperfeiçoar. Aline foi monitora da professora de natação Alessandra Scarton por dois semestres. Na disciplina de Estágio em Treinamento e Formação Esportiva, sob a supervisão do professor Rodrigo Sartori, acompanhou as aulas de Deep Water e Condicionamento, ambas direcionadas para idosos. Na cadeira de Estágio em Saúde, voltada para esse mesmo público, acompanhou as aulas de atividades físicas, como dança e ginástica. Dessa experiência, surgiu o tema do seu trabalho de conclusão de curso, Atividade física na 3ª idade: aspectos motivacionais, que recebeu da banca avaliadora a nota 8,9. “Ela foi vencedora por mérito próprio. Tem frequência próxima a 100%. Além disso, foi muito disciplinada na entrega de trabalhos e prazos”, afirma a professora Vera.
Apoio da família
Os pais, Antônio e Iara Colares, também destacam a força de vontade da filha, que mesmo diante dos desafios da graduação nunca desistiu. “A conquista é dela, mas o aprendizado que os filhos nos proporcionam é muito importante. Devemos ser parceiros, ter todo esse envolvimento com a trajetória de vida. Só não podemos atrapalhar a vida dos nossos filhos”, recomenda Colares.
Aline já está atuando em sua área, na Escola Rainha do Brasil, onde cursou o Ensino Fundamental e Médio. Toda quinta-feira à tarde, ela auxilia nas aulas de Educação Física com alunos de 4 a 6 anos, mas seus planos profissionais não terminam por aí. A jovem educadora física ainda quer trilhar seu caminho nas modalidades que mais gosta, na natação e em academias, e, principalmente, com crianças. Mas, neste momento em especial, a sensação com a chegada do dia da formatura é de alívio e dever cumprido.