Nova pesquisa do PUCRS Data Social aponta os afazeres domésticos como principal motivo de afastamento das mulheres do mercado de trabalho/ Foto: Envato

A mais recente análise do PUCRS Data Social: Laboratório de Desigualdades, Pobreza e Mercado de Trabalho, intitulada Levantamento Sobre Gênero, Trabalho e Parentalidade no Rio Grande do Sul, aponta que, no Rio Grande do Sul, 19,7% das mulheres em relações conjugais com idade entre 25 e 50 anos estão fora do mercado de trabalho, sendo que 13,4% se afastam em função da demanda de tarefas domésticas, como cuidar dos filhos, de outros dependentes ou dos afazeres domésticos. Ou seja, o motivo que faz 68,3% das mulheres estarem fora do mercado é o trabalho doméstico. Entre os homens no mesmo recorte, por sua vez, apenas 2,6% não participam do mercado de trabalho, sendo que somente 0,3% se afastam em função de tarefas domésticas.  

Tamanha diferença se torna ainda mais marcante quando olhamos apenas para famílias com filhos. Entre as famílias gaúchas com filhos de até seis anos, 25,9% das mulheres, chefes de família ou cônjuges, estão fora do mercado de trabalho. Entre os homens, somente 1,6%. E mesmo analisando somente famílias cujos filhos têm entre seis e quinze anos – ou seja, em uma faixa etária mais elevada –, a diferença é significativa: enquanto apenas 4,2% dos homens não participam do mercado de trabalho, entre as mulheres essa proporção chega a 18,5%. 

A fonte de dados é da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio Contínua, em sua versão trimestral. O recorte utilizado inclui pessoas de referência no domicílio e cônjuges, em relações heterossexuais, com idade entre 25 e 50 anos, no 4º trimestre de cada ano estudado.  

“Os resultados expressam, primeiro, a marcante divisão do trabalho doméstico, em especial no que se refere ao cuidado com os filhos, pelo qual as mulheres são tidas como responsáveis. E, em segundo, o resultado substantivo disso na redução da participação dessas mulheres no mercado de trabalho”, diz o professor Andre Salata, coordenador do PUCRS Data Social e um dos autores do estudo. 

Essas constatações ficam muito evidentes quando se compara a participação de homens e mulheres no mercado de trabalho, de acordo com o número de filhos. Entre os casais sem filhos, 2,3% dos homens estão fora do mercado de trabalho, e 14,8% das mulheres. Quando consideramos apenas casais com um filho, 3% dos homens não trabalham nem procuram emprego, contra 18,9% das mulheres. Quanto a casais com três ou mais filhos, 36,6% das mulheres e somente 4,8% dos homens estão fora do mercado de trabalho.  

Mulheres negras sofrem ainda mais desvantagens no âmbito do trabalho do que as mulheres brancas/ Foto: Envato

“Os dados mostram que, em relação às mulheres, há um claro aumento na proporção daquelas que estão fora do mercado entre famílias com mais filhos. O mesmo, no entanto, não ocorre entre os homens, cuja participação pouco varia em função do número de filhos. Isso é, em alguma medida, resultado da ideia de que cabe mais às mulheres do que aos homens cuidar dos filhos”, diz a professora Izete Pengo Bagolin, pesquisadora do PUCRS Data Social. 

O levantamento traz ainda dados sobre desigualdades raciais, e mostra que mulheres gaúchas negras parecem sofrer mais desvantagens que as brancas nesse âmbito. Entre as mulheres brancas, 12,8% estão fora do mercado de trabalho por motivos domésticos. Já entre as negras, a proporção era de 16,8% no quarto trimestre de 2023. Além disso, os dados evidenciam que, independentemente no número de filhos ou da idade deles, a taxa de mulheres negras fora do mercado de trabalho é sempre maior que a de mulheres brancas.  

Segundo Ely José de Mattos, pesquisador do PUCRS Data Social, mulheres negras estão sobrerepresentadas nos estratos mais baixos da população. “Em virtude disso, estamos falando de famílias com menos recursos para pagar babás ecreches. Ou seja, é esperado que entre mulheres negras o fardo do trabalho doméstico seja ainda maior, conforme mostram os dados”, pontua. 

Por fim, o estudo traz uma comparação entre as unidades da federação. Apesar dos preocupantes dados acima mencionados, o Rio Grande do Sul possui a menor taxa de mulheres fora do mercado de trabalho (13,4%). No Acre, estado com a maior taxa, a proporção chega a 38,1%. Em São Paulo está em 17,2%, e no Rio de Janeiro em 20,8%. 

“Essas proporções estão correlacionadas com o nível socioeconômico das unidades da federação. Em estados mais ricos, as famílias têm mais recursos para pagar pelo trabalho doméstico, fazendo a pressão sobre as mulheres cair um pouco. Mesmo assim, os dados continuam preocupantes, como no caso do Rio Grande do Sul”, conclui Salata.

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André Salata/ Foto: Giordano Toldo

Em 2022, a população com seis anos ou mais no Rio Grande do Sul enfrentava uma taxa de pobreza de 15,9%. Para as crianças de até seis anos, no entanto, esta taxa era praticamente o dobro, alcançando 30,2%. No caso da pobreza extrema, para aqueles acima de seis anos a taxa era de 2,5%, enquanto para as crianças até essa idade o patamar ficava em 4,7%. Em termos absolutos, em 2022, havia 244 mil crianças pobres e 37,9 mil em extrema pobreza. Segundo André Salata, professor da Escola de Humanidades da PUCRS, “as taxas de pobreza maiores para as crianças até seis anos, em comparação com a população total acima desta faixa etária, se explicam, em grande parte, pela maior concentração de crianças em domicílios com renda mais baixa.” 

Estes números fazem parte do relatório Pobreza infantil no Rio Grande do Sul entre 2012 e 2022”, lançado pelo PUCRS Data Social: Laboratório de desigualdades, pobreza e mercado de trabalho. Os dados são provenientes da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (PNADc), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo trabalha com as linhas de US$6,85 PPC para pobreza e US$2,15 PPC para a extrema pobreza, assim como definidas pelo Banco Mundial. Em valores mensais de 2022, a linha de pobreza é de aproximadamente R$6,36 per capita e a linha de extrema pobreza é de aproximadamente R$ 199 per capita. Crianças que vivem em domicílios com renda per capita abaixo desses valores estão em situação de pobreza e/ou de pobreza extrema.  

O professor Ely Jose de Mattos, pesquisador do laboratório, afirma que “a pobreza infantil é particularmente preocupante, pois sabe-se que privações de condições básicas nesta fase da vida tem repercussões permanentes na fase adulta”. Já a pesquisadora Izete Pengo Bagolin destaca que “crianças que vivem em famílias em situação de pobreza monetária, em geral também estão expostas a outros tipos de privações tais como moradias precárias, nutrição inadequada e condições educacionais insuficientes.” 

Ainda que as taxas de pobreza e pobreza extrema sejam preocupantes de um modo geral, a situação é ainda pior para determinados segmentos demográficos. Entre as crianças negras, por exemplo, a taxa de pobreza é o dobro daquela entre as crianças brancas – 50,5% contra 25,6%. Já sobre localização de moradia, a pobreza infantil em áreas rurais é maior (35%) contra 29,5% no ambiente urbano. 

Estrutura familiar e escolaridade dos pais ou responsáveis são fatores determinantes na situação socioeconômica das crianças/ Foto: Envato

Os programas de transferência de renda, neste contexto, desempenham importante papel na minimização desta situação. Em 2020, ano crítico da pandemia, a taxa de pobreza entre crianças no RS foi de 31,6%; sem os auxílios, poderia ter chegado a 38,3%. No caso da pobreza extrema, para o mesmo ano, registrou-se a marca de 5,4%; sem os auxílios poderia ter sido quase o dobro (10,6%). Além das taxas de incidência, os auxílios também se mostraram relevantes para amenizar a profundidade da pobreza – entendida como a distância entre a renda dos indivíduos e a linha de pobreza utilizada. 

O estudo também mostra que as crianças em situação de pobreza sofrem desvantagens em outras dimensões além da monetária. Em termos de estrutura familiar, por exemplo, as crianças pobres apresentam maior tendência a viver em famílias monoparentais: 29,3% entre as crianças pobres, contra 16,7% para o total de crianças no estado. Quanto à escolaridade dos pais ou responsáveis, fica evidente seu menor nível educacional no caso das crianças pobres. Entre as crianças abaixo da linha de pobreza, 48,9% dos responsáveis tinham apenas ensino fundamental, enquanto para o total de crianças do Rio Grande do Sul esse número era de 32,7%. O estudo identifica, ainda, que as crianças pobres tendem a frequentar menos a creche/escola: 45,7% o faziam, contra 57,7% para o total de crianças do estado. Finalmente, do ponto de vista de moradia, o estudo mostra que crianças em situação de pobreza tendem a morar em domicílios com adensamento excessivo: 48,9% entre as crianças pobres, contra 33,2% no total das crianças do RS. 

Segundo os pesquisadores, estes são fatores que afetam não somente a qualidade de vida destas crianças no presente, mas também suas oportunidades no futuro. André Salata, que também coordena o PUCRS Data Social, pontua: 

“É importante compreender que a pobreza não indica somente uma privação monetária. Em função das condições de vida mais duras, famílias pobres têm dificuldades para garantir os estímulos necessários ao bom desenvolvimento de capacidades cognitivas e não cognitivas para seus filhos, com prejuízos que se dão no presente, mas que também serão sentidos no futuro dessas crianças”.  

Tomás Fiori, professor da Escola de Negócios da PUCRS e um dos autores do estudo, destaca o papel do governo estadual no combate à pobreza infantil: 

O Rio Grande do Sul já foi pioneiro quando lançou o Programa Primeira Infância Melhor (PIM) há 21 anos e hoje está construindo o Plano Estadual que norteará o cuidado integral das crianças até 2034. A compreensão da incidência e profundidade da pobreza nessa fase da vida é crucial, assim como a contribuição da comunidade acadêmica em estudos como o que o PUCRS Data Social está oferecendo à sociedade.” 

pobreza socialO Laboratório de Desigualdades, Pobreza e Mercado de Trabalho (PUCRS Data Social) completou seu primeiro ano de atuação em 2023 com dez estudos publicados. O laboratório de pesquisa, vinculado à Escola de Negócios, é formado pelos professores que também fazem parte do Programa de Pós-Graduação em Economia do Desenvolvimento da PUCRS, André Salata, Ely Mattos e Izete Bagolin. O objetivo do PUCRS Data Social é pesquisar sobre temas relacionados à desigualdade, pobreza e mercado de trabalho. 

Os pesquisadores trabalham em estudos e relatórios, baseados em dados públicos oficiais, produzindo análises acessíveis que contribuam para o debate público sobre estes temas. Para o professor André Salata, coordenador do PUCRS Data Social, a principal conquista neste primeiro ano de atuação está no alcance conquistado, por meio da grande mídia. Foram centenas de inserções na TV, mídia impressa, web e rádio, alcançando um público de mais de 86 milhões de pessoas. 

A estrutura foi inserida na Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL), sendo o único núcleo brasileiro da rede. Além disso, uma parceria com o Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) está sendo firmada para a realização de alguns estudos.  

“Conseguimos atingir um público para muito além da academia, sem abrir mão de rigor científico nas nossas análises. Como resultado, fomos procurados por instituições públicas e atores políticos, interessados em utilizar nossos dados e análises visando um debate público mais bem informado e/ou como subsídio para a formulação e avaliação de políticas públicas”, comenta Salata. 

Para os próximos anos, o coordenador do projeto espera que o PUCRS Data Social continue com seu objetivo principal de gerar relatórios técnicos, com linguagem acessível, e que causem grande impacto no debate público. No próximo ano, o laboratório já está com três relatórios previstos:  

  1. Pobreza infantil no Rio Grande do Sul;  
  2. Vulnerabilidade social na região amazônica; 
  3. Desigualdade nas metrópoles brasileiras.  

Confira as pesquisas já divulgadas: 

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Em relação ao ano passado, o Brasil metropolitano se tornou mais desigual. / Foto: Giordano Toldo

Após se recuperar do pico ocorrido durante a pandemia de Covid-19, a desigualdade de renda voltou a apresentar tendência de alta ao longo dos últimos cinco trimestres no conjunto das metrópoles brasileiras. O coeficiente de Gini (quanto mais alto o seu valor maior a desigualdade) subiu de 0,615 para 0,626 entre o segundo trimestre de 2022 e o mesmo trimestre de 2023. E a razão entre a média de renda dos 10% mais ricos em relação aos 40% mais pobres variou de 29,7 para 32 vezes no mesmo período. Ou seja, do ponto de vista da renda do trabalho, o Brasil metropolitano de hoje é mais desigual do que aquele de um ano atrás.    

Estas e outras informações estão na décima quarta edição do “Boletim – Desigualdade nas Metrópoles”, produzido em parceria pelo PUCRS Data Social, o Observatório das Metrópoles e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). Os dados são provenientes da PNAD Contínua trimestral, do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho somente, incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, conforme as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o segundo trimestre de 2023, de acordo com o IPCA.  

Os dados levantados pelo estudo mostram que enquanto no último ano a média de renda dos 10% mais ricos subiu 9,9%, a dos 40% mais pobres variou apenas 1,9% para cima. Essa diferença na recuperação dos rendimentos, segundo os pesquisadores, explica a tendência de alta das desigualdades.

“Após a enorme queda sofrida durante a pandemia, a renda dos mais pobres se recuperou até meados de 2022, retornando a um patamar semelhante ao de 2019. Desde então, no entanto, a tendência tem sido de estagnação. Já no caso dos mais ricos a queda da renda foi menos brusca durante a pandemia, e sua recuperação ainda está em andamento”, explica Andre Salata, coordenador do PUCRS Data Social.

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Embora as metrópoles apresentem comportamentos diferentes, na maior parte delas (17 dentre as 22) se verificou o mesmo padrão de crescimento da desigualdade ao longo do último ano. Esse crescimento foi superior a 5% nas Regiões Metropolitanas de Vale do Rio Cuiabá (12,1%), Grande São Luís (8%), Teresina (7,4%), Belo Horizonte (5,7%) e Fortaleza (5,4%).  

desigualdade nas metrópoles

Andre Salata é coordenador do PUCRS Data Social. / Foto: Giordano Toldo

O estudo também mostra que a média geral de rendimentos aumentou de R$1.577 para R$1.701 no último ano, configurando uma elevação de 7.88%. Em 19 das 22 metrópoles, também foi constatada uma variação positiva. O aumento foi mais elevado nas Regiões Metropolitanas de Goiânia (25,6%), Teresina (23,2%), Belo Horizonte (17,7%), Recife (16,8%) e Macapá (15,8%). De acordo com Marcelo Ribeiro, professor do IPPUR-UFRJ e pesquisador do Observatório das Metrópoles, o aumento do rendimento médio no conjunto das metrópoles é resultado de um período mais expansivo do mercado de trabalho, tendo em vista a redução da taxa de desocupação ocorrida nos últimos trimestres.

“Apesar disso, continua havendo diferenças de rendimento médio muito expressivas entre as metrópoles. Em geral, aquelas que possuem rendimento médio acima do rendimento médio do conjunto das regiões metropolitanas se localizam nas grandes regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Todas as metrópoles localizadas nas regiões Norte e Nordeste apresentam rendimento médio inferior ao rendimento médio do conjunto das regiões metropolitanas. Isso expressa que as desigualdades de renda entre as metrópoles também se apresentam como diferenças regionais do país”. 

O cenário descrito pelos dados levantados no estudo, portanto, é de aumento da média de renda do trabalho ao longo do último ano, mas com crescimento proporcionalmente maior para os estratos mais altos, levando ao aumento das desigualdades no período. Andre Salata explica esse cenário.

“Enquanto alguns estratos mais baixos chegaram a ter queda de 3,6% na média de renda, camadas mais altas ganharam quase 10%. Ou seja, não é nem mesmo um cenário onde todos ganham, mas os que estão em cima ganham mais. Na verdade, na parte de baixo da pirâmide chegamos a ter mesmo perdas reais”.

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Em dez anos, o número de pessoas idosas em situação de pobreza cresceu em mais de 800 mil. / Foto: Pexels

A nova pesquisa do Laboratório de Desigualdades, Pobreza e Mercado de trabalho – PUCRS Data Social mostrou que a população idosa do Brasil vem aumentando exponencialmente nos últimos anos e, acompanhado desse movimento, o número de idosos que vivem abaixo da linha da pobreza também cresceu. Em uma década, o percentual de idosos passou de 7,72% (2012) para 10,49% (2022), o que em termos absolutos significa um aumento de 15,2 milhões para 22,4 milhões de pessoas com idade superior a 65 anos. A mudança também pode ser percebida na composição etária da pobreza no Brasil: se em 2012 2,9% da população em situação de pobreza era composta por idosos, em 2022 esse percentual subiu para 4,2%, o que significa um aumento de 2 milhões para 2,8 milhões de idosos. No que se refere à população extremamente pobre, o percentual subiu de 1,4% para 3,1%, o que representa um aumento de 216 mil idosos em situação de extrema pobreza em uma década.    

A pesquisa foi realizada utilizando os dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílios Contínua (PNADc), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo trabalha com as linhas de US$6,85 PPC/dia para pobreza e US$2,15 PPC/dia para a extrema pobreza, assim como definidas pelo Banco Mundial. Em valores mensais de 2022, a linha de pobreza é de aproximadamente R$636,52 per capita/mês e a linha de extrema pobreza é de aproximadamente R$199,78 per capita/mês. Idosos que vivem em domicílios com renda per capita abaixo desses valores estão em situação de pobreza e/ou de pobreza extrema.  

O recorte utilizado no estudo abrange pessoas com 65 anos ou mais de idade, sendo este valor baseado nos critérios de aposentadoria (INSS) e do acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC).   

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“Os dados refletem o processo de transição demográfica pelo qual o país vem passando; e, diante dele, novos desafios irão surgir, como o envelhecimento da pobreza, que num futuro não tão distante irá demandar ajustes nas políticas sociais”, explica o professor e Coordenador do PUCRS Data Social, Andre Salata 

Assim como é no cenário nacional, a população gaúcha em situação de pobreza aumentou na última década. / Foto: Pexels

O estudo também analisa a composição da renda dos idosos. Entre jovens e adultos, a maior parte da renda tem como fonte o mercado de trabalho. Já entre os idosos, os rendimentos do INSS assumem protagonismo, de modo que em sua ausência a renda deles sofreria uma queda de 59,8%. Sem o INSS, a taxa de pobreza entre os idosos aumentaria 53,4 pontos percentuais, e a extrema pobreza subiria 44 pontos percentuais. Nesse aspecto, a situação dos idosos destoa bastante daquela encontrada entre jovens e adultos, tanto para a pobreza quanto para a extrema pobreza.  

“O envelhecimento da pobreza também aumentará a importância e a necessidade de atenção às redes de proteção aos idosos, pois estes dependem prioritariamente dos recursos provenientes da aposentadoria ou do benefício de prestação continuada. Em função disso, além de garantir o acesso a esses benefícios, será necessário garantir, também, que os valores a serem pagos sejam capazes de viabilizar uma vida digna para um maior contingente de idosos”, esclarece uma das autoras do PUCRS Data Social, professora Izete Bagolin. 

Cenário brasileiro se repete no Rio Grande do Sul 

A pesquisa também observou que à composição etária da pobreza no Rio Grande do Sul tem um movimento similar ao ocorrido no país ao longo dos últimos anos. Em 2012, 2,6% da população em situação de pobreza no RS era composta por idosos. Dez anos depois, em 2022, esse percentual subiu para 4,5%. Em termos absolutos, isso significa que o número de idosos em situação de pobreza chegou a 87,3 mil no ano passado no Estado. Já em relação à extrema pobreza, a participação dos idosos cresceu de 3,6% para 5% nos últimos 10 anos, fazendo o número de idosos gaúchos em situação de extrema pobreza chegar a 15,3 mil.  

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Além disso, o estudo também destaca a evolução das taxas de pobreza e de extrema pobreza entre os idosos no RS ao longo da última década. É possível perceber que, durante a pandemia, o percentual de idosos gaúchos em situação de pobreza aumentou significativamente, chegando ao patamar de 6,9% em 2021. Apesar da queda em 2022, quando a taxa caiu para 5,7%, o recuo não foi suficiente para colocá-la no mesmo patamar que encontrávamos antes da pandemia.  

Confira o estudo completo

No auge da pandemia de Covid 19 no país a taxa de pobreza social chegou ao seu maior valor da série histórica, iniciada em 2012: 30,4% dos brasileiros, ou 64,6 milhões de pessoas, estavam abaixo da linha de pobreza social em 2021. Em 2019, último ano antes da pandemia, essa taxa era de 26,3%, o que representava 55 milhões de pessoas. Ou seja, entre 2019 e 2021 houve um crescimento de 4,1 pontos percentuais na taxa de pobreza social, o que significa que 9,6 milhões de brasileiros caíram para baixo da linha de pobreza social ao longo período no Brasil.

As informações estão no relatório “Pobreza Social no Brasil: 2012-2021”, produzido por pesquisadores do PUCRS Data Social: Laboratório de desigualdades, pobreza e mercado de trabalho. A fonte de dados é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADc), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para o cálculo da linha de pobreza é utilizada a renda domiciliar per capita, incluindo os rendimentos provenientes do trabalho (formal ou informal) e, também, de outras fontes (seguro-desemprego, aposentadorias, programas de transferência de renda etc.).

Em relação a estudos anteriores sobre o tema, o levantamento inova ao adotar uma medida de pobreza que, baseada em relatórios do Banco Mundial, reflete tanto a dimensão absoluta quanto a dimensão relativa da pobreza. Todos os indivíduos abaixo da linha de extrema pobreza (R$182 per capita, a preços de 2021) são automaticamente considerados em situação de pobreza social. Mas, além destes, também são considerados pobres aqueles com renda abaixo da metade do valor da mediana da distribuição de renda em um dado ano. Desse modo, segundo Izete Bagolin, professora da Escola de Negócios e pesquisadora do PUCRS Data Social, “é uma medida que busca atender ao mesmo tempo a preocupação com as necessidades mínimas, essenciais a sobrevivência física e, também, com a desigualdade e o aumento das necessidades humanas decorrentes do crescimento econômico e complexificação do estilo de vida da sociedade.”

A adoção de uma medida como esta é especialmente importante nas regiões e unidades da federação mais desenvolvidas do País, como é o caso de São Paulo (SP), por exemplo. A linha de pobreza absoluta mais tradicionalmente usada teria o valor R$582,47 per capita (a preços de 2021), o que significaria uma taxa de pobreza bem menor, de 23,7%, ou 11 milhões de pessoas nessa condição no estado de São Paulo. No entanto, a linha de pobreza social adotada neste estudo assume o valor de R$647,8 em 2021 em São Paulo, o que significa que nesse caso ela é mais criteriosa que as medidas normalmente utilizadas. Como consequência, a taxa estimada de pobreza social no estado é maior, ficando em 27,3%, ou 12,7 milhões de paulistas.

Segundo Andre Salata, professor da Escola de Humanidades e um dos coordenadores do PUCRS Data Social, isso acontece porque a medida utilizada considera como estando em situação de pobreza não somente aqueles com renda abaixo de um valor definido a priori, mas também aqueles cujo poder de consumo está muito abaixo do morador mediano de determinada região em um dado período. “Nesse sentido, é uma taxa de pobreza social, que leva em conta também as desigualdades“, ressalta.

De acordo com os dados levantados, os grupos mais atingidos no País pelo aumento da pobreza social foram os negros e moradores das regiões norte e nordeste.  Enquanto entre os brancos, em 2021, a taxa de pobreza social era de 19,4%, entre os negros ficava em 38,9%. Em relação às regiões geográficas, em 2021 a taxa de pobreza social era de 36,4% na região Nordeste, 33,9% na região Norte, 29% na região Sudeste, 28,4% na região Centro-Oeste, e 24% na região Sul. Ely Mattos, que também coordena o laboratório da PUCRS destaca: “O Brasil é um país em que as desigualdades são marcadas por disparidades não apenas funcionais ou educacionais, mas também regionais e de raça, o que torna o fenômeno ainda mais complexo para ser enfrentado”.

O estudo também mostra que em todas as regiões, assim como ocorreu para o País como um todo, houve forte aumento da pobreza entre 2019 e 2021. Mas que a tendência de elevação da pobreza social vinha se apresentando desde o ano de 2014. Se, naquele ano, o Brasil chegou ao menor valor da série histórica, com 24,9%, em 2016 a taxa de pobreza social já chega a 27,8%. O professor André Salata explica a partir de 2014 o País entrou em um ciclo de crise econômica, aumento do desprego e enfraquecimento das políticas sociais. O resultado é uma tendência de elevação da pobreza social, que se acentua com a pandemia.

O estudo traz informações de que a pobreza social não apenas está aumentando, como vem também se tornando mais grave. Entre 2019 e 2021 o chamado hiato da pobreza, que representa o valor médio da distância entre a renda dos pobres e a linha de pobreza, subiu de R$60,5 para R$71,3. Em 2014, por sua vez, essa cifra era de R$50,8. Ou seja, os pobres ficaram ainda mais pobres no período. E, como consequência tanto do aumento da pobreza quanto da sua gravidade, o custo hipoteticamente necessário para tirar as pessoas da pobreza social aumentou. Em 2014 seriam necessários 2,5 bilhões de reais por mês (a preços de 2021). Já em 2021, a estimativa é que seria preciso 4,6 bilhões de reais mensais.

Acesse o site do PUCRS Data Social e baixe o documento completo.

Fonte: PUCRS Data Social

Foi divulgada na última quarta-feira, 7 de dezembro, a nona edição do Índice de Desenvolvimento Estadual – Rio Grande do Sul (iRS), estudo realizado pelo PUCRS Data Social – Laboratório de Desigualdades, Pobreza e Mercado de Trabalho em parceria com o jornal Zero Hora. A pesquisa, que avalia a qualidade de vida nos estados brasileiros por meio dos critérios de padrão de vida, educação e longevidade e segurança, traz os dados de 2020 – esta é primeira edição do levantamento com dados registrados durante a pandemia da Covid-19. 

Coordenador da pesquisa e professor da Escola de Negócios da PUCRS, Ely José de Mattos, destaca que as consequências da pandemia se mostraram nos dados: 

“O impacto aparece de forma bastante clara na dimensão de padrão de vida, que trata de renda e mercado de trabalho. Verificamos uma situação de redução significativa da renda média e também da ocupação. Além disso, a desigualdade da renda do trabalho também se agravou”, avalia.

O iRS varia de zero a um, nos mesmos moldes do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Quanto mais próximo de um, melhor o desempenho de cada região. O Rio Grande do Sul manteve a quinta posição no indicador geral retomada no ano passado – no entanto, o desempenho do Estado teve uma queda de 0,661 para 0,652. Já a média nacional passou de 0,625 para 0,604.  

Rio Grande do Sul mantém posições nos rankings gerais 

Mantendo o quinto lugar, o Estado gaúcho é precedido no ranking geral pelos estados do Paraná (quarto lugar), Santa Catarina (terceiro lugar), São Paulo (segundo lugar) e Distrito Federal (primeiro lugar). Dentre eles, o Distrito Federal foi o único que apresentou crescimento. Os demais estados caíram no desempenho – embora o Rio Grande do Sul tenha apresentado uma queda relativamente menor do que eles. 

Comparando o Estado apenas com seus vizinhos da região Sul, Paraná e Santa Catarina, o Rio Grande do Sul conseguiu diminuir a distância em relação a ambos. No entanto, segue sendo o estado com o pior desempenho na região Sul – o último entre os três no ranking nacional, sendo precedido por seus vizinhos. 

Estado oscila entre quedas e crescimentos nos critérios principais 

Fonte: PUCRS Data Social

Acompanhando a tendência do restante do Brasil, o Rio Grande do Sul registrou sua terceira queda consecutiva desde 2018 no critério de padrão de vida. Apesar disso, ainda registrou desempenho superior à média nacional.  

Na dimensão da educação, apesar de ter melhorado em relação ao último índice, o Estado segue na 12ª posição no ranking nacional e seu desempenho ainda é ligeiramente inferior à média nacional.  

Já em longevidade e segurança, o panorama é mais positivo: o Rio Grande do Sul apresenta desempenho significativamente superior à média nacional. Além disso, vem registrando um crescimento constante desde 2018.  

Segundo o coordenador da pesquisa, há uma explicação as oscilações de posição do Estado em cada um dos critérios principais.  

“Na dimensão padrão de vida, o Rio Grande do Sul seguiu o comportamento médio do país, registrando queda na renda média e aumento da desigualdade. Na educação, o Estado melhorou, em especial por um aumento nas matrículas do ensino médio – impacto relativamente pequeno, mas relevante. Já sobre a dimensão longevidade e segurança, observamos uma melhoria nas taxas de homicídios e mortes no trânsito, além de uma diminuição da mortalidade infantil. Isso se explica por um conjunto de fatores, entre eles a própria restrição de mobilidade em função da pandemia e políticas de segurança pública articuladas no Estado”, comenta. 

Fazendo um balanço do levantamento, Mattos observa que 2020 foi um ano de retração média na qualidade de vida de modo geral. Apesar disso, ao observar essas dimensões, houve um ônus para a população. “Se por um lado a renda prejudicou a qualidade de vida, por outro estivemos em um cenário com um pouco menos de violência letal”, diz o professor. 

Conheça o PUCRS Data Social 

O laboratório reúne pesquisadores/as das áreas de Economia e Sociologia da PUCRS, focado em temas relacionados à desigualdade, pobreza e mercado de trabalho. O PUCRS Data Social elabora estudos e relatórios sobre esses temas, baseados em dados públicos oficiais, além de análises acessíveis que contribuam para o debate público acerca desses assuntos. 

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Gráfico retirado do Boletim Desigualdade Racial no Rio Grande do Sul

Em 2021, a taxa de pobreza entre os negros – categoria que agrega os indivíduos autoidentificados como pretos e partos – no estado do Rio Grande do Sul era de 19,5%, e a extrema pobreza era de 4,3%. Entre os brancos, essas taxas ficavam em 10,8% e 2,2%, respectivamente. Ou seja, a probabilidade de uma pessoa negra estar abaixo da linha de pobreza e/ou extrema pobreza era quase o dobro daquela calculada para as pessoas brancas no estado, refletindo a grande concentração dos negros na base da pirâmide social 

Neste ano, no Estado, 18,9% da população, ou 2,1 milhões de pessoas, era constituída por pretos e pardos. Entre os 20% mais pobres, no entanto, este grupo responde por 28,3% das pessoas, estando representado entre os estratos sociais mais baixos. Por outro lado, quando olhamos para o topo da pirâmide social, o que vemos é uma sub-representação da população negra. Entre os 15% mais ricos, somente 9,7% são negros, e entre os 5% mais abastados apenas 5,5% são pretos ou pardos.       

Estes e outros dados sobre o tema estão reunidos no Levantamento Sobre Desigualdade Racial no Rio Grande do Sul, produzido pelo PUCRS Data Social, da Pontifícia Universidade católica do Rio Grande do Sul. A fonte das informações é a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).  

Segundo um dos coordenadores do PUCRS Data Social, professor Andre Salata, os dados chamam atenção para as enormes barreiras à mobilidade social que os negros ainda encontram na sociedade gaúcha. Essas barreiras, segundo ele, podem ser constatadas em diferentes momentos da trajetória dos indivíduos negros.  

“Elas estão presentes, por exemplo, tanto nas chances de chegar aos níveis mais altos de ensino quanto na oportunidade de obter melhores salários no mercado de trabalho entre aqueles que conseguiram um diploma de ensino superior”, pontua.  

Impactos da pobreza na escolaridade  

desigualdade racial

Gráfico retirado do Boletim Desigualdade Racial no Rio Grande do Sul

De acordo com os dados levantados pelo estudo, a parcela da população negra no Rio Grande do Sul que chegou a ingressar no Ensino Superior é de 16,7%, enquanto para os brancos é de 31,8%. E apesar de a média de anos de escolaridade apresentar trajetória de alta para ambos os grupos, a vantagem educacional dos brancos em relação aos negros parece constante. Em 2021, brancos tinham em média 11,2 anos de estudo completos, enquanto para os negros essa média era de 9,8.  

“Mesmo com os impactos positivos das políticas de inclusão que ampliaram as oportunidades dos negros, estas ainda não foram suficientemente capazes de diminuir as persistentes desigualdades enraizadas em nossa sociedade”, destaca a professora Izete Pengo Bagolin, pesquisadora do PUCRS Data Social. 

Além disso, os dados do levantamento ainda mostram que, até entre pessoas com o mesmo nível de escolaridade, a renda proveniente do trabalho tende a ser significativamente maior para os brancos: negros tendem a receber 31% menos do que os brancos.  

E mesmo quando comparamos apenas pessoas com Ensino Superior completo, constatamos vantagem para os brancos. Entre quem tem um diploma universitário, a média de renda para os brancos é de R$ 5.176, enquanto para os negros fica em R$ 4.363.  

“A literatura especializada tem apontado a persistência de diferenciais de salário que não são explicadas por condicionantes tradicionais de produtividade no trabalho, como o nível educacional; ou seja, ainda estamos diante de diferenças de rendimento discriminatórias, finaliza Ely Jose de Mattos, um dos coordenadores do PUCRS Data Social.