Uma pesquisa com participação da PUCRS recebeu espaço na Revista Science em janeiro de 2016. O artigo Mutually beneficial pollinator diversity and crop yield outcomes in small and large farms faz parte de um projeto internacional que envolve 18 países, entre eles o Brasil, de três continentes: África, Ásia e América do Sul. Durante cinco anos, um grupo de pesquisadores de diversas instituições e nacionalidades foi convidado a testar um protocolo de polinização e desvendar a grande questão: quais são as deficiências de polinizadores e quanto o rendimento das safras pode ser aumentado com a adequada gestão dos serviços de polinização, ou a partir disso, será que os polinizadores nativos estão dando conta de polinizar suficientemente as culturas para resultar em boas safras? A Universidade foi representada pela professora da Faculdade de Biociências e diretora do Instituto do Meio Ambiente, Betina Blochtein.
Os países em questão possuem um objetivo em comum: aumentar a possibilidade de produzir alimentos em maior quantidade e com mais qualidade. O trabalho busca verificar a relação dos polinizadores com os ganhos da produção e propõe caminhos para solucionar esse déficit e contribuir com aumentos sustentáveis, especialmente para uma comunidade de 2 bilhões de pessoas que dependem de pequenas fazendas. Betina explica que o trabalho foi desenvolvido por meio de um roteiro, que avaliou o déficit de polinização em diferentes regiões. Os pesquisadores foram desafiados a monitorar 334 lavouras comerciais pequenas (com até 2 hectares, equivalente a dois campos de futebol) e grandes. Observaram o número e a diversidade de agentes polinizadores e o rendimento de 33 cultivos, entre eles maçã, caju, café, algodão, canola, tomate, melão, feijão e pepino. Os polinizadores avaliados são insetos visitantes florais, principalmente abelhas.
A pesquisa identificou que o rendimento agrícola cresce à medida que a densidade destes polinizadores aumenta. “Constatamos que é necessário conciliar produção de alimentos com conservação da biodiversidade para se obter aumento da produtividade agrícola. Nessa relação os dois lados saem ganhando”, garante Betina. O estudo também abre uma janela de oportunidades de mudanças para o novo paradigma da sustentabilidade, por meio da intensificação ecológica da agricultura. O objetivo é tornar os ambientas mais próximos do natural. “Preservar áreas seminaturais no entorno de lavouras, com florestas, campos e solos não manejados; ambientes mais conservados com a redução do uso de produtos químicos, ou com um uso mais cuidadoso, respeitando as doses e horários; eventual plantio de cercas vivas para alimentar as abelhas durante todo o ano e fazer a manutenção de áreas mais conservadas são algumas das ações possíveis”, relata a professora.
A presença de abelhas nos ambientes agrícolas está diretamente relacionada às safras, tanto em plantios de pequena escala (densidade) quanto de larga escala (densidade e diversidade de polinizadores). Segundo a professora, existem mais de 20 mil espécies de abelhas no mundo: as abelhas domésticas (que produzem o mel e ferroam), as mamangavas (conhecidas como zangões – que polinizam o maracujá), abelhas-sem-ferrão (se desenvolvem em colônias – com milhares de indivíduos e podem ser manejadas), entre outras.
E porque elas estão diminuindo? De acordo com a pesquisadora, a diminuição das populações de abelhas está diretamente relacionada com a perda de hábitats, a exemplo dos desmatamentos; a falta de alimentos (floradas); a utilização de agrotóxicos, especialmente inseticidas, e as mudanças climáticas entre outros. No entanto, a professora defende: “O Brasil tem uma diversidade de abelhas imensa. Devemos protegê-las assim como é necessário conservar ecossistemas naturais e a biodiversidade. Por outro lado, também é nosso dever desenvolver tecnologias para a criação de polinizadores nativos, que possam ser usados efetivamente em grande escala em sistemas agrícolas mais sustentáveis resultando em melhores safras”.
A canola foi o cultivo pesquisado no Rio Grande do Sul pela PUCRS, com a participação da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária RS (Fepagro) e a Universidade de Caxias do Sul (UCS). Ela produz sementes pequenas, de onde se extrai o óleo comestível de canola (de alta qualidade), biodiesel e ração animal. A dependência da canola de polinizadores para a produção de grãos é considerada média. Sendo assim, a ação dos insetos polinizadores é essencial para o aumento da produção. “Se tivermos lavouras próximas a áreas conservadas produziremos mais canola do que em áreas distantes destas áreas seminaturais. Diante dessas condições, pode-se identificar um aumento médio de 30% no resultado final da safra”, constata Betina.
Para que ocorra a fecundação das flores e o desenvolvimento dos frutos, a maioria das plantas necessita da transferência de grãos de pólen da parte masculina da flor para uma parte feminina. As maçãs, por exemplo, dependem em até 90% da visita de uma abelha para a produção de um fruto bem desenvolvido e simétrico. “Outro exemplo clássico é o maracujá: as flores que não receberem a visita de uma abelha nativa (mamangava) levando pólen, não se desenvolvem e não há frutos. Em Santa Catarina, devido à escassez de abelhas esse trabalho que tem sido realizado manualmente, com custos elevados e menor eficiência. Ou seja, se próximo dessas lavouras, que são dependentes de polinização, tivermos abelhas voando – abelhas adequadas para a polinização da planta – o serviço ocorre naturalmente”, explica Betina.
As pesquisas sobre canola no RS foram financiadas pelo projeto Rede Brasileira para a polinização da Canola, aprovado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico (CNPq), bem como pelo projeto Conservação e Manejo de Polinizadores para uma Agricultura Sustentável, através da Abordagem Ecossistêmica, financiamento do Fundo Mundial para o Meio Ambiente (GEF) e da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), no período de 2010 a 2015.