coronavírus,novo coronavírus,pandemia,covid,covid-19,sono,insônia,sonho,sonhar,sonhos,escola de medicina,inscer,escola de cências da saúde e da vida,inscer,psicologia,psicanálise,dormir,dormindo

Nós sonhamos todas as noites, e não há nada de errado nisso / Foto: Pexels

Desde que a pandemia do novo coronavírus se iniciou e, especialmente, quando o distanciamento social causado pela quarentena se tornou uma realidade, muitas pessoas têm observado mudanças no sono. Sonhar e lembrar dos sonhos – muitas vezes mais perturbadores do que de costume – com uma frequência maior do que a normal é uma delas. Outra questão bastante comentada é a dificuldade para dormir. Se você se enquadra em um desses casos, pode ter certeza de que não está só. E há explicações para isso.

Primeiramente, é importante dizer que todos nós sonhamos todas as noites – e não há nada de errado nisso. Pelo contrário. Segundo a professora da Escola de Medicina e vice-diretora do Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul (InsCer) Magda Lahorgue Nunes, sonhar é uma atividade benéfica para o cérebro, demonstrando que sua função está normal. “Existem várias teorias em relação à função dos sonhos, entre elas a de que ajudam a consolidar memórias, a regular o humor e a treinar comportamentos não apresentados quando estamos acordados”, explica.

O motivo de nem sempre lembrarmos do que sonhamos é que essa recordação depende da transferência de conteúdo da memória recente para a remota, e isso só é possível quando existe algum grau de despertar (chamado de microdespertar) após o sonho ter acontecido.

Do ponto de vista da psicanálise, sonhar também é algo positivo e até mesmo importante – principalmente em um contexto de pandemia. Conforme a professora do curso de Psicologia da Escola de Ciências da Saúde e da Vida Carolina de Barros Falcão, trata-se de uma atividade elaborativa, uma via por meio da qual podemos significar o que estamos vivendo.

Mas o que é o sonho, afinal?

O sonho é uma atividade mental que acontece enquanto estamos dormindo. Ele é consequência da ativação cortical que ocorre na fase REM (rapid eye movement, ou movimento rápido de olhos) do sono. Esse estágio chega após três outras fases: N1 (transição da vigília para um sono mais profundo, mas ainda leve), N2 (desconexão do cérebro com os estímulos do mundo real) e N3 (sono profundo, com descanso da atividade cerebral).

No estágio REM, o cérebro volta a ficar ativo, tanto quanto o de uma pessoa acordada. Por isso, conforme Magda, a atividade fásica que ocorre nessa fase se relaciona com a imagética visual dos sonhos, permitindo que tenhamos sonhos complexos, semelhantes a histórias. Em uma noite, podemos ter entre quatro e seis ciclos de sono, incluindo os estágios não-REM e REM, sendo que cada um deles dura cerca de 90 minutos.

Conforme a professora Carolina, a psicologia tem muitas teorias diferentes para o sonho – algumas que coincidem mais com o olhar médico, outras que se afastam um pouco. “A psicanálise vai trabalhar com uma leitura e com um modelo de psiquismo que não descarta o corpo e o orgânico, mas que pensa que os processos psíquicos não estão apenas relacionados com os processos biológicos”, ressalta.

Para a leitura psicanalítica, o sonho é uma produção psíquica muito importante. “Temos, no sonhar, uma atividade muito privilegiada de trabalho psíquico, porque estamos ‘protegidos’ da realidade. E é por isso que podemos sonhar as coisas mais malucas que existem”, destaca Carolina.

Por que estamos sonhando mais?

Segundo a vice-diretora do InsCer, os sonhos são construídos com base em experiências remotas e em preocupações atuais. E a vivência intensa do tema coronavírus e de tudo o que essa pandemia implica pode ser uma explicação para estarmos nos lembrando mais dos sonhos. “As restrições de convívio social, a quebra de rotina, questões financeiras, o medo e a ansiedade sobre a gravidade do que está acontecendo já são motivos fortes o suficiente para sonharmos mais”, aponta Magda.

Carolina complementa dizendo que a pandemia da Covid-19 fez com que todos precisassem mobilizar suas vidas de forma muito rápida, fazendo adaptações no modo de viver e tolerando perdas muito contundentes na rotina. “Um motivo para que tantas pessoas estejam sonhando mais pode ser porque estão recorrendo a todas as possibilidades de trabalhar psiquicamente. O sonho tem sido uma forma muito importante de descarga dessas intensidades que estamos vivendo, do psiquismo encontrar uma forma de dar conta e de elaborar tudo isso”, diz.

A professora de Psicologia ainda aponta que, além dos acontecimentos atuais, na hora de se analisar um sonho e tentar entendê-lo, é preciso levar em consideração todo o contexto da pessoa que o sonhou: “Não sonhamos só por causa do coronavírus, da pandemia ou das restrições que estão impostas. Sonhamos porque essas situações de hoje tocam naquelas que já eram as nossas questões, nossos conflitos. Quando sonhamos, resolvemos essa dupla mobilização: a interna, do nosso mundo psíquico; e a externa, daquilo que nos invade – nesse caso, o tema da morte, do adoecimento”. Carolina conclui reforçando que o fato de as pessoas estarem sonhando significa que estão metabolizando as situações traumáticas que estão vivendo nesse momento de pandemia, e que isso é algo muito positivo.

Insônia pode ser consequência da quebra da rotina

coronavírus,novo coronavírus,pandemia,covid,covid-19,sono,insônia,sonho,sonhar,sonhos,escola de medicina,inscer,escola de cências da saúde e da vida,inscer,psicologia,psicanálise,dormir,dormindo

Seguir uma rotina ajuda a manter um sono saudável / Foto: Pexels

Em relação à dificuldade para dormir, Magda destaca que as mudanças na rotina podem ser um dos causadores. “Queixas de insônia estão sendo muito frequentes durante a quarentena. Isso certamente é decorrente de quebras nas rotinas, da falta de necessidade de cumprir horários, além do relaxamento nos aspectos de higiene do sono, como variações no horário de dormir e de acordar e o uso excessivo de telas”, afirma.

Para manter a saúde do sono, apesar de todas mudanças e das preocupações causadas pela pandemia, é importante tentar seguir uma rotina. “Ter um horário para dormir e acordar, evitar o uso de telas pelo menos 30 minutos antes de dormir, não fazer uso excessivo de álcool, optar por refeições leves à noite e evitar bebidas com cafeína podem ajudar”, sugere Magda.

Pesquisa vai avaliar sono da população durante a quarentena

O InsCer desenvolveu uma pesquisa para avaliar como está o sono da população brasileira durante a quarentena. O participante, de acordo com sua idade e/ou a idade de seus filhos, é direcionado a um questionário específico para fazer essa avaliação. Ao fim, será redirecionado a uma página com informações sobre como é o sono normal nas diferentes faixas etárias e receberá dicas, conforme a idade, de como dormir bem. A pesquisa está disponível neste link.

Leia mais: Estudo investiga impactos do confinamento domiciliar no sono de adultos e de seus filhos

Arte: PsiCOVIDa

Arte: PsiCOVIDa

Situações de pandemia, como a que estamos vivendo atualmente causada pelo novo coronavírus, geram impactos na vida de todos. Em um contexto de mudança de rotina, distanciamento físico, excesso de notícias e consequências econômicas e sociais, é comum que surjam sentimentos como emoções negativas, como medo, tristeza, raiva, solidão, estresse e ansiedade. Pensando nessa realidade, pesquisadores e estudantes de Pós-Graduação em Psicologia da PUCRS e da PUC-Campinas se uniram com o objetivo de ajudar as pessoas a lidarem com esse desconforto emocional, dando origem à Força-Tarefa PsiCOVIDa.

O grupo surgiu com a missão de contribuir para o bem-estar das pessoas com conhecimento científico durante a pandemia. Para isso, os integrantes desenvolvem produtos de comunicação e orientação, como cartilhas, folhetos, minicursos e vídeos, baseados na ciência da psicologia e de áreas afins.

Ideia surgiu a partir de matéria para o site da PUCRS

Conforme conta Wagner de Lara Machado, professor da graduação e do PPG em Psicologia e um dos coordenadores gerais da FT-PsiCOVIDa, tudo teve início com uma matéria para o site da PUCRS sobre sugestões de cuidados com a saúde mental neste período de pandemia, para a qual foi convidado a ser fonte. Ele e a mestranda Juliana Weide começaram a traduzir conhecimentos teóricos em práticas, fundamentadas na Psicologia Clínica, que poderiam ser acessíveis às pessoas em situação de quarentena/distanciamento social. “Essas sugestões tinham por objetivo a regulação emocional e o controle do estresse. Pedimos uma revisão do material para a professora Sônia Enumo, do PPG de Psicologia e Ciências da Saúde da PUC-Campinas, e, como não conseguimos incorporar todas as sugestões na matéria, decidimos por dar continuidade ao projeto”, conta Machado.

Sônia incorporou mais dois alunos à equipe: Eliana Vicentini e Murilo Araújo, ambos doutorandos em Psicologia na Puc-Campinas. A equipe começou a se reunir de forma online e a conversar para alinhar a proposta. “Reconduzimos a revisão da literatura e localizamos estudos indicando estressores e estratégias de enfrentamento específicos para situações de crise, especialmente a pandemia da Covid-19. Assim, deu-se início à redação da Cartilha para enfrentamento do estresse em tempos de pandemia”, pontua o professor.

Cartilha pode ser utilizada por toda a comunidade

Arte: PsiCOVIDa

Arte: PsiCOVIDa

O material é dividido em três grandes seções. A primeira apresenta informações sobre estresse e seu enfrentamento; a segunda aborda a identificação de sinais que indicam que a capacidade de lidar com o estresse pode não estar sendo suficiente; e, a última, fala sobre a identificação de estressores e estratégias de enfrentamento específicas para o contexto da epidemia da Covid-19. Segundo Machado, a ideia do grupo é que, por ser um material acessível, a Cartilha seja compartilhada e utilizada não apenas por profissionais, mas por toda a comunidade neste momento de desafio.

Para o professor, o grande diferencial do material é o embasamento teórico atual, enfatizando o bem-estar psicológico e a saúde mental em tempos de calamidade. “As sugestões de enfrentamento presentes na Cartilha podem prevenir o agravamento de dificuldades no manejo do estresse e promover qualidade de vida neste contexto de pandemia”, conclui.

Material será traduzido e distribuído gratuitamente

A força-tarefa originada a partir do grupo que se reuniu para o desenvolvimento da Cartilha já conta com mais de 100 integrantes de 12 universidades, entre pesquisadores, alunos de graduação e pós-graduação, profissionais de diversas áreas e professores. Dividida em times de trabalho, a equipe está desenvolvendo cerca de 20 novos produtos. A Cartilha para enfrentamento do estresse em tempos de pandemia está sendo traduzida para o inglês e para o espanhol e, posteriormente, será distribuída gratuitamente por meio de universidades e entidades científicas.

Clique aqui para acessar e baixar a Cartilha