Estudo realizado no Instituto de Geriatria e Gerontologia da PUCRS (IGG) aponta que a prática de artes marciais pode ajudar idosos a manterem-se saudáveis física e mentalmente. O trabalho, realizado na dissertação de Mestrado do educador físico Brandel Filho, sob a orientação da bióloga e professora Maria Gabriela Valle Gottlieb, acompanhou idosos entre 60 e 89 anos por três meses. O grupo se dividiu em dois: os praticantes de Caratê, com 16 participantes; e o grupo Controle, com 17 integrantes. “Tínhamos o objetivo de investigar a parte cognitiva que inclui tarefas de atenção, memória, linguagem, funções executivas, todas essenciais no desempenho das atividades diárias”, explica.
A maior dificuldade encontrada pelo pesquisador foi na seleção dos participantes. “É difícil uma pessoa de 89 anos chegar e falar que quer praticar Caratê. Muitos deles tinham medo de se machucar”, conta. Por isso, as aulas foram divulgadas como atividades físicas com meditação. “Eu adaptei a aula para os idosos, assim como se adapta para qualquer outra faixa etária”. Foram realizadas entrevistas individuais com cada inscrito, e exigia-se que os participantes não tivessem problemas de saúde e nem comprometimento cognitivo. Eles também precisavam ser sedentários, para que os dados fossem trabalhados da melhor forma.
Antes do início das aulas, que ocorreram duas vezes por semana, foram realizados testes que investigaram a capacidade cognitiva, a coordenação motora, locomoção, memória, orientação de tempo e local. Familiares ou cuidadores dos idosos também participaram.
Os resultados
Os idosos que praticaram Caratê tiveram melhora na capacidade de reconhecer estímulos visuais, de lembrar fatos; na resolução de problemas abstratos, como por exemplo, em questões imaginadas ou apresentadas; e na capacidade de reação a estímulos visuais. Os familiares também relataram diminuição nas queixas de perda de memória. “O que ficou nítido, mas que não fazia parte do estudo, foi a questão da movimentação dos idosos. Uma senhora de 89 anos, que chegou com dificuldades para caminhar, no final dos três meses, já conseguia dar chutes e socos sem grandes dificuldades. Foi a aluna mais aplicada”, relata o pesquisador, bastante orgulhoso.
Rumos da pesquisa
Brandel já está cursando o Doutorado no Programa de Pós-Graduação em Gerontologia Biomédica do IGG, durante o qual pretende ampliar o estudo, incluindo pessoas de outras faixas etárias, para a comparação de resultados “Nós já conseguimos investigar que o Caratê serve como uma ferramenta para um treino cognitivo em tarefas de atenção e memória, mostrando-se tão efetivo quanto o próprioTai Chi Chuan”. A expectativa é que a pesquisa se expanda, que se formem novas turmas para idosos com as devidas adaptações. “Seria importante uma conscientização por parte do poder público sobre a importância do Caratê para essa parte da população. Ele poderia ser incluído nas atividades oferecidas para a população em lugares abertos ao público, como no Tesourinha e em outros locais, com práticas mantidas pela Prefeitura”, ressalta.
A prática do Caratê
O Caratê tem três pilares centrais em sua pedagogia: o fundamento, a forma e a luta, que foram trabalhados com os idosos durante as aulas. No fundamento, chamado de kihon em japonês, eles aprenderam alguns exercícios básicos, como socar, chutar, defender e caminhar – há uma maneira certa de caminhar para conseguir fortalecer as pernas e braços. “A pessoa já tem que começar a pensar diferente e isso estimula o cérebro de uma nova maneira, criando novas demandas cognitivas, novos caminhos neurais”, conta Brandel.
Depois de aprender os movimentos básicos, o aluno pratica a forma, chamada de kata em japonês, que são os vários exercícios sequenciais, simulando uma luta. “O praticante tem que imaginar os adversários, memorizar e executar a sequência de forma correta, já que cada movimento tem um padrão, atentando para a velocidade do movimento e do exercício executado. Todo esse aprendizado estimula a memória, atenção e coordenação. É praticamente um tratamento cognitivo”, analisa.
A luta, chamada de kumite, pode ocorrer por meio de exercícios dois a dois, de ataque e defesa. No caso dos idosos, não houve contato físico. “O colega dá um estímulo, que é um ataque, e você precisa escolher a defesa específica para fazer, que seja mais adequada para aquele ataque. Essa situação envolve velocidade de processamento e de reação, por exemplo”, finaliza o pesquisador.
O estudo completo está disponível neste link.