Saúde

No combate ao imperador de todos os males

terça-feira, 04 de setembro | 2018

Siddhartha Mukherjee

Fotos: Luiz Munhoz/Divulgação

O oncologista Siddhartha Mukherjee fala sobre o câncer de forma leve, mas provocadora. Na quinta noite de conferências do Fronteiras do Pensamento, para um público que lotou o Salão de Atos da UFRGS em 3 de setembro, ele mereceu a atenção total do público do primeiro minuto até a última resposta. Fez um rápido histórico sobre a doença, registrada há cerca de 4 mil anos, interagiu muito com a plateia lançando perguntas inquietantes, mas focou principalmente em jogar luzes nos futuros tratamentos para combater o mal.

Mukherjee é reconhecido mundialmente por ser o autor de O imperador de todos os males: uma biografia do câncer, lançado em 2012 no Brasil e vencedor do Prêmio Pulitzer 2011, nos EUA. O livro de 634 páginas, voltado para todos os públicos e que serviu de base para um documentário de Ken Burns, retrata a história da doença, os avanços no tratamento e o impacto na sociedade. “A diversidade do câncer é igual à diversidade do número de pacientes. Nenhuma doença tem essa diversidade. Então, não é simples: é um desafio. Mas tivemos avanços poderosos”, declarou.

Código genético

A palestra foi conduzida em tom otimista. Citou uma pesquisa realizada em 1996 nos EUA sobre o que as pessoas mais tinham medo, as respostas foram tubarão e câncer. “Sobre tubarão, não sei nada, mas posso falar sobre câncer”, disse. Lembrou que hoje já é possível saber a altura que um adulto terá só analisando o código genético ainda na fase de feto. De forma semelhante, será possível saber se um bebê em desenvolvimento terá alguma doença grave e em qual fase da vida. Questionou os presentes para saber se gostariam de ter essa informação. Poucos responderam afirmativamente. “Você gostaria de saber antes? Esse é o dilema”, afirmou. “O medo do câncer se espalhou pela nossa cultura”, acrescentou.

Siddartha Mukherjee

Salão de Atos da UFRGS lotado para a palestra

Sobre o presente e o futuro da medicina no combate ao mal, Mukherjee disse que gostaria de preparar as pessoas para esse mundo novo. “Todos somos pré-câncer e estamos sendo supervisionados”, provocou. “Quanto mais tentamos diagnosticar de forma precoce mais nos tornamos paranoicos? Somos futuros pacientes de câncer em vigilância.” Destacou que há um plano global de enfrentamento à doença e dividiu a estratégia em três momentos: prevenção (a partir da revelação dos estados cancerígenos); detecção precoce e tratamento.

Tratamento individualizado

Siddhartha Mukherjee enfatizou que o caminho para tratar o câncer será cada vez mais individualizado, levando em conta hereditariedade, genética, hábitos e utilizando as terapias-alvo de precisão. É o caso da imunoterapia, que usa o próprio sistema imunológico para atacar a doença. Lembrou da paciente norte-americana Barbara Bradfield, a primeira a usar a droga Herceptin contra o câncer de mama há 20 anos, e hoje está viva. “Só funcionou nela porque antes havia sido detectada uma determinada mutação genética individual que responderia a este medicamento. Caso contrário, o remédio seria tóxico”, explicou. “Hoje podemos rastrear, detectar precocemente gens que aumentam o risco para tumores”, acrescentou. “Faço de 15 a 20 sequenciamentos genéticos por semana.” Nos EUA, sequenciar 23 mil genes custa cerca de US$ 1 mil por pessoa e o resultado fica pronto em uma semana.

Siddartha Mukherjee

Em conversa anunciou mais novidades

No final do evento, em conversa mediada pelos médicos Carlos Alexandre Netto (UFRGS) e Luiz Antonio Nasi (Hospital Moinhos de Vento), anunciou que uma das grandes apostas no estudo do câncer está associada à dieta como forma de mudar a resposta ao tratamento. Citou quatro estudos publicados na Nature que atestam que o câncer usa mecanismos muito particulares para bloquear o tratamento quimioterápico. ”Nosso desafio é combinar o medicamento correto com a dieta adequada”, frisou. Em outubro, nos EUA, começará a primeira pesquisa em seres humanos nesse sentido com 24 pacientes de câncer de mama.

Sobre Siddartha Mukherjee

Nasceu em Nova Delhi (Índia) há 48 anos, estudou Biologia na Universidade Stanford, Imunologia na Universidade de Oxford e formou-se em Medicina na Universidade de Harvard, especializando-se em oncologia. Atualmente, trabalha no centro médico da Universidade Columbia, onde também é professor assistente. O oncologista defende que repensar a medicina significa repensar a forma com que nossos corpos se curam e, a partir disso, passar a focar nos microambientes que tornam determinadas partes do corpo imunes ou afetadas pelas doenças. Ele alerta: estas transformações já estão acontecendo.

PUCRS parceira do Fronteiras do Pensamento

A PUCRS é parceira cultural do evento. Professores, técnicos administrativos, mestrandos, doutorandos e alumni (diplomados) da Universidade contam com 50% de desconto para as conferências. Podem também comprar ingresso para um acompanhante com o mesmo desconto. Os diplomados devem portar a carteira Alumni na hora da compra. É obtida na sala 109 do prédio 1, de segunda a sexta-feira, das 8h30 às 18h30. Contatos: Rede Alumni. Os estudantes de graduação têm meia-entrada, se portarem carteira de identificação estudantil, conforme legislação. Os pontos de venda de ingressos estão disponíveis aqui.

A próxima conferência do Fronteiras do Pensamento será em 8 de outubro com Ai Weiwei, artista plástico, designer e cineasta. Weiwei é um dos artistas-ativistas mais destacados da atualidade. Ele manifesta o ativismo em suas obras e entende que seu trabalho é dar voz aos que não têm como falar. O evento ocorre no Salão de Atos da UFRGS (Av. Paulo Gama, 110), às 19h30min. O mundo em desacordo: democracia e guerras culturais é o tema da temporada de 2018.