Impacto Social

Famecos reúne profissionais que atuaram na crise das enchentes no RS para debater o lugar da comunicação 

segunda-feira, 03 de junho | 2024

Evento aconteceu de forma online na última sexta-feira

A Escola de Comunicação, Artes e Design da PUCRS realizou a primeira edição do projeto Roda de Conversas Famecos — Viver, pensar e comunicar. O tema inicial foi o questionamento “Como ficamos depois das enchentes de 2024?” e contou com dois painéis: Qual é o lugar da comunicação pública nas crises e A comunicação como valor no enfrentamento ao evento extremo do Rio Grande do Sul. Abaixo, separamos algumas reflexões dos painelistas convidados.  

Qual é o lugar da comunicação pública nas crises? 

Priscila Oliveira, jornalista na assessoria da Vice-Presidência de Relações Político-Institucionais da Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), acredita que a comunicação, neste contexto, deve, em primeiro lugar, garantir a segurança e o bem-estar da sociedade. Ela afirma que a comunicação pública é um instrumento poderoso que serve de guia e orientação.

“Manter todos informados sobre eventos climáticos iminentes é essencial para que possam se preparar adequadamente e tomar as medidas necessárias para se proteger. A transparência e a prontidão na comunicação pública podem salvar vidas e minimizar os impactos negativos das catástrofes”, explicou Priscila.

A profissional também destacou a importância de estabelecer fluxos de comunicação em crise, buscando oferecer à população respostas rápidas; além de manter relacionamento franco e ágil com a imprensa, fortalecendo o enfrentamento à desinformação.  

Roberta Brum, jornalista e coordenadora de comunicação do Departamento Municipal de Água e Esgotos de Porto Alegre (DMAE), exemplificou que o lugar da comunicação está na transparência e clareza dos conteúdos compartilhados pelos meios oficiais do departamento, bem como no atendimento das dúvidas que chegam, principalmente pelas redes sociais. “Organizei o trabalho por pílulas, como, por exemplo, intitulando ‘O DMAE Responde’, buscando humanizar e simplificar a comunicação para esclarecer tudo o que estava acontecendo, por meio de conteúdos lúdicos, com o intuito de deixar a população o mais informada possível”, exemplificou. Roberta também mencionou a importância de combater a desinformação, explicando que parte da gestão da crise foi direcionada para esclarecer o que era verdade ou falso.  

Cristiane Franco, jornalista e Secretária Municipal de Cidadania e Direitos Humanos e coordenadora de Comunicação Social da Prefeitura de Esteio, destacou a importância da comunicação na contingência. Ela exemplificou que, nos últimos anos, o município vinha enfrentando cheias, o que levou à criação de um plano de contingência que envolveu todas as secretarias municipais, incluindo a comunicação.

“Dar respostas rápidas à comunidade sempre foi a nossa preocupação. Com o histórico das cheias e as informações de que grandes chuvas afetariam o município, revisitamos o plano de contingência, pensando em quem comunicaria o que, quem montaria os abrigos, e quem abasteceria as redes sociais. Então, montamos os abrigos e informamos as pessoas sobre isso. Assim, elas sabiam para onde ir. No início, foram mais de 40 horas de trabalho ininterrupto,” explicou Cristiane.  

A comunicação como valor no enfrentamento ao evento extremo do Rio Grande do Sul

Arlise Cardoso, publicitária e analista de marketing da Calçados Beira Rio, aplicou seus conhecimentos em comunicação para auxiliar a empresa, cujas fábricas foram afetadas pelas enchentes devido à sua localização às margens de rios, como sugere o próprio nome. Com o histórico de grandes chuvas nos últimos meses, essa questão já estava na pauta de Arlise. Assim, ela conseguiu contribuir em outras frentes, incluindo a organização do projeto “Resgatados RS,” uma iniciativa destinada a conectar pessoas desaparecidas com aquelas que haviam sido resgatadas.

“Com o diploma em comunicação em mãos, pensei: preciso fazer essas informações se encontrarem – que era a de resgatados e a de desaparecidos. Criei um drive com dados importantes, como nome das pessoas, local de resgate e o abrigo em que ela estava, e divulguei que estava abastecendo essa base de dados. Em seguida, comecei a entrar em contato com as prefeituras e outras entidades, conseguindo novas listas dos abrigos. Com a ajuda de outros amigos voluntários, fomos digitalizando essas listas e organizando as informações, sempre buscando outros abrigos para ampliar nossas informações. Em pouco tempo, tínhamos mais de 11 mil nomes nessa lista”, conta a publicitária.

Depois disso, Arlise estabeleceu parcerias com outras pessoas que estavam realizando iniciativas semelhantes, visando unir dados e tornar o processo mais eficaz.  

Danielle Mattos, relações-públicas e gestora da Equipe G, uma empresa de gestão de eventos, e responsável pelo Centro de Eventos da Associação Médica do RS (Amrigs), ocupou outro lugar importante no enfrentamento da crise ao liderar um centro de doações/distribuições, localizado, inicialmente, na própria Amrigs. Suas responsabilidades envolviam a organização de cadastros de voluntários e a estruturação de setores de trabalho, como os de triagem e recebimento de doações. Além disso, com o auxílio de outros voluntários, coordenou uma equipe para identificar e atender às necessidades das pessoas que precisavam das doações, garantindo também o eficiente envio dos recursos arrecadados. Foi necessário também organizar cadastros de motoristas voluntários para fazer essa ponte. Dias depois, o centro de doações foi transferido para o Clube Farrapos, para que a Amirigs pudesse direcionar seus esforços para outras áreas, especialmente relacionadas à medicina.

“Não tínhamos ideia do tamanho que isso tinha tomado, pois começamos a ser um centro de distribuição de referência da própria prefeitura, e doações grandes, como carretas vindas de São Paulo, por exemplo, começaram a nos contatar. Começamos a receber em torno de oito carretas por dia. Foi montada uma operação logística muito grande. Somos voluntários de diferentes áreas e, dia após dia, vamos aprimorando nossos processos”, explica Danielle.   

Lara Ely, jornalista e especialista em Gestão Ambiental, está atualmente cobrindo as enchentes para o Metrópoles e a Agência Pública, trazendo ao debate o lugar da imprensa nesse contexto. Recentemente, Lara estava realizando um doutorado sanduíche na França e retomou suas atividades profissionais neste cenário, o que a aproximou ainda mais do campo da reportagem.

“Observando todos os movimentos que a Arlise e a Danielle comentaram, assim como os esforços voluntários e as mobilizações, coloquei minhas habilidades a serviço do que fosse útil dentro do que eu consigo fazer, e prontamente a reportagem me chamou. Comecei fazendo uma reportagem ambiental, ouvindo especialistas, e logo depois comecei a fazer reportagens diárias. Histórias de resgate, de animais, histórias emocionantes, até histórias duras e sofridas, eu me emocionei muito com essas histórias e pude perceber que estava adormecido em mim esse espírito de repórter. A minha escuta seria de alguma forma útil para aquelas pessoas para que a história delas fosse reconhecida em todo o país”, explica Lara.   

A Roda de Conversas da Famecos é um projeto contínuo que contará com próximas edições ao longo do mês. A proposta é que o projeto continue aproximando profissionais, professores e estudantes para refletir sobre diferentes temas. Os painéis na íntegra estão disponíveis no YouTube (link).