Os dados referentes ao último trimestre de 2022, liberados recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), consolidam uma tendência que já vinha sendo observada nas regiões metropolitanas brasileiras: a recuperação da renda do trabalho das famílias combinada a uma inclinação de piora da desigualdade. Entre o primeiro e o último trimestres de 2022, a média da renda domiciliar per capita do trabalho subiu 13%, indo de R$ 1.455 para R$ 1.644. Ao mesmo tempo, a desigualdade de renda, medida pelo coeficiente de Gini – quanto mais alto, maior a desigualdade – subiu de 0,613 para 0,620, com três altas consecutivas. A principal explicação para esse resultado, segundo os dados, está no fato de que os mais ricos têm se aproveitado mais do crescimento da renda do que os mais pobres.
As informações estão na décima segunda edição do “Boletim – Desigualdade nas Metrópoles”, produzido pelo PUCRS Data Social em parceria com o Observatório das Metrópoles e com a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). Os dados são provenientes da PNAD Contínua trimestral, do IBGE, e dizem respeito à renda domiciliar per capita do trabalho, somente incluindo o setor informal. O recorte utilizado é o das 22 principais áreas metropolitanas do país, de acordo com as definições do IBGE. Todos os dados estão deflacionados para o terceiro trimestre de 2022, de acordo com o IPCA.
Embora cada metrópole apresente comportamentos diferentes, na maior parte delas (12 dentre as 22) se verificou o mesmo comportamento de crescimento das desigualdades. Na grande São Paulo, por exemplo, o Gini aumentou de 0,600 para 0,614, e na Grande São Luís subiu de 0,558 para 0,615. Concomitantemente, em todas as vinte e duas metrópoles foi também constatado aumento da média de renda. Esse aumento foi mais elevado nas Regiões Metropolitanas da Grande São Luís (36,6%), João Pessoa (34,4%), Teresina (29,3%), Goiânia (22,6%) e Vale do Rio Cuiabá (19,0%).
“A combinação de aumento da média de renda e comportamento de elevação das desigualdades não é incomum no Brasil, e ocorreu porque os estratos mais altos apresentaram, nos últimos trimestres, um aumento proporcionalmente maior de seus rendimentos do que os mais pobres”, declara André Salata, pesquisador do PUCRS Data Social e um dos coordenadores do estudo.
De acordo com o estudo, enquanto a média de renda dos 40% mais pobres cresceu 13,4% ao longo de 2022, entre os 10% mais ricos ela cresceu 17,3%. Consequentemente, se no início do ano os mais ricos ganhavam, em média, 30,2 vezes mais que os mais pobres, essa cifra chegou a 31,2 vezes no final do ano. Ou seja, todos os estratos melhoraram, mas os mais ricos melhoraram proporcionalmente mais, fazendo a distância entre eles e os mais pobres aumentar ao longo do último ano.
A explicação para o aumento da renda média pode ser decorrente de dois fatores.
“Em 2022, se verificou redução da taxa de desemprego, colaborando para a ampliação do aumento da renda nos domicílios. Além disso, a taxa de inflação desacelerou a partir dos meses de maio e junho, contribuindo para a manutenção do poder de compra dos rendimentos do trabalho. Aumento do emprego e redução da taxa de inflação são os dois fatores que, conjugados, contribuíram para a elevação da renda média de todos os estratos de rendimento das metrópoles brasileiras”, explica Marcelo Ribeiro, professor do IPPUR/UFRJ e também coordenador do estudo.
Como o estrato dos 10% mais ricos foi o que mais se beneficiou do efeito desses fatores, a desigualdade de renda se elevou, na medida em que ocorreu aumento da distância do nível de renda dos mais ricos em relação aos demais estratos de rendimento. Os mais ricos saltaram de um rendimento médio de R$ 6.765 para R$ 7.933, entre o primeiro e o último trimestre de 2022.
Enquanto isso, a recuperação da renda do trabalho entre as famílias mais pobres, que vinha se desenhando desde o terceiro trimestre de 2020 – após brusca queda no início da pandemia –, perde um pouco de seu ímpeto a partir do segundo trimestre de 2022.
“A recuperação do mercado de trabalho foi suficiente para trazer a média de renda dos mais pobres para o patamar que tínhamos no momento imediatamente anterior à pandemia. No entanto, hoje essa média ainda é 22% menor que aquela encontrada no pico da série histórica, ao final de 2013. Ou seja, avançamos em relação ao tombo dos últimos anos, mas ainda falta muito para nos aproximarmos dos maiores valores da série histórica. Para isso, seria necessário aliar crescimento econômico com melhoria da distribuição de renda”, finaliza André Salata.