Reconhecido e aclamado mundialmente por ser uma referência em ideias políticas conservadoras e polêmicas, o pensador e escritor britânico Roger Scruton foi moderado ao falar para uma plateia lotada na terceira noite de conferências do Fronteiras do Pensamento, em 1º de julho. Deu pinceladas em alguns temas controversos contemporâneos, mas se ateve em refletir de forma profunda sobre os sentidos da vida, o tema de sua palestra e também do ciclo de eventos deste ano.
“Somos criaturas ávidas por sentido. Sem sentido é quase impossível aceitar viver. Buscamos significados até onde ninguém os implantou, como nas flores”, refletiu. Tendo como fio condutor a história de sua mãe, Scruton, 75 anos, um dos mais importantes filósofos da atualidade, membro da Royal Society of Literature, condecorado com a medalha da Ordem do Império Britânico e professor da Universidade de Buckingham, relatou um convívio familiar difícil na infância e juventude.
Em busca de sentido
Afeto e acolhimento não eram demonstrados por seus pais, o que o levou a fugir de casa aos 16 anos. A mãe, tímida e reclusa, submissa ao marido, um operário sindicalista de personalidade opressora, sofria calada. Vítima de câncer de mama, no fim da vida, no leito, confidenciou aos filhos: “Minha vida foi um fracasso, nunca admiti isso. Mas agora eu sei. Olho para trás e vejo que nunca disse o que queria: que eu amava vocês”. Scruton revelou que carregou as palavras e o desespero da mãe por 50 anos. “Ela buscou o sentido da vida e não encontrou nenhum”, avaliou.
Autor de best-sellers sobre filosofia, política e estética, além de produções acadêmicas e um documentário para a BBC sobre Por que a beleza importa?, escreveu A alma do mundo e A natureza humana, onde diz que o sentido da vida não é o significado que cada um atribui a ela. “É o significado que os outros lhe conferem, através do reconhecimento da minha vontade, da compaixão pelo meu sofrimento e do perdão pelos meus defeitos.”
A redenção, na análise de Scruton, é uma solução para as falhas do passado. Ele questionou por que as pessoas agem, sentem e reagem de certa forma. Segundo o filósofo, a redenção não vem do ego, vem do outro. “Reconhecemos, em nosso ser, que não estamos sozinhos. Que o que importa para nós, a nossa salvação, é o amor, a compaixão e o perdão que os outros nos concedem.” E foi além: “Mais promissor é buscar o sentido da vida não nos acontecimentos que a compõem, mas na visão que a redime”. Acrescentou que o fundamental para uma vida de relações pessoais é o sacrifício. “O pensamento de que os outros poderiam se sacrificar por mim é um pensamento que muda o mundo”, vaticinou.
Em busca da beleza
Diante da relação somente instrumental com o mundo, Roger Scruton defende o papel da beleza. Diz que ela está intimamente ligada ao sagrado, ao contrário da sociedade materialista, que vê todas as coisas como algo que pode ser comercializado e consumido. O estético, enraizado nas comunidades desde tempos ancestrais, em sua percepção, foi construído “no espírito do amor, voltado para os outros”.
Citou que o principal exemplo quando se fala em estética são as cidades, decoradas e ornamentadas, em cada detalhe, para se oferecerem aos olhares e julgamentos. “A vida já me apresentou vários exemplos, mas nenhum como Veneza e a Basílica de São Marcos, com sua cúpula dourada e ordem estética meticulosa”, observou.
Por que a beleza importa? O escritor diz que contemplar o belo é compreender a alma do mundo, tocar o sentido profundo das coisas através do olhar. “Por meio da beleza, implantamos em nosso entorno o sentido de pertencimento que nos vem dos outros; quando a relação eu-você floresce, o outro é trazido para nossas vidas.”
O papel da beleza e do amor nos sentidos da vida leva em conta, de acordo com Scruton, que a condição humana, como a conhecemos, é cheia de tragédias e mistérios. Uma das tarefas da arte seria reconciliar os seres humanos com isso. “É mostrar que, na profundeza do desespero, existe uma beleza que nos liberta”, concluiu.