Aos 14 anos, Morgana Weber começou a trabalhar em um salão de beleza e, em seguida, se formou no ensino fundamental. Iniciou, então, o ensino médio no Instituto Federal (IF) de Campus Feliz e ingressou também em um curso técnico em informática, o que fez com que ela tivesse que abandonar o emprego no salão.
“Comecei a fazer algumas bolsas de extensão, de ensino e pesquisa. Depois disso, tudo paralelamente ao ensino médio, fiz um estágio no setor de administração ali do IF mesmo”, conta Morgana.
Já no terceiro ano do ensino médio, ela fez seu estágio obrigatório trabalhando com manutenção de computadores. Além disso, atuou em uma empresa de desenvolvimento de software em sua cidade natal, além de ter se dedicado como monitora de matemática antes de concluir o ensino médio. Foi por meio da empresa de software em que trabalhava que teve contato com o Projeto Ada, financiado pela Universidade em parceria com a empresa de tecnologia Poatek, que concede bolsas de estudo para o curso de Ciência da Computação a mulheres de baixa renda.
Um colega de trabalho ficou sabendo sobre o programa e o indicou para Morgana – para o qual ela prontamente se inscreveu. Além disso, pouco tempo depois, sua professora do ensino médio também contou a ela sobre o projeto, e ela disse que já havia feito sua inscrição. A jovem comenta que, desde seu ingresso, o projeto passou por diversas reestruturações e melhorias.
“Hoje, já temos toda uma estrutura. De modo geral, o programa sempre constituiu essa ideia de trazer mais mulheres de baixa renda, especialmente para dentro da área da computação. E agora, como já está mais estruturado, estamos vendo a questão de inglês, a questão das dificuldades, estamos tentando realocar algumas coisas que foram alguns pontos de dificuldade para mim ao longo do curso. Mas está sendo tudo reajustado agora, conforme as coisas estão andando”, explica.
Mesmo em pleno século 21, ainda existem estigmas relacionando determinadas profissões a gêneros. A PUCRS, no entanto, vem trabalhando para mudar essa realidade. Além do abatimento da mensalidade para todo o curso, as estudantes recebem bolsa-estágio para os primeiros três semestres do curso, além de outros apoios, como ajuda financeira para residir próximo à Universidade. Nos primeiros semestres de curso, elas também são acolhidas no Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação (PPGCC), onde têm o primeiro contato com a pesquisa científica na área. Soraia Musse, professora do curso e coordenadora do Projeto Ada, afirma ser gratificante ver as mulheres ocupando cada vez mais espaços no ramo da tecnologia.
“É ótimo entrar em aula e ver mais diversidade, mais mulheres, mais pessoas diferentes com ideias diferentes. É dessa diversidade que nascem ideias mais inovadoras, que certamente precisaremos para construirmos soluções para um mundo melhor”, comenta.
Morgana Weber, que cursou toda a educação básica na rede pública, foi uma das primeiras beneficiadas pelo programa.
“A primeira menina cuja vida nós mudamos, a primeira a se formar na família dela. Ela se formou em quatro anos, o que quase ninguém na Ciência da Computação consegue. Ela é um espetáculo”, afirma Soraia.
Orgulho é a palavra que define a experiência de Morgana ao cursar Ciência da Computação na PUCRS. Para ela, os dois principais diferenciais da Universidade são a estrutura física e a relação com os professores. “Eles sempre foram muito presentes, se eu já tinha alguma dúvida, perguntava, não era aquela coisa de impessoalidade com aluno. Eu sempre tive uma relação ótima com eles”, relata. Em relação ao curso, ela elogia o equilíbrio entre a teoria e a prática.
“Nós temos disciplinas hoje que outras universidades não têm, disciplinas voltadas para a atualidade, aprendizado de máquina, que é algo bem recente. Eu acho isso incrível, porque a gente não vê só conceitos antigos, por exemplo, a gente aprende as tecnologias usadas atualmente no mercado de trabalho”, diz.
A computação costumava ser uma área dita como masculina – mas Morgana faz parte de uma nova geração de mulheres. Ela se diz muito sortuda, pois, na época que ingressou na Universidade, conviveu com mais mulheres do que o curso costumava receber. “Dei a sorte de ter mulheres comigo, pelo menos no ambiente acadêmico”.
Apesar disso, não foi uma jornada livre de desafios. Ela conta que havia disciplinas em que ela era a única mulher na turma, e que às vezes era difícil e cansativo ter que lidar com uma presença massivamente masculina, tanto em relação a ter que provar suas capacidades e habilidades como em relação a situações de assédio – nas quais tanto reagir quanto não reagir pode ser negativo. “Se você reage é louca, se não reage dá abertura para o assédio”, argumenta ela. O que mais a motiva a se manter na área é conquistar o espaço das mulheres, para mostrar para outras mulheres que é possível, e para apoiar umas às outras.
“Isso é uma das coisas que mais me motiva, saber que eu também sirvo de inspiração para outras pessoas, saber que eu estou colaborando para conquistar o nosso espaço em uma área que é majoritariamente masculina. Eu sonho muito com o momento em que a gente vai deixar de dizer que a computação é curso para homens”, pontua.
A área de tecnologia da informação vem crescendo cada vez mais, e o espaço para as mulheres dentro dela também. Para as meninas que estão no ensino médio e pensam em cursar Ciência da Computação, a professora Soraia manda o recado:
“É uma área encantadora, não necessariamente fácil, mas desafiadora no sentido de fazer as pessoas pensarem. Ao contrário do que leigos podem pensar, pode-se usar muito a capacidade criativa para criar e construir soluções inovadoras. Eu diria para essa menina: não desista, existem muitas oportunidades!”
Já Morgana enfatiza a importância de acreditar e confiar em si, se posicionar, pois, em algum momento, terá que se provar perante a sociedade. Ela pontua que é um processo exaustivo, mas que vale a pena, já que o espaço para as mulheres nesse ramo está se abrindo cada vez mais.
“Se você tem vontade, aprenda. É muito importante confiar e entender que apesar do processo ser difícil e longo, não é nada que nós como mulheres não sejamos capazes. Então temos que acreditar que a gente é capaz, acreditar que a gente consegue, acreditar que a gente tem potencial sim. Apesar dos pesares, apesar de às vezes um monte de gente falar que não é assim e sermos invalidadas, a gente tem potencial”, finaliza.